Os impactos da larga escala dos plantios de eucalipto nos municípios de São Mateus e Conceição da Barra, que atingem comunidades tradicionais no norte do Estado, serão denunciados nesta terça-feira (25), na Assembléia Legislativa, pelo Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH-ES). O objetivo é transformar o estudo em pressuposto para avaliação de implementação dessas propostas em estados e municípios.
O relatório, constante do Estudo e Relatório de Impacto sobre Direitos Humanos em Grandes Projetos (EIDH/RIDH), estudou, em especial, o caso do monocultivo de eucalipto em larga escala no norte do Estado – projeto agroindustrial da ex-Aracruz Celulose (Fibria) e as comunidades quilombolas do Sapê do Norte.
O EIDH/RIDH propõe discutir aspectos para além dos que integram o rol do relatório ambiental, investigando questões relacionadas aos direitos humanos no seu conjunto. Uma pesquisa em âmbito nacional sobre o tema também foi realizada.
Segundo o MNDH-ES, o estudo incluiu ainda pesquisas e diálogos com redes sociais nos estados de Espírito Santo, Maranhão, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Esse material servirá de subsídio na apresentação de argumentos para o Ministério da Justiça, com o objetivo de demonstrar a importância e a urgência da instituição desse novo instrumento como um dos pressupostos para avaliar a implantação de grandes projetos no Brasil.
“No caso do Espírito Santo, o recorte foi o impacto da implantação da Aracruz Celulose/Fíbria e as violações de direitos humanos nas comunidades quilombolas. A escolha de duas experiências que envolvem a Aracruz Celulose (Fibria) no Espírito Santo e Rio Grande do Sul constitui a possibilidade de se identificar as ações de um único projeto produzindo impactos em realidades geográficas distintas”, informou o movimento.
Segundo o relatório, movidos por interesses transnacionais, os estados do Brasil, em especial Espírito Santo, Minas Gerais, Bahia, São Paulo e Rio Grande do Sul, são assediados por estes empreendimentos. O relatório reafirma a invasão da ex-Aracruz Celulose (Fibria) nas terras indígenas e quilombolas do norte do Estado.
“No Espírito Santo, a violação dos direitos humanos de populações tradicionais (indígenas e quilombolas) pela empresa ex-Aracruz Celulose (Fibria), quando a empresa iniciou sua atuação no estado, em 1967, os primeiros eucaliptos foram plantados no município de Aracruz sobre os territórios indígenas dos povos Tupiniquim e Guarani. Em seguida, a Aracruz expandiu-se para os municípios de Conceição da Barra e São Mateus, no extremo norte do Espírito Santo, atingindo comunidades quilombolas”, diz o MNDH.
Este processo de ocupação gerou uma série de conseqüências para as comunidades indígenas e quilombolas. No Sapê do Norte, entre os municípios de São Mateus e Conceição da Barra, os negros descendentes de escravos perderam grande parte do seu território para a transnacional, o que levou a uma série de reações desta população, que atualmente luta pela retomada de seu território sob ameaças promovidas pela segurança particular da empresa.
Foi por causa dos conflitos locais, que chamaram a atenção do MNDH, que o estudo feito no Estado poderá ser utilizado como base para indicar a experiência do Espírito Santo como uma das quatro a serem estudadas no Brasil.
De acordo com os dados do IBGE de 2008, o plantio de eucalipto ocupa 34,55% da área total do município de Conceição da Barra e 15,68% da área total do município de São Mateus (Censo Agropecuário, 2006, IBGE, 2008).
O estudo foi realizado pelo Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH-ES) e Centro de Defesa dos Direitos Humanos da Serra/Espírito Santo (CDDH/ES) e tem o apoio do deputado Claudio Vereza (PT).
A apresentação será realizada no próximo dia 27, às 14h, no plenário da Assembléia Legislativa do Espírito Santo.
Preocupação com Adin
A reunião realizada nesta segunda-feira (24) entre os quilombolas do Estado e o secretário de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, João Carlos Nogueira, ministro interino da pasta, na Assembléia Legislativa, não trouxe novidades aos negros descendentes de escravos que vivem na região do Sapê no Norte. Região que compreende parte do município de São Mateus e de Conceição da Barra, no norte do Estado.
Já os quilombolas apresentaram ao secretário notícias sobre o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) pelo Supremo Tribunal Federal, previsto para os próximos dias. Se aprovada a revogação do decreto 4.4887/03, proposta pelo partido Democratas (DEM), os descendentes de escravos terão seu direito às terras tradicionalmente de quilombolas negado. Além dos moradores de Sapê do Norte, a medida atinge outras comunidades quilombolas no Sul capixaba.
Neste contexto, os negros cobraram uma audiência com o ministro Cezar Peluso, presidente do STF e relator da Adin, para debater amplamento o caso. A audiência será realizada, mas ainda não tem dia nem local para acontecer. Além disso, um comitê de trabalho no território quilombola será criado para acompanhar as questões territoriais e de direitos humanos na região.
“Nogueira é muito pé no chão, portanto, não ouvimos promessas. Nós conhecemos o que foi feito nestes oito anos, mas sabemos também o que não vem sendo feito e por que os processos estão parados. Por isso propomos a audiência pública e a criação de um comitê de trabalho nas terras quilombolas e as propostas foram bem aceitas”, disse Selma Dealdina, do Movimento Quilombola.
(Por Flavia Bernardes, Século Diário, 25/05/2010)