Os três Estados brasileiros que concentram a produção petrolífera nacional não possuem um plano de ação para lidar com um acidente semelhante ao resultou no surgimento de uma enorme mancha negra de petróleo no Golfo do México, após a explosão de uma plataforma no litoral sul dos Estados Unidos. Praias, manguezais e áreas de reprodução de espécies marinhas brasileiras poderiam ser afetadas seriamente, trazendo prejuízos para a pesca e o turismo do país.
Sob o argumento de que a responsabilidade sobre esse problema é federal, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo não têm nem mesmo informações sobre qual seria a forma recomendada para proteger o litoral após um derramamento de petróleo em grandes proporções. Reportagem de Iago Bolivar, do R7.
As secretarias de Meio Ambiente de São Paulo e Espírito Santo informaram não possuir planejamento para o caso de desastres no mar. Ambas afirmaram desconhecer os planos federais para uma tragédia como a ocorrida no Golfo do México, embora estejam preparadas para lidar com vazamentos em solo e áreas de licenciamento estadual.
Já o governo do Rio de Janeiro possui um plano de ação contra derramamento de petróleo no mar apenas para a baía de Guanabara, que é uma área de licenciamento estadual. Nesse caso, seriam usados equipamentos de contenção de manchas em parceria com as empresas que atuam na região, segundo a secretária de Meio Ambiente do Rio de Janeiro, Marilene Ramos.
Reconhecendo a falha e impressionada com o vazamento que começou há duas semanas no golfo do México, Marilene convidou o Ministério do Meio Ambiente e a Petrobras para discutir a criação de uma força-tarefa para atuar em desastres ambientais relacionados ao petróleo no mar.
– Eu fiquei muito preocupada ao imaginar se exatamente isso [vazamento de petróleo como o ocorrido nos Estados Unidos] acontecesse aqui. Teríamos que aguardar a ação do governo federal, não temos preparação, nenhum código do que tem que ser feito, quem acionar.
A reunião sobre o grupo de trabalho está marcada para esta sexta-feira no Rio de Janeiro, mas as secretarias do Espírito Santo e São Paulo não foram convidadas. Questionada sobre a conveniência da participação dos Estados vizinhos, a secretária fluminense disse que iria tentar chamá-los nesta quinta-feira (5) para o encontro. A prioridade, segundo ela, é a articulação com o governo federal.
Centro das atuações em caso de derramamento de petróleo no mar, o Ministério do Meio Ambiente recusou-se a informar qual é a estrutura que possui atualmente para responder a um desastre desse tipo.
Após marcar uma entrevista nesta quinta-feira para tratar do assunto, a Coordenadora de Emergências Ambientais do ministério, Mirian de Oliveira, informou ter sido orientada por superiores a não falar com a imprensa sobre o tema. Informações serão repassadas, segundo ela, apenas após a reunião desta sexta, no Rio de Janeiro.
Já a Petrobras, que concentra a maior parte da produção de petróleo do país, nem deu prazos. A assessoria de imprensa da empresa apenas informou que não iria se manifestar sobre qualquer assunto relacionado ao acidente no golfo do México, região onde também possui operações. O silêncio é extensivo ao fornecimento de informações sobre os planos de contingência para desastres no litoral brasileiro.
Situação polêmica
Para o pesquisador da Coppe (Coordenação de Programas de Pós-Graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro) Moacyr Duarte, a empresa está preparada para prevenir desastres e a situação brasileira é melhor que a americana. Especialista em gerenciamento de riscos, ele cita como exemplo o acidente na plataforma P36, que afundou em março de 2001 a 130 km da costa do Rio de Janeiro depois de uma explosão em que morreram 11 funcionários.
- Foi um desastre na perda de vidas, mas não foi um desastre ambiental. A Petrobras é líder mundial de exploração em águas profundas. Cada empresa tem seus segredos tecnológicos, e a Petrobras tem os seus, que até hoje têm funcionado muito bem.
O jornal americano The Wall Street Journal publicou nesta semana que a falta de um equipamento para fechamento remoto de válvulas, comum em plataformas brasileiras, prejudicou a ação da BP (British Petroleum), operadora da plataforma que afundou na costa americana.
A sensação de segurança e eficiência não é compartilhada por representantes dos trabalhadores do setor petrolífero brasileiro. José Maria Rangel, coordenador geral do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense, aponta condições precárias de trabalho como um fator de risco permanente.
- Temos efetivo reduzido, com acúmulo de atribuições, cansaço, estresse, o que aumenta o risco de acidentes. A condição física de algumas unidades também preocupa. Temos algumas extremamente antigas, já comprometidas, e a Petrobras coloca um flotel [hotel flutuante] ao lado da plataforma e faz a manutenção com outras pessoas, sem parar a produção.
Briga por dinheiro
Além da discussão sobre aspectos ambientais e operacionais, o desastre do golfo do México reacendeu a polêmica sobre a partilha dos royalties de petróleo no Brasil, a parte da receita que é partilhada entre Estados, municípios e o governo federal.
A secretária de Meio Ambiente do Rio de Janeiro disse que os efeitos do vazamento sobre a costa dos Estados americanos provam que os Estados produtores precisam receber mais royalties devido ao risco que enfrentam, ao contrário do estabelecido pela emenda Ibsen Pinheiro, aprovada neste ano pela Câmara dos Deputados. O projeto ainda precisa ser votado no Senado.
- Cinco por cento dos royalties vão para o Fecam [Fundo Estadual de Conservação Ambiental e Desenvolvimento Urbano], que entre suas atribuições tem os sistemas de emergências e planos de contingência.
Como o plano até hoje não existe, os recursos do fundo são utilizado para saneamento, um programa de eliminação de lixões, a rede de recuperação de bacias hidrográficas e a compra de carros e helicópteros para as equipes da secretaria. A ideia é que parte desse recurso seja, finalmente, utilizada para a proteção dos riscos relacionados diretamente à sua arrecadação.
(EcoDebate, 06/05/2010)