Pela terceira vez, os integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) ocuparam, durante a Jornada Nacional de Lutas - que ocorre todos os anos no mês de abril –, a Fazenda Barrinha, da Veracel Celulose S/A, em Eunápolis (BA). Ao todo, 600 trabalhadores rurais da Bahia e do Espírito Santo estão ocupando a fazenda desde quarta-feira (21). Eles denunciam ações ilícitas que promovem o crescimento dos plantios da empresa na região e cobram a desapropriação de terras devolutas.
A Jornada Nacional de Lutas é marcada anualmente pela mobilização de trabalhadores sem terra pela agilização dos processos de reforma agrária no País.
A ocupação no sul da Bahia, por exemplo, faz parte de um processo antigo de pressão e denúncia contra as empresas produtoras de celulose, como a Veracel e a ex-Aracruz Celulose (Fibria), que atuam, segundo o MST, através da ocupação de terras devolutas, em detrimento da legislação ambiental.
A intenção, dizem os trabalhadores, é pressionar e alertar a sociedade e o governo do Estado para os desmandos cometidos pelas transnacionais, os prejuízos gerados à sociedade e combater a concessão de novas licenças para o aumento das monoculturas no País.
A informação é de que as licenças são concedidas mesmo após a confirmação de abusos cometidos pelas empresas, como é o caso da Veracel. No ano passado, a Justiça Federal na Bahia condenou a Veracel a recuperar 96 mil hectares de mata atlântica (área pouco menor que a cidade do Rio de Janeiro), que destruiu para plantar eucalipto. Entretanto, a área, segundo os trabalhadores, ainda se encontra degradada.
Apesar disso, a Fibria, que detém 50% das ações da Veracel, já anunciou a expansão de sua produção até 2014. A expansão dos plantios de eucalipto se dará através da Veracel 2, no sul da Bahia. A Veracel é uma joint venture que a empresa mantém com a finlandesa Stora Enso. Antes de se tornar Fibria, a Aracruz Celulose e a Stora Enso dividiam em partes iguais as ações da Veracel. Juntas, desmataram mais de 50 mil hectares de mata atlântica no Estado.
Estas empresas utilizam até os dias de hoje, conforme denuncia o MST, as chamadas capinas químicas – um coquetel de agrotóxicos, com predominância de herbicidas e formicidas – nos eucaliptais. Os venenos contaminam a terra, a água, a fauna e a flora. E contaminam também os poucos moradores, como os quilombolas e indígenas, que resistem em meio aos eucaliptais.
A ocupação é uma maneira simbólica de protestar contra a usurpação de terras, impactos sociais e econômicos e a degradação ambiental, promovidas por estas empresas em todo o País.
Entre as denúncias feitas durante a ocupação está a de que o Ministério Público Estadual da Bahia investiga a Veracel, já tendo ingressado com ações contra a empresa. Uma dessas ações tramita na Vara da Fazenda Pública por ato de improbidade administrativa. A acusação é de que a multinacional aumentou seu patrimônio em R$ 7,54 milhões de forma ilícita, ao falsificar documentos, forjar dados e não cumprir obrigações ambientais em conluio com o Centro de Recursos Ambientais (CRA, hoje Instituto do Meio Ambiente – IMA).
Outra denúncia foi publicada pela Agência Petroleira de Notícias, e informa sobre uma denúncia do MP dirigida diretamente ao presidente da Veracel Celulose, Antônio Sérgio Alípio, por falsificar e omitir documentos e participar diretamente “em atividade típica de crime organizado”. Protocolada sob o número 2663697-8/2009, a ação do MP, oferecida pelo promotor João Alves da Silva Neto, aponta que a Veracel e prepostos teriam produzido informações falsas “para tentar ludibriar a percepção” do MPE, ao dizer, em documento assinado, que a empresa “não tinha qualquer arrendamento de terras em áreas do município de Eunápolis, para implantação de eucalipto”. O promotor lista o quatro supostas áreas exploradas pela empresa.
Além de ocupar a fazenda Barrinha, o MST mantém ocupadas as sedes do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em São Paulo, Pernambuco, Piauí, Ceará, Paraíba, Rondônia e Pará. O objetivo cobrar os compromissos assumidos em agosto com famílias acampadas há mais de cinco anos à beira de estradas. A fazenda da Barrinha, que mede4.700 hectares, fica às margens da BR-101, no extremo sul da Bahia.
A Veracel possui cerca de 205 mil hectares de terras no extremo sul da Bahia, sendo cerca de 96 mil hectares de monocultura de eucalipto; sua fábrica de celulose tem produção de cerca de 900 mil toneladas, destinadas à exportação, sendo que metade dessa produção pertence à ex-Aracruz Celulose (Fibria).
A Jornada de Lutas do movimento ocorre, desde 1997, no mês de abril, para lembrar o massacre de Eldorado dos Carajás.
(Por Flavia Bernardes, Século Diário, 22/04/2010)