Decisão sobre fábrica de celulose deve solucionar crise bilateral entre vizinhos sul-americanos, que já dura mais de três anos
Um grande imbróglio sul-americano deve ter um fim hoje. O Tribunal Internacional de Justiça, com sede em Haia, Holanda, vai anunciar a tão esperada sentença sobre a denúncia argentina de que o Uruguai violou o tratado binacional de uso e preservação do rio fronteiriço.
O processo foi motivado, segundo o governo argentino, pela decisão unilateral uruguaia de autorizar a instalação de uma fábrica de celulose e papel sobre as margens do Rio Uruguai. A Argentina acusa a empresa de poluir as águas e o meio ambiente. A ação legal teve início em 2006, mas a polêmica se arrasta desde 2004, quando o então presidente uruguaio, Tabaré Vázquez, autorizou a construção da fábrica a três quilômetros da pequena cidade uruguaia de Fray Bentos. Do lado argentino, está localizada a cidade de Gualeguaychú, que vive do turismo de suas praias sobre o rio e do carnaval.
Os ambientalistas argentinos iniciaram uma forte campanha contra o projeto e o antecessor e marido da presidente Cristina Kirchner, Néstor Kirchner, iniciou uma feroz briga com Vázquez, o que estremeceu as relações entre os dois países. O caso provocou a pior crise diplomática entre as duas nações nas últimas décadas.
Principal ponte entre os dois países está fechada
Ecologistas de Gualeguaychú mantêm há mais de três anos fechada a principal ponte que liga os dois países. Vázquez pediu em diversas ocasiões a intervenção do Brasil no conflito, alegando que o bloqueio da ponte provoca prejuízos ao Uruguai e fere as normas do Mercosul sobre a livre circulação de bens e pessoas. Contudo, o Itamaraty se esquivou do problema e recusou o papel de mediador do conflito, uma tarefa que acabou nas mãos da Espanha.
A fábrica, que pertencia à empresa finlandesa Botnia e recentemente foi comprada pelo grupo UPM, entrou em funcionamento em novembro de 2007. Os relatórios oficiais de impacto ambiental divulgados até o momento não revelaram contaminação das águas do rio. Nos quase três anos de operação, a fábrica produziu 2 milhões de toneladas de pasta de celulose.
Delegações de ambos os países já se encontram em Haia para a audiência que está prevista para iniciar às 10h de Brasília. Previamente foram realizadas 10 audiências, e os argumentos foram expostos. Após o anúncio do veredicto, os ministros das Relações Exteriores do Uruguai, Luis Almagro, e da Argentina, Jorge Taiana, vão coordenar uma reunião entre os presidentes, para começar a recompor as relações bilaterais.
Buenos Aires
Entenda o caso
- A reclamação: a demanda da Argentina contra o Uruguai se centra no suposto descumprimento do Estatuto do Rio Uruguai, que regula as atividades nas águas compartilhadas.
- Quais teriam sido as irregularidades, segundo a Argentina: a aprovação unilateral das indústrias de celulose Botnia e Ence (esta se retirou) e a habilitação para construir um porto no local.
- Alcance da decisão de hoje: A sentença da Corte Internacional de Justiça é “vinculante”. Ou seja, ambos os países têm de respeitá-la, sob pena de punições por parte da ONU.
(Zero Hora, 20/04/2010)