O Congresso Nacional quer discutir o impasse em torno do leilão de concessão da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, especialmente depois que as construtoras Queiroz Galvão e J. Malucelli ameaçaram deixar o consórcio que ganhou a disputa. A informação sobre a possível desistência das empresas passou a circular logo após a divulgação do resultado do leilão, realizado pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) na terça-feira. Antes, porém, foi preciso derrubar duas liminares concedidas pela Justiça e que impediam a realização do pregão.
O senador Renato Casagrande (PSB-ES), presidente da Comissão de Fiscalização e Controle do Senado, disse que vai propor a realização de audiência para discutir a polêmica em torno da construção da usina com as empresas do consórcio, o governo e entidades ligadas ao meio ambiente.
O grupo de construtoras que venceu o leilão é liderado pela estatal Chesf (Companhia Hidroelétrica do São Francisco), subsidiária da Eletrobras, que possui fatia de 49,98% do consórcio. As participações da Queiroz Galvão e da J. Malucelli são de 10,02% e 9,98%, respectivamente. A construtora J. Malucelli negou em nota oficial divulgada ontem que não teria interesse em fazer parte do empreendimento. De acordo com o comunicado, o grupo “possui atualmente direcionamento estratégico voltado ao setor de energia e construção civil”. Ainda segundo a nota, a construtora “está satisfeita com o resultado do leilão e também com a parceria estabelecida com os demais membros do consórcio (...) e não tem a intenção de sair do projeto”.
Embora negue oficialmente, a construtora já informou que está fora, assim como a Queiroz Galvão (10,02% de participação no consórcio), que enviou aos sócios na semana passada carta em que comunicava a desistência. Na terça-feira voltou atrás e pediu sete dias para tomar decisão definitiva.
Na avaliação da Casa Civil, que não considera irreversível a mudança no consórcio, esse tipo de acomodação é natural. De acordo com a Aneel, porém, a alteração no consórcio só pode acontecer depois da outorga da usina, prevista para 23 de setembro. Dois auxiliares diretos do presidente Lula dizem que a expectativa é que o consórcio vencedor busque novos sócios e subcontrate outras empreiteiras para construir a usina. Em outras palavras, o consórcio final será diferente daquele que ganhou oficialmente a disputa. “A obra é muito grande, tem espaço para todo mundo”, disse um dos assessores de Lula, que aposta na possibilidade de as empreiteiras Camargo Corrêa e Odebrecht negociarem com o consórcio vencedor para tocar as obras de engenharia civil da usina.
As duas empreiteiras haviam desistido de participar do leilão por não concordarem com o preço máximo de R$ 83,00 para a energia de Belo Monte e negociavam, nos bastidores, para integrar o consórcio liderado pela Andrade Gutierrez. O ministro de Minas e Energia, Márcio Zimmermann, minimizou o fato de poder haver mudanças na composição do consórcio vencedor. Segundo ele, o projeto de viabilidade financeira da obra foi bastante estudado e as companhias tinham conhecimento das condições. “Elas têm o compromisso de entregar a obra a esse preço ao consumidor.”
Movimentos sociais criticam Justiça por liberar pregão e seguem questionando aspectos ambientais
O Movimento Xingu Vivo para Sempre, que reúne mais de 100 organizações, pretende continuar questionando a viabilidade ambiental da construção da usina Hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA). Em nota, as entidades se dizem “indignadas e estarrecidas” com decisões do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que derrubou liminares e permitiu a realização do leilão de construção da hidrelétrica na tarde de terça-feira.
“Estamos indignados e estarrecidos com a decisão do TRF da 1ª Região, mais do que com o resultado do leilão. Um país no qual o Judiciário se furta de controlar os desvios cometidos pelo Poder Executivo está a meio caminho de um regime autoritário”, protestam as organizações.
O Ministério Público Federal (MPF) informou que poderá pedir a anulação do leilão se confirmar que houve “desobediência de decisão judicial”. Isso porque uma nova liminar derrubou o leilão pouco antes da hora marcada para o início do processo, mas a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) argumenta que não foi notificada a tempo. Após o término do leilão, a liminar também foi derrubada.
Na nota, o Movimento Xingu Vivo para Sempre reitera as críticas ao processo de licenciamento ambiental da obra e aos riscos da construção para as populações e a biodiversidade do Xingu. As organizações alegam que os pareceres de técnicos do Ibama foram desconsiderados em nome da importância política do projeto.
(JC-RS, 22/04/2010)