Os Tupinikim e Guarani que moram no norte do Estado do Espírito Santo, em Aracruz, continuam desamparados pelo poder público. Em meio às comemorações do seu dia, os índios ressaltam que faltam saúde, segurança e educação nas aldeias. O cenário é de uma grande invasão da cultura do homem branco nas aldeias, através de bares e o tráfico de drogas interferindo em sua cultura.
“A situação nas aldeias está muito ruim. Tem gente de fora vindo se esconder aqui e nós não conseguimos impedir porque falta segurança. Já tem tráfico e gente usando maconha e outras drogas”, ressaltou o cacique de Piraqueaçu, Kwaray Peru.
Segundo o cacique, a situação foi repassada na última semana para agentes da Polícia Federal. O objetivo da reunião entre caciques e a PF é impedir a entrada de intrusos nas aldeias e combater o tráfico de drogas na região.
Ao todo, faz três anos que os índios recuperaram suas terras ocupadas pela ex-Aracruz Celulose (Fibria). Mas, até agora, os recursos prometidos e a efetivação de projetos não ocorreram, conforme conta Kwaray Peru. “Ainda não começamos com os projetos, eles estão fazendo estudos e enquanto isso a situação só piora”, ressaltou.
Os projetos que deveriam ser financiados como forma de compensar o impacto ambiental e o tempo de uso pela ex-Aracruz Celulose visavam a garantir a sustentabilidade e a recuperação das terras indígenas. Segundo o estudo agroecológico feito na região, 70% dos 18 mil hectares de terras indígenas ocupados pela Aracruz até 2007 estavam cobertos de eucalipto. Entre os projetos previstos estão projetos ligados à produção de alimentos, criação de peixes em tanques, reflorestamento, entre outras propostas.
Sem eles, a autonomia das aldeias fica comprometida e sem meios de garantir uma vida melhor para os mais de três mil índios que vivem no norte do Estado. E, na região, o poder público pouco faz para garantir a sobrevivência dos índios Tupinikim e Guarani.
Os índios estiveram na semana passada em Vitória para discutir, no Tribunal Regional Eleitoral (TER), a anistia dos que possuíam o título de eleitor irregular e buscam uma forma de garantir o voto dos índios na próxima eleição para presidente do País. Eles ressaltam que não possuem documento de identidade, o que deixa muitos índios sem a possibilidade de votar. Recebidos pelo presidente do TRE-ES, Pedro Vals Feu Rosa, a promessa era de que uma equipe do TRE visitaria os índios para levantar quantos indígenas possuíam título de eleitor irregular e quantos ainda não o possuíam. A intenção é regularizar tudo até às eleições presidenciais deste ano.
“Queremos votar. Somos índios e temos direito de escolher alguém que olhe por nós, já que somos um povo que só é lembrado no Dia do Índio”, desabafou o cacique Tupinikim Valdeir Lima, da aldeia de Pau Brasil.
Segundo os indígenas, nem a saúde nem a educação vem atendendo à população indígena de forma satisfatória. Falta atenção à saúde indígena e respeito à cultura deles, ressaltam.
Só este ano, por exemplo, é que será inaugurada a obra da primeira escola indígena modelo do Estado. A promessa é que a escola seja inaugurada em 360 dias, praticamente no meio do ano letivo, prejudicando a comunidade. O diferencial da escola modelo é que toda a sua estrutura vai ter como referência à cultura indígena, como os pavimentos que serão construídos em formato de oca.
Dia do Índio
Apesar da falta de suporte para manter suas comunidades, os indígenas prometem uma grande festa para comemorar o seu dia. Este é o 26º ano em que os índios, de forma organizada, realizam festejos em comemoração à cultura indígena, na aldeia Tupinikim de Caieiras Velha.
Além de Caieiras Velha, as aldeias de Pau Brasil e Três Palmeiras (onde há uma aldeia temática) também deverão sediar os festejos. Na aldeia de Pau Brasil, os visitantes puderam provar comidas típicas e assistir aos jogos indígenas e apresentações culturais. Em Três Palmeiras, os festejos na aldeia temática Tekoa Mirim, construída para a gravação de um filme, contaram com a participação das comunidades Guarani de Boa Esperança e Piraqueaçu.
Já em Caieiras Velha, onde se encontra o núcleo das comemorações que começara na última sexta (18), houve dança dos curumins e dos guerreiros. Houve também apresentação da banda de congo São Benedito do Rosário, composta pelos índios tupinikins da região.
Segundo os índios, os festejos têm a intenção de aproximar a comunidade, que muitas vezes não conhece, de fato, a própria realidade.
(Por Flavia Bernardes, Século Diário, 19/04/2010)