Fumante há seis anos, Paulo Oliveira Cintra se lembra de como o vício começou: alguns tragos em um cigarro mentolado. "Foi por curiosidade, o cheiro é mais agradável do que o do cigarro comum e não irrita tanto a garganta", diz o auxiliar administrativo, hoje com 23 anos.
O caso de Cintra exemplifica uma situação que as autoridades sanitárias brasileiras pretendem combater, a de que as substâncias aromatizantes misturadas ao tabaco causam uma maior possibilidade de dependência e despertam maior interesse no hábito de fumar, principalmente em adolescentes. Por esse motivo, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) estuda proibir a comercialização desse tipo de cigarro no Brasil. A proibição buscaria acabar com a venda de produtos de tabaco com chocolate, baunilha, cravo e outros condimentos que podem atrair crianças e adolescentes ao fumo.
"Os sabores têm um papel preponderante na iniciação ao fumo entre jovens e adolescentes. Quem fuma sabe que no primeiro contato há tosse e certa rejeição, e os sabores reduzem esse impacto", disse ao site Último Segundo o chefe da Unidade de Controle de Produtos Derivados de Tabaco da Anvisa, André Luiz da Silva.
Segundo um comunicado do Instituto Brasileiro de Auditoria em Vigilância Sanitária, Inbravisa, a proibição da Anvisa pode sair ainda este ano. "Hoje em dia se encontram no mercado cigarros de menta, cravo, cereja, chocolate, baunilha, substâncias que mascaram o sabor e dão a sensação de maior prazer ao fumar", explica Rui Dammenhain, especialista em vigilância sanitária e diretor do Inbravisa.
Comportamento. A opinião do dirigente é compartilhada até por quem vende o produto, como Ruimar de Oliveira Junior. Segundo o empresário, o consumidor dos cigarros aromatizados tem um comportamento atípico em relação ao tabagista comum. "Percebo que quem fuma cigarros mentolados, ou com cravo e canela, são realmente os fumantes iniciantes, os curiosos", diz.
Apesar de comercializar cinco tipos diferentes de cigarros mentolados, Ruimar conta que é a favor da proposta de se proibir a venda desse tipo de produto no Brasil. "A preocupação da Anvisa não é exagerada nesse ponto. Ela procede. Vejo que acontece muitas vezes de o jovem querer parecer mais adulto diante da turma e experimentar um cigarro mentolado. Pode ser que ele nem volte a fumar mais, mas começa assim", afirma Ruimar, para quem o fumante noviço logo deixa os aromatizados e passa para os cigarros comuns.
Exatamente o que aconteceu com o auxiliar de escritório Paulo Oliveira Cintra, que há muito adotou uma marca tradicional do mercado. Questionado sobre a mudança, Cintra diz que a sensação de frescor do cigarro aromatizado há muito ficou no passado. "No final, faz mal do mesmo jeito", diz.
Saiba mais sobre o cigarro aromatizado
Definição. O cigarro é uma pequena porção de tabaco (ou fumo) seco e picado, enrolado em papel fino ou em palha de milho para se fumar.
Aromatizados. Também chamados de cigarros de Bali, misturam o tabaco a substâncias aromáticas, como cravo, canela, chocolates e menta.
Perigo. O eugenol, uma substância presente no cravo, possui efeito analgésico e, quando fumado, pode levar à inalação de grandes quantidades de fumaça de nicotina com uma sensação de suave frescor.
Câncer. Estudos científicos têm demonstrado que a incidência de câncer é muito maior nos fumantes de cigarros de cravo do que nos fumantes regulares.
(Por MARCELO FIUZA, O Tempo, 23/04/2010)