A 20 milhas da costa, já se pode sentir aquele fedor que pertence ao inferno e não a este paraíso. A 30 milhas, o capitão freia os 150 cavalos do "Pelican" e, horrorizado, tenta entender o que é aquele nojo esverdeado que cobre a superfície do "seu" mar. A 35 milhas, a resposta que não se queria circunda o casco do navio, o olfato, a visão, a cabeça...
Vocês já tentaram navegar no Day After? A uma hora da costa, o apocalipse já está aqui: o petróleo que está por investir contra as costas da Louisiana e do Mississippi, do Alabama e da Flórida, já penetrou no coração do arquipélago natural que comoveu Teddy Roosevelt e que resistiu até ao furacão Katrina. Manchas de ferrugem circundam aquele microssistema pantanoso único no mundo. Os pelicanos não voam mais aqui, os golfinhos não dançam mais, o céu está inutilmente brilhoso e a brisa que corre suave do sul é uma ilusão mortal: o vento mudou e, depois da trégua dos últimos três dias, agora joga novamente contra.
As primeiras testemunhas haviam disparado o alarme na terça-feira: a maré de óleo já estava ali. As imagens de satélite haviam feito o professor Hans Graber estremecer: o monstro já está pressionando os seus tentáculos. Porém, ainda nesta quinta-feira, o contra-almirante Mary E. Landry continou dizendo que, sim, a mancha está perto, mas as costas do arquipélago ainda estão a salvo.
Onde estava a senhora que Barack Obama colocou para viajar esse monstro? Não no "Pelican" de Mark Stebly, que vai em direção ao arquipélago. O capitão olha o mar que sangra essa podridão vermelha e sente um golpe no coração. Há 35 anos, ele navega nesse trecho, e 50 viagens por ano durante 35 anos dão um total de 1.700 visitas a esse paraíso do qual só ele até agora tinha as chaves.
"Aqui, o meu pai navegava e, antes dele, o meu avô. As árvores da Horn Island foram plantadas por ele. Assim como aquelas da Ship Island, que o Katrina levou embora para sempre. Mas agora é pior do que o Katrina. Um furacão vem e passa. A vida retorna. Para os pescadores, paradoxalmente, depois da tragédia, é uma festa. Os peixes voltam mais do que antes. Mas desta vez não. Desta vez será o fim por 10, 20, 30 anos. Talvez mais. Isso é pior do que um furacão. Um furacão de um mês de duração".
Da Louisiana ao Mississippi, o delta do rio é uma costa que faz fronteira continuamente entre mar e terra. As Chandeluer Islands são a barreira natural em forma de arco que, vistas do alto, parecem proteger a Louisiana.
Há 100 anos, esse pedaço de paraíso desabitado pelo homem foi declarado reserva natural pelo primeiro presidente ambientalista do mundo. O ecologismo ainda tinha que ser inventado, mas talvez o que diria o velho Teddy Roosevelet ao ver as suas joias afundando justamente na era da consciência verde? O capitão Mark não acredita no que vê: "Este era o trecho de mar mais vivo que eu já havia visto. Passarinhos, golfinhos. Nada mais".
A viagem do pequeno porto de Ocean Springs até o paradouro do "Pelican" poderia ser uma travessia a ser desfrutada com o sol a pino e o mar que parece um lençol: seria um sonho, se não se transformasse rapidamente em um pesadelo. "O que está acontecendo?". O alarme chega daquela torre da Air Force plantada no meio do Golfo do México. Antes, havia uma espécie de posto avançado, mas o Katrina e os seus irmãos apagaram tudo. Porém, até terça-feira, aquela torre ainda era um refúgio dos pelicanos. Agora, está espectralmente vazia.
A inquietação cresce quando a água se torna pútrida e densa de repente. Petróleo? Não, isso não é petróleo. Isso é o presente daqueles dispersantes químicos com os quais está se buscando desfazer a maré de óleo: e já há quem jure que esse é um remédio pior do que a doença.
Quando o "Pelican" atraca no seu paradouro, não há mais dúvida: isto sim é petróleo. "Mas como podem negar ainda?". A pequena base já está em agitação. Uma pequena equipe da Universidade da Louisiana desembarca. São os terríveis rapazes do Biological Survey Department: aqueles que não estão ali para dar declarações de paz. O Ceo Tony Hayward continua tentando ver algo bom nesse desastre. Phil McCharty não se desequilibra: veio aqui para fazer os acertos, e depois a sua universidade irá emitir a sentença.
O último relatório defende que a mancha escura já chegou à Freemason Island. "A que está exatamente à nossa frente", diz o capitão Stelby. O que mais inquieta é que esta é a parte côncava do arquipélago. A plataforma maldita explodiu do outro lado: 30 milhas mais ao sul. Mas então como é que o óleo já cercou o obstáculo? E como aqueles poucos quilômetros de "booms" – as fortificações flutuantes – vão fazer para parar o horror?
A resposta já está escrita na paisagem incrível que está diante destas praias do paraíso. "Quer saber o que é aquela torre lá no fundo? Uma plataforma...". Está cheio de plataformas aqui ao redor: é possível ver a olho nu. No fundo, esta é uma história já escrita. "A maré de óleo irá chegar: é só uma questão de tempo".
Na primeira vez que o seu pai o trouxe a estas ilhas, Mark tinha 11 anos. Aos 15, começou a fazer a travessia sozinho. Há 35 anos, ele faz isso como profissão. Na rota do retorno, eis finalmente o único golfinho de toda a travessia: vai rumo às Chandeleur. O capitão ainda tem ânimo para brincar: "Tomou a direção errada". Está em ótima companhia: todos navegamos rumo ao desastre.
(Por Angelo Aquaro, La Repubblica / IHUnisinos, com tradução de Moisés Sbardelotto, 07/05/2010)