Enquanto o Brasil se recuperava de seus carnavais no mês passado, um grupo de banqueiros voou para São Paulo para acabar com um dos acordos mais complicados e longos da história da indústria da construção brasileira. A briga ainda não resolvida pelo controle da Cimpor, empresa nacional de cimento de Portugal, apontou para a importância crescente do Brasil na luta pelo controle do mercado internacional de cimento.
No final do ano passado, a CSN, companhia metalúrgica brasileira, ofereceu 3,86 bilhões de euros pela empresa, e foi aí que a luta começou. A oferta foi rejeitada, e a Camargo Corrêa e a Votorantim, grandes nomes do cimento brasileiro, entraram na disputa. Agora elas parecem ter impedido as ambições da CSN.
A demanda pelo cimento no mundo está polarizada, enquanto a atividade de construção nas economias desenvolvidas e emergentes continua a correr em direções opostas. Na Europa, lar de quatro de cinco empresas de cimento globais, a demanda deve cair 28% entre 2007 e 2010, antes de retomar o crescimento levemente em 2012. O consumo nos EUA deve cair 44% entre 2006 e 2010.
Enquanto isso, uma classe média em rápida expansão em países em desenvolvimento gerou uma demanda por padrões de vida melhores.
No Brasil, a venda de cimento cresceu de 45 milhões de toneladas em 2007 para 52 milhões de toneladas no ano passado e deve chegar a 55 milhões de toneladas em 2010, movida na maior parte por uma poderosa nova classe média que está reformando suas casas ou construindo novas.
O Brasil, onde o gasto com infra-estrutura também está subindo, enfrenta a dupla tarefa de hospedar a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 –e ambas vão aumentar a demanda por cimento.
“Depois da China e da Índia, (o Brasil) é o mais importante mercado para as empresas de cimento, especialmente considerando a queda na construção na Europa e EUA”, disse Tobias Woerner, analista de construção da MF Global.
Ainda assim, pessoas que conhecem o acordo dizem que talvez a Votorantim e a Camargo Corrêa estivessem mais motivadas a impedir o crescimento da CSN do que a conquistar parte do mercado.
“Os banqueiros advertiram à CSN que ia ficar com o nariz sangrando se continuasse tentando fechar a compra da Cimpor, pois a última coisa que as empresas de cimento no Brasil querem é um novo agente bem capitalizado entrando no mercado”, disse uma pessoa inteirada da situação.
De fato, a CSN já construiu uma fábrica de cimento ao lado de sua siderúrgica perto do Rio e deve continuar se expandindo.
“O pior resultado para a Votorantim e a Camargo seria a CSN adquirir 100% da Cimpor, então elas vão se sentar nas reuniões de acionistas como o pior dos inimigos”.
A CSN inicialmente ofereceu 5,75 euros por ação da Cimpor e, no mês passado, aumentou sua oferta para 6,18 euros. Mas isso foi menos que os 6,50 que a Camargo pagou para conquistar uma participação inicial de 28,6% da Cimpor. A proposta da CSN foi rejeitada pelo conselho da Cimpor, e nenhum dos acionistas aceitou a oferta.
Também no mês passado, a Votorantim fez uma troca de ativos com o grupo de cimento Frances Lafarge, que detinha 17,3% da Cimpor, e fechou um acordo com o banco de poupança português Caixa Geral de Depósitos por outros 9,6% de participação.
A Votorantim portanto está com 30,8% de participação e a Camargo com 32,5%.
A CSN diz que não está mais interessada na Cimpor, mas pessoas do mercado dizem que não se deve descartar a possibilidade de outra oferta.
Nem a Votorantim nem a Camargo Corrêa quiseram comentar. As empresas enfrentam duas possibilidades: fecharem um acordo em tempo para a reunião de acionistas em abril ou travarem uma batalha pelo controle.
Pessoas informadas da situação rejeitam a hipótese que as empresas queriam apenas bloquear a CSN. As duas têm equipes dedicadas a análises de potenciais fusões e aquisições.
As pessoas dizem que o mais interessante na Cimpor são suas atividades fora do Brasil do que o que tem no país. A Votorantim começou a expandir no exterior em 2001 e tem investimentos nos EUA, Canadá e quatro vizinhos do Brasil. A Camargo está presente na Argentina. Para as duas, as operações da Cimpor em 20 países, inclusive em grandes mercados emergentes como China, Índia, Turquia e África do Sul, têm forte apelo.
Qualquer que seja o resultado final, é improvável que seja o final da busca por exposição neste mercado cada vez mais importante.
(Por Ed Hammond e Jonathan Wheatley, Financial Times / UOL, 23/03/2010)
Tradução: Deborah Weinberg