Moradores da Rua das Olarias, na cidade de Altamira, no Pará, esperam apreensivos pela instalação da hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu. Eles acreditam que a construção da usina vai trazer mais desenvolvimento e emprego para região, mas estao preocupados com a forma pela qual serão removidos de suas casas.
O G1 está em Altamira e publica nesta semana uma série de reportagens sobre o assunto.
Segundo o projeto do governo federal, a rua está entre as áreas urbanas que serão alagadas para a operação da hidrelétrica.
O local fica na periferia da cidade - a área sempre alaga na época das cheias. Por isso, as casas são construídas na forma de palafitas - pedaços de madeira elevam o nível do imóvel para que nao seja atingido pela água.
Segundo a Prefeitura de Altamira, a área ficará constantemente alagada e as famílias serão removidas para casas de alvenaria a serem construídas pelas empresas vencedoras do leilão da hidrelétrica, marcado para o dia 20 de abril.
O marceneiro Claudionor Alves de Oliveira, de 54 anos, mora há 23 anos em sua casa, na Rua das Olarias. Com a hidrelétrica, ele espera mais oportunidades para a população local.
"Eu sou a favor, e se eles cumprirem o que disseram, de dar moradias, as pessoas vão ter mais oportunidades. É melhor para a gente porque a cidade desenvolve mais."
Ele conta que trabalhou na construção da hidrelétrica de Tucuruí, também no Pará, na década de 80, e, agora, espera ser indenizado.
"Trabalhei dois anos, já ganhei muito dinheiro em obras. Lá em Tucuruí, quem ficou desabrigado foi por própria culpa. Teve gente que entregou a casa, pegou a indenização, gastou e voltou para o mesmo imóvel de antes. Acabaram sem nada", diz Oliveira, que mora com a mulher e o filho mais novo de 13 anos.
A doméstica Oriceia Gomes Araujo, 31 anos, que vive no local com os quatro filhos, não tem a mesma esperança. Ela paga R$ 60 mensais de aluguel numa palafita. O salário dela é de R$ 250, dinheiro com o qual sustenta as crianças com a ajuda da Bolsa Família.
"Não sei para onde vou não, aqui é o lugar mais barato. Acho que não vou ter casa porque moro de aluguel e eles disseram que quem mora de aluguel não tem direito."
Mesmo assim, Oricéia apoia a obra. "Acho que vai ter mais desenvolvimento, mais emprego para o povo", afirma ela, que mora há sete anos no local.
A dona de casa Luciana Matias, 31 anos, disse que "não liga" para a instalação ou não da hidrelétrica.
"Desde que eles indenizem a gente, não vejo problemas em sair daqui", conta ela, que já perdeu móveis em razão de alagamentos - somente a parte dos fundos da casa é construída sobre palafitas; a da frente tem acesso para a rua.
"A preocupação é se a gente vai ganhar outra casa ou não. Até que aconteça, ninguém tem certeza", diz ela com a filha recém-nascida no colo.
O aposentado Agenor Soares, de 69 anos, mora com filhos e netos na Rua das Olarias. "Eu já estou velho e não vai ter serviço para mim nessa hidrelétrica. Se tivesse, eu apoiaria a obra. Mas agora tanto faz como tanto fez. Estou aqui e se me tirarem para um lugar melhor eu agradeço. Se não me derem nada, fazer o quê?"
Soares afirma que há expectativa de melhorias com a usina. "Se for para melhorar tudo bem. Só não pode ficar pior."
Ajuda financeira
Para a prefeita da cidade, Odileida Maria Sampaio, a população local quer a hidrelétrica porque é "a favor do desenvolvimento". Ela disse, porém, que a cidade precisa de apoio financeiro para enfrentar os impactos. "Nós esperamos que o governo federal aja neste momento em que nosso município vai deixar acontecer um empreendimento desses, que vai contribuir para todo o Brasil e evitar o apagão. E acreditamos que o governo federal realmente possibilite oportunidades para as pessoas que moram aqui, com emprego e capacitação."
Críticos
Os movimentos sociais, Igreja e Ministério Público criticam a obra. Para Antônia Pereira Martins, do Movimento Xingu Vivo para Sempre, os principais afetados serão os indígenas e os povos ribeirinhos, da Volta Grande do Xingu.
"Muitos têm a ilusão de que será muito bom, que será o Eldorado. E se o volume da água não for suficiente para manter aquele trecho [Volta Grande] vivo? Pode ficar seco, não ter mais vida, não ter mais peixe. E não estou falando só de animais, mas das pessoas que moram lá, que perdem a navegabilidade, não podem pescar. Tem uma comunidade indígena próxima dali que terá impacto direto", afirma Antônia.
Para ela, falta ainda informação à população. "Para onde vão as pessoas de Altamira, que vai ficar 30% embaixo de água?", indaga, para quem o alagamento de áreas hoje secas provocará a expulsão de trabalhadores rurais.
(Por Mariana Oliveira, G1, 24/03/2010)