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sustentabilidade e capitalismo
2010-05-03 | Tatianaf

Em tempos onde muito se divulga o termo empresa-cidadã, executivos e entidades brasileiras têm questionado o assunto e discutido práticas empresariais que trilhem o caminho da sustentabilidade, considerando as dimensões econômica, social e ambiental de cada negócio. Sacudidos pela crise financeira recente, dirigentes brasileiros voltam seus olhares para o antídoto do que consideram o principal problema do mundo dos negócios contemporâneos (a ponto de ser responsável pela quebra de muitas empresas): a ética. “A crise global foi impulsionada por uma queda de confiança, uma crise de valores morais que gerou a crise financeira - e que há tempos vem gerando uma crise ambiental”, avalia Douglas Linares Flinto, fundador e presidente do Instituto Brasileiro de Ética nos Negócios. Sociedade civil sem fins lucrativos, com sede em Campinas (SP), a entidade fomenta a ética no meio empresarial.

Formado em administração de empresas e teologia, Flinto trabalhou durante 30 anos em companhias de distribuição de combustíveis como a anglo-holandesa Shell, a brasileira Ipiranga e a italiana Agip. Ele acredita que sustentabilidade deixou de ser apenas uma bandeira levantada pelas empresas e hoje está integrada nos valores da maioria das corporações. “Esta tendência vem se consolidando e está alicerçada no conceito de ética, que é o determinante no sucesso de uma empresa”. Também ressalta que as indústrias modernas estão percebendo que não existe outro caminho para o sucesso de um negócio que não passe pela integridade. E ele vai além, ressaltando que é impossível existir responsabilidade social ou ambiental, muito menos se alcançar desenvolvimento sustentável em uma empresa que não prime pela ética. “Ao contrário, nestes casos, o que ocorre é apenas a utilização do marketing da sustentabilidade”, alfineta.

Na opinião do consultor, ainda existe um grande abismo entre o que algumas companhias pregam e o que elas fazem, ou seja, entre a reputação empresarial e o caráter corporativo. “Não adianta investir em ações de responsabilidade social e não pagar o fundo de garantias dos funcionários, por exemplo. Mas, positivamente, os empresários têm entendido que o caminho do sucesso passa pela ética nos negócios. Cada vez mais, os executivos têm abandonado práticas ardilosas, como sonegar impostos e pagar propinas”, opina.

Desrespeito às regras desestimula a realização de investimentos 
Falar de ética, além de abrangente, é uma questão de ponto de vista. A opinião é defendida por André Franco Montoro Filho, presidente do Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO). Ele destaca o fato de que vários aspectos e particularidades envolvem a discussão. “Nosso foco é econômico. Em nosso entendimento, é um assunto que envolve o cumprimento da legislação fiscal”. O presidente da ETCO adverte que uma empresa que não desempenha sua responsabilidade tributária, provoca desequilíbrio de concorrência - prejudicando as que agem de forma ética, e gerando outros efeitos nocivos para a sociedade. “Isso reflete em menos quantidade de recursos para governo e menos possibilidades de benefícios e investimentos em programas sociais, além de prejudicar o bom contribuinte, que tem que arcar com este ônus.”

Montoro alerta ainda que se as empresas que cometem desvios éticos proliferam, atraem oportunistas que se aventurem no setor buscando tirar proveito da situação, gerando informalidade e empregos precários. Para ele, não respeitar regras é um comportamento equivocado, que desestimula investidores interessados em fazer negócios produtivos, incluindo melhorias tecnológicas. “Aqui no Brasil, as indústrias estão tomando consciência de que o comportamento ético é fundamental para o sucesso econômico. Acredito que estamos vivendo um ciclo positivo, ascendente, de melhorias nas questões éticas econômico-sociais”. “Uma empresa ética, socialmente e ecologicamente responsável, inevitavelmente irá trilhar o caminho da tão falada sustentabilidade”, concorda o presidente do ETCO.

Mas o dirigente da ETCO aponta que há desafios a serem vencidos para que, de fato, se estabeleça a ética em termos de cumprimento fiscal. “O avanço desta cultura no Brasil está atravancado pela burocracia.” Mudanças na legislação e interpretações diferentes das leis, segundo ele, dificultam o cumprimento das obrigações por parte das empresas e acarretam a morosidade judiciária.

Respeito ao meio ambiente deve estar intrínseco nas empresas
Quando se fala em ética, se aborda não somente a necessidade de transparência e honestidade de uma corporação, mas também a visão da atuação da empresa de forma respeitosa ao meio ambiente a ações de responsabilidade social. “A postura ética de uma companhia inclui preservar as condições ecológicas, evitando impactos ambientais”, diz Beatriz Bulhões, vice-presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável. É importante também estar atento à questão dos recursos naturais como água e luz, à reciclagem de papel, aos resíduos ambientais e melhorias de processos. “São ações fundamentais das corporações”, diz. Beatriz lembra ainda que no planejamento da expansão de um negócio é necessário considerar as questões ambientais, para que haja mais condições de as empresas sobreviverem ao longo do tempo. “São valores que devem ser considerados no desenvolvimento administrativo e industrial da corporação.”

Neste quesito, as empresas brasileiras de grande porte ganham destaque, até porque são mais cobradas pelo mercado. Atualmente já existe uma ferramenta utilizada para embasá-las neste sentido: é o chamado código de ética. “Muitas indústrias têm atuado nesta linha, declarando publicamente seus valores, sua política interna e de relacionamento nos projetos. Mas ainda temos que avançar muito, é fácil escrever um código de ética, mas é preciso ter coerência nas ações, para criar uma relação de confiança com o consumidor”, opina Beatriz.

A vice-presidente do Conselho para o Desenvolvimento Sustentável admite que não é fácil e concorda que o maior desafio do País em termos de avanço na ética nos negócios é vencer a corrupção ainda presente no relacionamento com autoridades governamentais.

Douglas Linares Flinto complementa de forma otimista: “Avançamos bastante, tivemos recentemente o primeiro caso de um governador preso em toda a história de nosso País. Mas temos muito que evoluir - para isso, o bem vai ter que superar o mal literalmente.” Flinto aponta que é preciso perseverar, porque uma mudança de cultura deste porte não ocorre do dia para noite. “É gradual. Só mudaremos através do exemplo, é aí que está o poder de uma empresa que dá o exemplo para os funcionários.”

(Por Adriana Lampert, JC-RS, 03/05/2010)


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