Enquanto James Cameron, Diretor do filme Avatar, premiado com o Oscar, peregrinava em Altamira, Lula elogiava Minc por sua destreza em licenciar Belo Monte que “vai suprir o povo de energia barata e limpa”. Assim, o leilão para concessão de energia no dia 20 de abril, marcado propositalmente um dia depois do Dia do Índio (19) e antes do feriado nacional (21), acertado meticulosamente para dificultar os protestos, tem um quê de desrespeito às duas datas, um quê de autoritarismo rançoso. A ficção científica é aqui.
Quando em 2001 a Odebrecht lançou a idéia do projeto do Complexo do Madeira ao governo federal e à sociedade do Brasil e da Bolívia, o fez através de um sem número de apresentações fantasiosas. Começaria uma verdadeira escalada para a construção de mega usinas hidrelétricas na Amazônia. Nessa época, Belo Monte já estava em evidência há muito tempo – desde o final dos anos 1980, com as manifestações de protesto de povos indígenas e organizações não governamentais ou pautando a mídia sedenta de sangue com a imagem da índia Tu ira e seu majestoso facão atraído pelo olhar “eletrizante” do então engenheiro e hoje presidente da Eletrobrás, José Antonio Muniz Lopes.
Agora, destravadas as usinas do Madeira nas mãos da ex-ministra Marina Silva sob um vazio técnico de detalhes do processo virulento que as aprovou, Belo Monte voltou do passado revigorada pelos PAC s de Lula e Dilma Rousseff e desta vez apoiada pela “nata” das indústrias eletrointensivas e do setor energético. O Madeira se tornaria a pedra fundamental da obra grandiosa de implosão da Amazônia, Belo Monte poderá ser o alicerce e as usinas do Tapajós a estrutura. Parece não haver fuga da saga neo-transformista do governo Fernando Henrique Cardoso hoje sob o conservadorismo econômico travestido de esquerda de Lula.
O licenciamento do Madeira deixou um legado que infelizmente não tem servido para respaldar a luta contra Belo Monte, agora, sob o brilho hollywoodiano de Avatar. Apenas Belo Monte ganhou status de Oscar; as violações dos direitos das populações tradicionais e dos povos indígenas que estão se perpetrando pelo Brasil, do Paraná a Rondônia, de São Paulo ao Pará não são filmes de ficção. Agora, o Diretor mitômano ungido por alienados de Hollywood e a reboque da luta contra Belo Monte disputa os holofotes diante da midiática exposição: ficção ou realidade?
O conflito épico de Avatar é aqui mesmo, desde que Itaipu, Balbina, Tucurui, Estreito, Samuel e outras tantas hidrelétricas, pequenas ou grandes, têm se tornado objeto de desejo de empresas estatais como as subsidiárias da Eletrobrás – Furnas, Eletronorte e Eletrosul ou das empreiteiras e holdings internacionais de energia, sempre penduradas no “vai da valsa” da infra-estrutura brasileira. Não começou agora. Construir Brasília foi uma escola para a Camargo Corrêa e outras empreiteiras que com ela aprenderam a fácil lide de se locupletar com obras superfaturadas que podem bancar muitas campanhas eleitorais.
Cento e vinte mil indígenas já sofrem os impactos de hidrelétricas no Brasil, segundo a Funai, e estima-se que esse número duplicará diante desse Inferno, como aquele retratado por Dante Alighieri na Divina Comédia do século XIV, que vai transfigurar a Amazônia sob os auspícios do desenvolvimento. Cameron passeou pelo Pará, foi à Volta Grande do Xingu, conversou com os movimentos e ganhou a mídia. Prometeu escrever a Lula e lutar contra a hidrelétrica. Prometeu um novo filme a ser rodado na Amazônia com a sua realidade de efeitos especiais. Ele, James Cameron, levou ao Xingu a esperança de Sting dos anos 1980, mas em época de tecnologia cinematográfica.
(Por Telma Monteiro, Blog Telma Monteiro, 01/04/2010)