A abertura do Fórum Internacional de Estudos Estratégicos para Desenvolvimento Agropecuário e Respeito ao Clima (FEED 2010) ontem (28) à noite, em São Paulo, mais se assemelhou a uma festa do que ao início de um ciclo de debates sobre mudanças climáticas.
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), organizadora do evento, investiu na contratação de atrações, como a orquestra regida pelo maestro João Carlos Martins, e parte da bateria da Escola de Samba Mocidade Independente de Padre Miguel, para receber os participantes do encontro, em grande parte, produtores agropecuários brasileiros e estrangeiros.
O samba, com direito ao requebrado de passistas da Mocidade, teve o objetivo não só de oferecer aos fazendeiros dos outros países um show tipicamente brasileiro, mas também, de ilustrar uma parceria anunciada, entre a CNA e a escola de samba, para a criação de um enredo sobre as mudanças da agropecuária brasileira rumo à sustentabilidade, que será apresentado no desfile do Carnaval de 2011.
Os esforços dos agropecuaristas para reverter sua imagem, geralmente aliada aos impactos negativos causados por sua atividade à natureza, não pararam por aí. Antes da apresentação da bateria da Mocidade, que marcou o encerramento do primeiro dia do fórum, foi divulgado, por meio de um vídeo, o projeto Biomas, iniciativa da CNA, em parceria com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), que promete uma rede de experimentação em agropecuária sustentável, para mapear as áreas frágeis de propriedades rurais, sugerindo formas de produção que respeitem o meio ambiente.
"A mão que produz é a mesma que preserva o meio ambiente". A frase encerrou o vídeo publicitário, que anunciava a necessidade de se aumentar em 70% a produção mundial de alimentos até 2050, devido ao crescimento populacional, propondo, como ideia de "agropecuária sustentável", a conciliação do plantio de pinus e eucalipto com a pecuária, em determinadas áreas.
Após a execução de diversas músicas pela orquestra de Martins, que deu início ao evento, o público recebeu a notícia de que a senadora e presidente da CNA, Kátia Abreu, esperada para abrir o fórum, não compareceria por estar doente. O vice-presidente executivo e presidente da Comissão Nacional de Meio Ambiente da CNA, Assuero Doca Veronez, substituiu a senadora, com um discurso que enfatizou a importância do evento para que "não se cometa o erro de limitar o crescimento da produção de alimentos, sem as devidas convicções científicas".
Durante um coquetel refinado, a platéia, sentada em mesas de jantar, ouviu Veronez dizer que "há hoje um excessivo alarmismo, um terrorismo, atribuindo aos produtores rurais uma responsabilidade pela degradação do meio ambiente, que não coaduna com a realidade".
Segundo o vice-presidente executivo, o fórum pretende planejar o futuro da produção agropecuária a partir do uso do rigor da ciência, em substituição a militância ambientalista sectária e fraudes científicas. "A solução para as mudanças climáticas não é a redução do consumo, mas o progresso de tecnologias de produção e ocupação das áreas mais adequadas", afirmou.
Ele também criticou a legislação ambiental brasileira e disse que muitas das responsabilidades atribuídas aos produtores rurais são de natureza ideológica e política. "Temos uma legislação que limita a produção rural sem benefício claro à sociedade".
Rumo à COP 16
Quanto à relação entre o fórum e as discussões internacionais sobre mudanças climáticas, Veronez disse que o setor agropecuário "deve ser proativo e subsidiar o governo brasileiro na construção de uma proposta sólida para mitigação das emissões de gases do efeito estufa, a ser apresentada na COP 16 [Convenção das Partes sobre o Clima deste ano]".
Em seguida, falou o embaixador extraordinário para a mudança do clima do Ministério das Relações Exteriores (MRE) brasileiro, Sérgio Serra. Durante sua palestra, o diplomata apresentou um balanço do que foi discutido na COP 15 no ano passado, em Copenhague, admitindo que o acordo firmado na ocasião "não foi um fracasso, mas não teve o sucesso esperado".
"Foi um acordo incompleto, mas um importante passo adiante. O documento foi político por não ter sido consensual, e não pode se transformar em decisão formal da COP", explicou.
Serra destacou que, para não haver nova frustração com relação ao resultado da COP 16, em Cancun, no México, as expectativas devem ser atenuadas, e um resultado completo só deve ser esperado para a COP 17, a ser realizada na África do Sul. Ele também afirmou ser necessário que o Brasil recupere sua credibilidade frente a países amazônicos, Bolívia e Venezuela, que não assinaram o acordo informal firmado por cerca de 30 países em Copenhague.
"Temos que continuar a discussão sobre Redd [Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação] e Redd plus, que começou na COP 15, e avançar para atrair esses países- que boicotaram o acordo-, para a negociação global sobre mecanismos de conservação e valorização da floresta", disse o embaixador.
(Por Fabíola Munhoz, Amazonia.org.br, 30/03/2010)