Passou praticamente despercebido o estudo da Confederação Nacional da Agricultura sobre a rentabilidade econômica do milho nas principais regiões produtoras do grão no País. Pudera: os resultados mostram que em todas as regiões o produtor está pagando para colher. O prejuízo varia entre R$2,62 por saco de 60 kg em Unaí - MG a R$11,13 em Sorriso - MT. Também foram avaliadas lavouras no Paraná, Rio Grande do Sul e Goiás, todas deficitárias [1].
Considerando que não foi um ano de quebra de safra, a resposta está no resultado do cruzamento entre custos crescentes de produção e preços baixos. O fato é que com o esgotamento das reservas mundiais de petróleo e de fosfato, matéria prima dos insumos agroquímicos, o custo de produção da agricultura convencional seguirá aumentando. Ou seja, não se trata de crise passageira ou resultante de especulação.
De posse dos resultados obtidos em conjunto com Cepea/USP, Esalq/USP e UFLA, a presidente da CNA senadora Kátia Abreu disse que os números deverão facilitar a obtenção de empréstimos pelos produtores. Presa a uma mentalidade de curtíssimo prazo, a líder da bancada ruralista propõe mais endividamento para o setor. Depois seus colegas acertam a fatura no Congresso anistiando as dívidas com dinheiro da sociedade.
Outros diriam que a saída está na adoção do milho transgênico, que irá produzir mais, custar menos, dispensar o uso de agrotóxicos e de quebra amenizar o problema do aquecimento global. Mas segundo um agricultor catarinense, diga-se de passagem, entusiasta dos transgênicos, "O preço está péssimo e o custo de produção é muito alto. A saca de 60 quilos é vendida por R$ 17,50 e nos custa cerca de R$ 20" [2]. Ou seja, está pagando R$ 2,50 para produzir cada saca de milho transgênico.
E o que a agroecologia tem a oferecer num cenário como esses? Na mesma safra avaliada pela CNA, produtores do Paraná que plantaram milho crioulo obtiveram produtividades bastante satisfatórias a custos baixíssimos.
No município de Palmeira, um produtor gastou cerca de R$290/hectare em sua lavoura do milho "Amarelão antigo" e calcula que colherá em torno de 5.500 kg de milho. Ou seja, gastará pouco mais de R$ 3 para cada saca de milho colhida. Em São Mateus do Sul, um produtor que semeou o milho "Carioca" gastou R$210/ha e estima sua colheita em 5.700 kg, ou seja, gastando apenas R$2,2 para cada 60 kg de milho produzido [3]. Segundo a CNA, também no Paraná, em Londrina, o produtor gastou R$19,63 para colher um saco de milho.
O último levantamento da Conab relativo à safra 2010 indica média de produtividade do milho de 4.157kg/hectare. Produtividades do milho orgânico superiores a 6 toneladas de milho por hectare foram verificadas em Santa Catarina por pesquisadores da Epagri e da Universidade Federal nas safras 2005/06 e 2006/07 [4].
Ficará cada vez mais difícil e mais caro manter a mesmice. Está mais do que na hora de iniciarmos um plano de desaceleração da dependência de energia fóssil para a produção de alimentos. Chiarão as grandes que lucram com o atual sistema. Dirão que esse será o caminho para fome. Mais fácil acreditar que isso acontecerá se não nos prepararmos desde já para a transição para uma sociedade pós-petróleo.
Notas:
[1] Cultura de milho é economicamente inviável nas principais regiões do País. http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia.phl?editoria=27&id=266238
[2] Diário Catarinense, 18/01/2010: "Mais espaço para o milho transgênico". Em verdade, o título mais adequado seria "Milho transgênico dá prejuízo". http://pratoslimpos.org.br/?p=684
[3] As estimativas foram feitas com base na previsão de colheita de milho em casca. A conversão para kg de grãos por hectare descontada a palhada foi feita usando-se o menor rendimento de acordo com os dados obtidos pela Universidade de Londrina para as variedades crioulas usadas no Centro-Sul do Paraná, que variam entre 22 e 30%.
[4] Vogt, G.A. et al., Produtividade de variedades de polinização aberta de milho em cultivo orgânico. Agropecuária Catarinense, v.22, n.2, jul. 2009.
(Adital, da Campanha Por Um Brasil Livre de Transgênicos e Agrotóxicos, 12/05/2010)