O Instituto Nacional de Reforma Agrária (Incra) está realizando levantamento fundiário em propriedades rurais no Distrito de Palmas.
O objetivo é desapropriar terras para assentar famílias quilombolas. Na última segunda-feira aconteceu uma reunião entre a diretoria da Associação e Sindicato Rural, Federação da Agricultura no Rio Grande do Sul (Farsul) e produtores em Coxilha das Flores. A finalidade do encontro foi tratar sobre as ações no Incra naquela região. Uma das medidas adotadas foi montar barreira para impedir a entrada dos técnicos do instituto nas propriedades.
Na ocasião foi dito que em Palmas não existem remanescentes de quilombos. Segundo os presentes, o que ocorreu foi que estancieiros costumavam dar pequenos lotes de terras para os empregados.
Contraponto
Ontem a líder comunitária que integra a Associação das comunidades Quilombolas Rurais de Palmas, Eliege Oliveira de Alves esteve no Jornal MINUANO. Na ocasião, Eliege entregou uma declaração assinada por ela e pelo presidente da Associação, Le Omar Alves de Alves sobre a situação que envolve aquela região do município de Bagé.
Ambos afirmam que as famílias quilombolas de Palmas são reconhecidas como remanescentes das comunidades de quilombos pela Fundação Cultural Palmares desde 4 de março de 2004. “Estamos trabalhando e nos organizando em uma associação desde 2003, com reuniões públicas, com atas assinadas e devidamente registradas no cartório de registro público de Bagé. Portanto, não cabe dizerem que não sabem de nada a respeito deste movimento”, afirmam.
Segundo as duas lideranças, o Incra vem trabalhando de forma clara e transparente, com reuniões públicas na comunidade, registradas em atas (que estão em poder do Incra e do Ministério Público). “Nossos vizinhos que hoje se queixam e nos repudiam não comparecem por que não querem, preferindo nos tomarem por bobalhões, inclusive nos pichando com alcunhas pejorativas. Este órgão se reúne conosco desde 2004”, ressaltam Le Omar e Eliege.
Segundo ele, o processo de regularização fundiária vem sendo trabalhado de forma pública, inclusive com permanência dos historiadores, geólogos e antropólogos por dias seguidos na comunidade. Ambos afirmam que essa equipe chegou até mesmo a participar de festas promovidas pela comunidade de produtores rurais do Cerro do Mal Criado. “Temos registros que comprovam a veracidade deste fato”, atestam.
Conforme as lideranças quilombolas, não é verdadeira a versão de que o Incra vai trazer famílias para assentar em Palmas. Segundo eles, isto não consta no decreto presidencial e as famílias que vivem na região já foram cadastradas pelo Incra, e somente elas têm o direito a esta posse de terra.
De acordo com as lideranças, conforme a instrução normativa do Incra, a posse desta área, no final do processo será da associação e dos quilombolas que detêm títulos em dia na área, ficando assim descartada a hipótese desta posse permanecer com o órgão.
“O Incra indenizará todas as propriedades e suas benfeitorias, que vier a ser desapropriada, se ela estiver com o registro de imóvel, em dia”, garantem os quilombolas.
Le Omar e Eliege afirmam que o processo de regularização fundiária em Palmas está plenamente de acordo com as regras do decreto presidencial nº 4887 de 20 de setembro de 2003.
Por fim declaram que os quilombolas estão amplamente amparados pelo Ministério Público e pela Defensoria Pública da União. “Por este motivo nós preservamos o direito de deixar nossa defesa a cargo destes órgãos, pois não é nossa intenção aumentar ou promover tensões com nenhuma representação de latifundiários e produtores”, alegam.
Conforme Eliege, no Distrito de Palmas que compreende as localidades de Coxilha das Flores, Pedreira e Rincão do Inferno, existem 42 famílias remanescentes de quilombos que fazem parte da associação.
MPF acompanha o processo
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Por meio de sua assessoria de imprensa, o Ministério Público Federal do Rio Grande do Sul (MPF/RS) enviou e-mail para o Jornal MINUANO se posicionando sobre o caso.
Segundo a nota, o Ministério Público Federal em Bagé informa que acompanha, desde 2007, todos os atos do procedimento de titulação da comunidade quilombola de Palmas através do Inquérito Civil Público 1.29.001.000052/2007-87.
De acordo com o MPF, o procedimento para a titulação das terras da comunidade quilombola de Palmas foi instaurado pelo Incra em 7 de março de 2005. “Neste procedimento, que é público, assim como todos os atos do Incra, já foi elaborado amplo estudo antropológico e reconhecida a comunidade como remanescente de quilombo, estando, atualmente, na fase de levantamento fundiário das terras, com a prévia notificação dos proprietários para vistoria pela autarquia fundiária”, diz a nota.
O Ministério Público Federal, na condição de defensor da ordem jurídica e dos direitos sociais e individuais indisponíveis, informa à sociedade, que o direito ao reconhecimento das terras das comunidades remanescentes de quilombos é garantido pela Constituição Federal e previsto em tratados internacionais (Pacto de São José da Costa Rica e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho - OIT) ratificados pelo Brasil.
Incra quer reunião com produtores
Os produtores de Palmas continuam acampados em um entroncamento de estradas na Coxilha das Flores. O objetivo é impedir que os técnicos do Incra entrem nas propriedades. De acordo com informações do representante da Federação da Agricultura no Rio Grande do Sul (Farsul), o Incra queria uma reunião com o os produtores de Palmas na próxima terça-feira em Porto Alegre. Os agricultores não aceitaram. Eles pedem que o encontro aconteça em Palmas até porque, segundo eles, é mais fácil os representantes do Incra virem até o local do que os produtores se deslocarem até a capital gaúcha.
(Jornal Minuano, 08/04/2010)