No último dia 10, denúncias do padre inglês Jean-Yves Urfié, ex-professor de química do Collège Saint Martial, em Porto Príncipe, capital do Haiti, tornaram públicas as investidas da transnacional Monsanto no país. Sob a justificativa de ajudar na recuperação do setor agrícola da nação arrasada por um terremoto, a empresa doará 475 toneladas de milho transgênico, mais fertilizantes e pesticidas.
A doação de 4 milhões em sementes híbridas foi aprovada pelo Ministério da Agricultura do Haiti, que temia que os agricultores não conseguissem ter acesso a sementes de boa qualidade em tempo hábil para a próxima safra. O Ministério informou que as sementes ofertadas são condizentes com o clima haitiano.
Mais de 60 toneladas de sementes híbridas de milho e de hortaliças já chegaram ao Haiti, na semana primeira semana de maio. Uma parte do carregamento chegou ao país de avião e outra de navio, com o apoio das empresas de logística Kuehne + Nagel e UPS. O segundo carregamento, com cerca de 70 toneladas de sementes, chegou na última quinta-feira, dia 13. Devido à chegada destes carregamentos, mais de 65 mil hectares de terra foram preparados por tratores, fertilizantes, defensivos agrícolas e formação para os agricultores.
A entrega das demais 345 toneladas de sementes será feita dentro de um prazo de 12 meses por meio do projeto WINNER (que significa vencedor, em inglês). A ação, que está tendo o apoio da embaixada dos Estados Unidos no Haiti, já fez chegar as ‘doações’ da Monsanto às regiões de regiões de Gonaives, Kenscoff, Pétion-Ville, Cabaré, Arcahaie, Croix-des-Bouquets e Mirebalais.
Segundo Talles Gomes, jornalista e membro da Brigada da Vía Campesina Brasileira, no Haiti, com a repercussão das informações dadas pelo padre Urfié, o Ministro da Agricultura haitiano, Joana Ford, foi a público no dia 12 de maio para afirmar que o país não tem capacidade para gerenciar os organismos geneticamente modificados (OGM) e justificar a aceitação da doação da Monsanto.
"Nós tomamos todas as precauções antes de aceitar a oferta feita pela multinacional Monsanto para fazer uma doação de 475,947 kg de sementes de milho híbrido e 2.067 kg de sementes de hortaliças. Devemos também mencionar que, na ausência de uma lei que regulamenta a utilização de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) no Haiti, não posso permitir a introdução de sementes ‘Roundup Ready’ ou qualquer outra variedade de transgênicos", esclareceu o Ministro.
Um detalhe importante sobre a doação da Monsanto é que, além das sementes crioulas ficarem ameaçadas com a entrada das sementes híbridas, os agricultores e agriculturas não as receberão de graça, eles terão que comprar. Inicialmente, as sementes serão enviadas às lojas gerenciadas pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid) e posteriormente devem ser vendidas "por um preço significativamente reduzido" às famílias camponesas.
Na tentativa de esclarecer a real intenção da Monsanto, Talles afirma que a multinacional planeja criar laços de dependência com o Haiti. Isto será feito, inicialmente, pela necessidade de adquirir os herbicidas, fertilizantes e produtos químicos específicos da empresa, já que as sementes só vingarão com a utilização destes produtos. Outro ponto é que as famílias não poderão reaproveitar as sementes que brotaram, pois apenas a primeira geração é adequada para o plantio.
Prevendo os prejuízos que a iniciativa da Monsanto causará no Haiti, Chavannes Jean-Baptiste, coordenador do Mouvman Peyizan Papay (MPP) e membro da Via Campesina haitiana, está convocando os camponeses a queimar e enterrar as sementes de milho vindas do Ministério da Agricultura. Jean-Baptiste também pediu a união dos camponeses e a solidariedade internacional para enfrentar a Monsanto.
Mobilizações
Em repúdio à ação ‘solidária’ da Monsanto, a Via Campesina está organizando para os próximos dias quatro e cinco uma marcha que partirá de Papay com destino à cidade de Hinche, capital do departamento Central. Os camponeses haitianos aproveitarão o Dia Internacional do Meio Ambiente para chamar atenção para o que está acontecendo em seu país.
(Adital, 19/05/2010)