Foi grande - de quase 80% - a redução do lucro líquido da Mineração Rio do Norte, uma das maiores produtoras de bauxita do mundo, instalada no Pará: caiu de 220 milhões de reais em 2008 para apenas R$ 46,3 milhões no ano passado. Uma das causas desse fraco desempenho foi a crise internacional de 2009, que provocou a diminuição tanto da produção quanto dos preços, conforme fenômeno que abalou o mercado internacional de commodities. Mas o fator principal foi interno: a MRN desistiu de continuar a contestar na justiça a autuação que recebeu da Receita Federal em 2000. Essa autuação resultou, três anos depois, na aplicação maior multa já recebida por uma empresa no Brasil.
A Receita considerou ilegal a redução de 30% do seu capital que a mineradora fez em 1999, alegando estar com excesso de capital. Os recursos foram distribuídos entre os acionistas. Como a Rio do Norte foi beneficiada por colaboração financeira da Sudam e isenção ou redução de impostos, o governo devia ter sido consultado para aprovar a redução, que abrangeu dinheiro público, oriundo de renúncia fiscal do tesouro nacional. A autuação foi, na época, de R$ 316 milhões. Hoje, com as atualizações, chega a quase o dobro do valor inicial.
A empresa fez o depósito judicial não só para poder recorrer em juízo como para não perder os benefícios do programa de refinanciamento de sua dívida com o próprio governo. Em 2000 a MRN fez um Refis no valor de R$ 51,6 milhões, referente a débitos de PIS e Cofins/Finsocial, que seriam quitados em 10 anos, com pagamentos mensais. Se não fizesse o depósito judicial do valor da autuação de 2003 perderia o benefício e teria que pagar toda a dívida à vista.
Considerando "as divergências de votos nos últimos julgamentos" do seu recurso e os benefícios que o governo instituiu em maio do ano passado, transformando em lei uma medida provisória que concedia novos e maiores benefícios aos devedores do fisco, "a MRN decidiu descontinuar o processo judicial", informou a diretoria, no relatório do balanço anual de 2009, publicado no início do mês. Ela lembra que o processo "está suportado por depósito judicial no valor de R$ 600 milhões e o custo de liquidação será de R$ 283 milhões", valor que pesou sobre suas contas anuais.
Graças a esse novo Refis, o valor do débito atualizado, que era de R$ 507,2 milhões, foi reduzido para R$ 283 milhões, sendo R$ 118,3 milhões do principal e R$ 165,1 milhões de atualização monetária. Para cumprir o compromisso, a mineradora recorreu a empréstimos, que, junto com os dividendos distribuídos, tornaram negativo o capital circulante líquido (em menos R$ 89,5 milhões). Feita a quitação do débito, a empresa, "baseada na opinião de seus assessores legais, espera que o valor líquido do depósito judicial seja levantado ainda no exercício de 2010 e, portanto, reclassificou o saldo para o ativo circulante". Saldo que, no caso, seria de mais de R$ 320 milhões.
Como em seus últimos relatórios a mineradora sempre manifestou a confiança de vencer a disputa judicial, iniciada em 2003, a decisão de desistir da querela e recorrer ao novo Refis, para uma redução de quase 50% no valor atualizado do auto de infração, sugere suas coisas. Uma: que a crença na vitória em Brasília não era tão forte. Dois: foi um bom negócio. A MRN acabou formando uma poupança forçada extra para 2010, que deverá ser o ano de recuperação. O desempenho em 2009 ficou abaixo da atuação no ano anterior.
As vendas se reduziram de 18,25 milhões de toneladas, o recorde nos 30 anos de operação da mineradora (como também de produção), alcançado em 2008, para 15,64 milhões no ano passado. Os preços da bauxita foram 11% inferiores porque desabou também o mercado de alumina e alumínio, o maior demandante do minério. Por isso, a receita líquida, que tinha passado ligeiramente de um bilhão de reais em 2008, diminuiu 23%, ficando em R$ 788 milhões.
Mesmo assim, a Rio do Norte foi destacada pelo anuário Valor 1000, pelo segundo ano seguido, como a melhor empresa de mineração do país, numa demonstração do quanto 2009 foi ruim para o setor. Com a incorporação do saldo do depósito judicial, a MRN terá recursos suficientes para prosseguir seus investimentos, com a abertura de novas minas e a manutenção da sua elevada produção, 78% dela destinada agora ao mercado interno, para suprir as fábricas de alumina da Alunorte, no Pará, a maior do mundo, e a da Alumar, em São Luís do Maranhão. Além de tentar recuperar a saúde financeira, que perdeu o viço de exercícios passados. Há três anos o capital líquido circulante é negativo por causa do recurso aos empréstimos. Em 2005, por exemplo, seu lucro líquido foi de R$ 420 milhões.
A perspectiva é de que a produção de bauxita continue a aumentar em grande escala e haja uma especialização entre os produtores, dentre os quais estão as principais multinacionais do setor. Tanto para suprir as necessidades nacionais como para atender a demanda mundial. Consolidando assim essa função de suprimento de matéria prima na qual a Amazônia vai sendo especializada.
(Por Lúcio Flávio Pinto, Adital, 30/03/2010)