O "Programa de Produção Sustentável de Palma de Óleo no Brasil" foi lançado no começo do mês pelo governo federal como um ambicioso programa para a expansão do cultivo do óleo de palma - também conhecido como azeite de dendê - na Amazônia e no Nordeste brasileiro.
Apesar de ser apresentado como o projeto mais sustentável já criado para a produção do óleo de palma, especialistas ainda veem a iniciativa com certo ceticismo.
Para o diretor da organização Amigos da Terra - Amazônia Brasileira Roberto Smeraldi, faltam critérios mais bem definidos, o que pode comprometer o programa. Smeraldi também questionou o fato do programa estar sendo apresentado como aquele que vai resolver os problemas do pequeno agricultor da Amazônia. "Em geral, qualquer cultura apresentada como panaceia para o pequeno agricultor da Amazônia é uma falácia".
Já Marcello Brito, diretor comercial da Agropalma, maior produtora do óleo de palma do país, viu com otimismo o anúncio, por ter sido elaborado sob o ponto de vista social e ambiental, mas considera que ainda é cedo para saber se o programa trará resultados positivos para a economia amazônica, "principalmente num país onde tantos programas já foram lançados e poucos obtiveram sucesso".
O programa foi anunciado no dia 06 de maio, em Belém (PA). Segundo o governo, para garantir a sustentabilidade da produção de óleo de palma, ficará proibida a utilização de 86,4% das áreas aptas para plantio, e de 96,3% da área total do território brasileiro.
A expansão do cultivo ocorrerá em áreas degradadas na Amazônia, e as áreas utilizadas para cana-de-açúcar do Nordeste. Para definir onde se poderá plantar o óleo de palma, a Embrapa desenvolveu um estudo de território, chamado de Zoneamento Agroecológico da Palma.
Viabilidade econômica
Um dos pontos questionados por Smeraldi é a viabilidade econômica do programa. Segundo o diretor da Amigos da Terra, o programa não tem bases econômicas sólidas. "Não somos contra o dendê em si, mas precisaria de programas muito mais amplos e articulados com a cadeia, focados em diversidade de culturas, com assistência técnica, com investimento para as áreas degradadas, etc.", diz.
Brito também acredita ser difícil dizer se o programa terá sucesso econômico. "O sucesso vai depender de um conjunto de fatores que envolvem além do governo federal, estadual e municipal, também as empresas, pequenos produtores e a sociedade civil de uma forma geral", diz.
Apesar disso, o diretor da Agropalma acredita que, se levado a sério, o programa pode contribuir com a economia amazônica. "O que podemos afirmar é que se construído de forma correta poderá sim ser um novo marco no desenvolvimento regional".
Um dos pontos propostos pelo governo federal é que o cultivo do óleo de palma seja feito também pela a agricultura familiar. Segundo nota do ministério do Meio Ambiente, o objetivo é oferecer uma alternativa de produção para os pequenos agricultores.
A projeção é de que uma família consiga aumentar a renda mensal de R$ 415, provenientes do trabalho nas lavouras de mandioca ou na extração do açaí, para até R$2 mil.
Roberto Smeraldi lembra que foi feito um programa similar com o biodiesel da mamona, que não deu certo. "A atividade praticada por agricultores familiares tem rendimento muito abaixo do que é a plantação industrial e pode acabar gerando abandono, e portanto novo desmatamento, na hora em que o pequeno agricultor percebe que não é sustentável", explica.
Devastação
O temor de que a expansão do cultivo de óleo de palma possa se tornar um vetor de desmatamento da Amazônia é justificável. Na Indonésia, país com grande cobertura de florestas tropicais, a produção do óleo de palma é um dos grandes vetores do desmatamento.
A atividade no país estimula o desmatamento da floresta, principalmente na ilha de Bornéu, e coloca em risco o habitat dos orangotangos. Em março de 2010, ativistas da ONG Greenpeace iniciaram uma forte campanha contra as empresas europeias que compram óleo de palma da Indonésia, principalmente a Nestlé, que utiliza o produto no chocolate Kit kat.
Smeraldi teme que a falta de critérios de implementação do programa de óleo de palma no Brasil pode acabar transformando o produto num vetor do desmatamento, apesar de não em grande escala. Segundo o ambientalista, o critério de que só pode plantar em áreas degradadas não é suficiente para garantir que o produto não desmate.
Em sua opinião, a forma mais fácil de plantar dendê em locais degradados é justamente devastando essas áreas, com a pecuária principalmente. "Portanto, a ideia de não vincular o dendê ao desmatamento é uma ilusão: ninguém iria desmatar para plantar dendê diretamente", explica.
Marcello Brito também acredita que, se mal implementado, o programa possa resultar em desmatamento. "Existe sim este risco no Brasil caso a fiscalização não seja adequada, não só do governo, mas também dos stakeholders envolvidos".
O diretor da Agropalma, entretanto, acredita que o setor está preparado para cumprir as exigências ambientais, evitando que o plantio avance sobre áreas de florestas. "Empresa séria não desmata, são os ilegais que se aproveitam das brechas da lei, principalmente do caos fundiário da Amazônia. Este tem que ser o diferencial do Brasil: caso façamos da mesma forma da Indonésia, em breve estaremos também sofrendo barreiras ambientais de consumidores de outros países. Mas se fizermos bem feito, abriremos uma enorme janela de oportunidade para o país", conclui.
(Por Bruno Calixto, Amazonia.org.br, 17/05/2010)