Cerca de 15 milhões de pares de sapato saem de linhas de montagem todos os anos no mundo. São peças indispensáveis no cotidiano das pessoas, mas contêm metais pesados e outras substâncias consideradas perigosas à saúde e ao ambiente. Agora, uma pesquisa desenvolvida pelo Centro Tecnológico do Calçado Senai, em Novo Hamburgo desenvolveu um modelo que substitui esses compostos por outros de origem vegetal com igual eficácia. O Ecocalçado pode ser produzido em escala industrial, mas deve demorar para chegar ao mercado.
O abismo entre indústria e ciência foi cavado pela falta de demanda dos consumidores por um produto com menos impacto ambiental. Heitor Klein, diretor executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), diz que os europeus já demostram interesse em um produto ecológico – que é entre 10% e 20% mais caro que o tradicional – enquanto o desejo de lojistas e consumidores brasileiros está focado em preço e design. No caminho da conscientização está, portanto, o investimento corajoso de empresas em um mercado que promete crescer e inovar.
Três empresas do Vale do Sinos produziram modelos do Ecocalçado com o Centro Tecnológico: Divalesi, Paulina e Ricarelly. Trocar a matéria-prima seria um passo fundamental no longo caminho a ser seguido pela indústria em busca de uma produção mais limpa, uma vez que a primeira etapa – o destino correto de resíduos e efluentes – vem sendo ultrapassada com tranquilidade. Entretanto, a tecnologia do Ecocalçado não tem previsão para chegar aos pés dos consumidores.
A dificuldade em produzir calçados de festa sem metais – especialidade da Divalesi – ou em criar modelos jovens com uma cartela de cores reduzida – são 18 tons ecológicos contra mais de 130 tradicionais – estão entre as razões apontadas pela indústria para prorrogar o investimento na nova tecnologia.
Orceni Bernardi, diretor da Divalesi e presidente do Sindicato da Indústria de Calçados de Três Coroas (RS), acredita que a produção em grande escala passa necessariamente pela exigência do mercado consumidor. O diretor da Ricarelly, Paulo Ricardo da Silva, completa:
– Não basta o calçado ser diferenciado, ele tem que vender.
A produção brasileira gira em torno de 850 milhões de pares por ano – 20% desse total vai para o mercado externo. Segundo Klein, o investimento em calçados com redução de impacto no ambiente qualificaria o setor. Entretanto, o diretor executivo da Abicalçados não acredita na possibilidade das matérias-primas vegetais suprirem toda a demanda mundial de sapatos no futuro.
– Os calçados verdes devem permanecer como um nicho de mercado – diz.
(Zero Hora, 26/04/2010)