Estudo descobriu que fumadores aumentam mais o peso que os não-fumadores. Explicação está no estilo de vida associado
É a razão número um para que muitas pessoas não reformem os isqueiros e cigarreiras: deixar de fumar engorda. Não são precisos estudos científicos para constatar esse facto, e o medo de ganhar uma boa dúzia de quilos extra assusta qualquer fumador bem intencionado, principalmente as mulheres. Há também quem diga que o tabaco permite manter a linha. Esqueça esse mito: uma equipa de investigadores espanhóis acaba de concluir que continuar a fumar não só não emagrece como também engorda.
São os resultados de um estudo feito pela Universidade de Navarra e publicado na Revista Espanhola de Cardiologia, que durou quatro anos e dois meses e seguiu de perto o comportamento de mais de 7500 pessoas. Os investigadores descobriram que os fumadores activos ganham mais peso que os não-fumadores, mesmo quando se têm em conta factores que podiam desequilibrar as contas, como o sedentarismo, má alimentação, idade, ingestão de fibras e até o hábito de petiscar.
"Os participantes que fumavam desde o início do grupo e continuaram a fumar no seu seguimento apresentaram maior ganho de peso do que os que nunca fumaram", conclui o estudo. A equipa ressalta que são os ex-fumadores quem engorda mais, mas a constatação de que as pessoas que continuam a fumar também engordam mais que os não-fumadores foi considerada inequívoca. O estudo, que tratou homens e mulheres separadamente, indica ainda que as hipóteses de um fumador ganhar cinco ou mais quilos são bem maiores que as de um não-fumador.
Porquê? Não se sabe bem. É certo que os químicos presentes nos cigarros deterioram a saúde - por exemplo, diminuem o fôlego, estimulam a acumulação de gordura nas artérias, dificultam a circulação do sangue - mas o principal motivo deverá ser o estilo de vida dos fumadores. "A razão para este maior ganho de peso não se conhece bem", lê-se no estudo, "mas pode estar relacionada com o facto de os grandes fumadores poderem ter outros hábitos de vida que favoreçam esse ganho". Nomeadamente, o facto de o fumador "ser menos consciente da sua saúde que um participante que nunca fumou" ou de "ter menos força de vontade para cuidar da saúde, o que o torna mais vulnerável ao ganho de peso".
O professor Luís Rebelo, presidente da Confederação Portuguesa de Prevenção do Tabagismo, considera que esta é uma explicação plausível. "Cada vez mais vemos fumadores com problemas de compulsão", indica, o que os impede de "controlar os estímulos" quando fumam, comem e bebem. Por outro lado, pessoas com perturbações psiquiátricas, tais como o transtorno obsessivo-compulsivo, têm mais tendência para serem fumadoras. "Também já sabíamos, com estudos anteriores, que os fumadores comem menos vegetais crus e frutas e têm mais apetência por farináceos e doces", continua o professor.
O psicopedagogo Hilson Cunha Filho comenta que "o consumo de tabaco está associado a outros comportamentos que se enquadram num estilo de vida menos saudável", como o sedentarismo, consumo de álcool e outras substâncias. Salienta que é preciso encarar o estudo com as devidas precauções. Algo que a própria equipa espanhola também refere, já que, por exemplo, todos os indivíduos seguidos eram licenciados e por isso as condicionantes socio-económicas não estão presentes (fumadores de classes mais desfavorecidas têm tendência a comer pior e a ganhar ainda mais peso).
Mas se fumar engorda e deixar de fumar engorda mais, não há esperança para quem quer deixar de fumar? Depende do ponto de vista. O estudo salienta que "grande parte do ganho de peso depois de deixar de fumar ocorre durante o primeiro ano". Se os efeitos forem bem controlados nesse período crítico, é possível que o peso nunca seja substancialmente afectado.
Hilton Cunha Filho sublinha, sobre este tema, que quem pára de fumar precisa de mudar o estilo de vida, com a "adopção de uma alimentação saudável ou dieta e de exercício físico adequado". Além disso, indica, muitas pessoas continuam a fumar por medo de engordar, "quando o risco para a saúde associado ao consumo de tabaco é inúmeras vezes maior do que o possível aumento de peso relatado neste e em outros estudos, e que ocorre igualmente nos que continuam a fumar."
A principal conclusão publicada pela equipa da Universidade de Navarra é que "o tabagismo não é uma forma efectiva de prevenir a obesidade e, de facto, aumenta essa problema, sobretudo em ex-fumadores e em fumadores que continuam a expor-se". Não são dados valores absolutos de quanto engorda cada pessoa, já que esses são números que variam bastante conforme os casos. Mas as fórmulas aplicadas possibilitam chegar a uma média do aumento do peso e a uma média das possibilidades de ganhar cinco ou mais quilos quando se fuma ou já fumou: 2,31 para ex-fumadores e 1,41 para fumadores activos, contra 0,95 de quem nunca fumou.
(Por Ana Rita Guerra, I Online, 23/04/2010)