Deputado de Tocantins, apoiado por parlamentares de Goiás, pede a retirada do texto da votação em comissão, atrasando, em pelo menos uma semana, o trâmite que deve resultar no banimento do minério no país
O lobby instalado no Congresso a serviço das empresas que exploram o amianto funcionou mais uma vez. A Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados tentou aprovar ontem o relatório final que pede o total banimento do amianto no Brasil, mas a votação foi adiada em pelo menos uma semana. O deputado João Oliveira (DEM-TO) pediu a retirada do relatório da pauta de votação da comissão, alegando necessidade de “mais tempo” para a análise das conclusões do levantamento.
Um grupo de trabalhadores, um instituto, um sindicato e deputados goianos financiados pela Sama Mineração de Amianto — a empresa que explora a última mina do produto no país, em Minaçu (GO) — pressionaram contra a aprovação do relatório.
O grupo de trabalho criado pela Comissão de Meio Ambiente demorou dois anos para concluir o relatório de 680 páginas que pede o banimento do amianto. Faltava o documento — chamado de Dossiê amianto Brasil — ser validado pelos deputados que integram a comissão, o que não aconteceu por causa da iniciativa do deputado João Oliveira.
Fizeram coro ao parlamentar do DEM três deputados goianos que integram a bancada em defesa do amianto: Jovair Arantes (PTB), Carlos Alberto Leréia (PSDB) e Roberto Balestra (PP). Os dois primeiros já foram financiados pela Sama em campanhas eleitorais, conforme a prestação de contas registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Jovair recebeu R$ 25 mil e Carlos Leréia foi financiado em R$ 300 mil nas eleições de 2002.
Os três parlamentares atacaram o relatório da Comissão de Meio Ambiente e chegaram a comparar os efeitos do amianto à saúde aos efeitos provocados pelo pó produzido na construção civil ou por “britadeiras nas ruas”. “Esses deputados não participam da discussão ambiental. Só aparecem aqui para falar de amianto”, disse a deputada Rebeca Garcia (PP-AM), coordenadora do grupo de trabalho que concluiu pelo banimento do minério. Coincidência ou não, Jovair Arantes, Carlos Leréia e Roberto Balestra já haviam deixado a reunião.
Os deputados do grupo de trabalho esperavam ontem a aprovação do relatório final, até por não se tratar de um projeto de lei ou de qualquer iniciativa concreta de banimento do amianto, mas apenas de uma conclusão técnica sobre o assunto.
Os setores que tradicionalmente defendem a exploração do minério compareceram à reunião da Comissão de Meio Ambiente. Cerca de 100 trabalhadores de Minaçu e Goiânia foram transportados a Brasília pela Comissão Nacional dos Trabalhadores do Amianto (CNTA) e pelo sindicato do setor em Minaçu. Representantes do Instituto Brasileiro do Crisotila (IBC), ligado à Sama, também acompanharam a tentativa de votação do relatório, que chamaram de “tendencioso” e “mentiroso”.
A CNTA, como conclui o relatório, “é um ardil criado pela indústria para burlar a legislação e implementar uma estratégia de lobby em defesa do amianto”. O IBC paga R$ 600 mil por ano à CNTA, como a entidade admitiu ao grupo de trabalho da Comissão de Meio Ambiente.
O relatório final concluiu pelo banimento do amianto principalmente por razões de saúde pública. “Todas as formas de amianto são prejudiciais à saúde. Não há como controlar a fibra mineral.” Os integrantes da Comissão de Meio Ambiente discordam da possibilidade de uso controlado e sustentam que a defesa do amianto se deve à movimentação de R$ 2,6 bilhões no negócio de exploração do mineral, usado no Brasil principalmente na fabricação de telhas e caixas d’água.
Esse dinheiro está associado essencialmente à mina Cana Brava, em Minaçu, explorada pela Sama. A mina tem mais 29 anos de vida útil e emprega cerca de 360 pessoas; em 1995, eram quase 500 trabalhadores. O relatório final do grupo de trabalho criado propõe o fim da exploração da mina e o estudo de novas atividades econômicas em Minaçu, onde 80% da arrecadação tributária é proveniente da Sama Mineração.
Mesmo com o lobby manifestado ontem, o relator do estudo, deputado Edson Duarte (PV-BA), e a coordenadora do grupo de trabalho, deputada Rebeca Garcia, acreditam que o relatório final será votado — sem alterações significativas, como já foram sugeridas por deputados do DEM — na próxima quarta-feira, na próxima reunião da Comissão de Meio Ambiente. “Essa reação já era esperada. Mas é bom que os deputados leiam o relatório, pois até hoje só leram relatórios do IBC, uma entidade lobista”, afirma Edson Duarte.
(Por Vinicius Sassine, Correio Braziliense, 20/05/2010)