O último dia do 3º Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental, que acontece em Cuiabá (MT), iniciou com uma discussão bastante calorosa em relação à produção de energia. O tema “Crise energética e agrocombustíveis” foi debatido pelo pesquisador Paulo Teixeira de Souza Jr., do Centro de Pesquisa do Pantanal (CPP), e pela jornalista e pesquisadora Verena Glass, do Repórter Brasil.
Paulo Teixeira ressaltou que o Brasil é o líder mundial em produção e consumo de energias renováveis. Enquanto a média mundial é de 14% de fontes de energia renováveis, o Brasil tem 45% de sua matriz renovável. Esse posicionamento se deve muito à produção da cana-de-açúcar no país, desenvolvida desde o século XVI, sendo a oligarquia do álcool antiga e bem-estabelecida.
Sobre as mudanças climáticas, o pesquisador defendeu que os agrocombustíveis são menos agressivos ao meio ambiente. A emissão do gás carbônico gerada pelo consumo de álcool, além de ser cinco vezes inferior à da queima do petróleo, é reabsorvida pela própria plantação cana. Outra vantagem apontada foi a não-emissão de óxidos de enxofre, responsáveis pela chuva ácida.
Em relação ao biodiesel, Paulo Teixeira destacou a variedade de fontes para a sua produção, que têm como base óleos vegetais (soja, girassol, algodão, milho, dendê) ou gordura animal, a lubrificação promovida pelo combustível nos motores dos veículos e, também, a baixa emissão de gás carbônico e a não emissão de óxidos de enxofre. Para o pesquisador, a produção do biodiesel representa uma oportunidade para a agricultura familiar e a possibilidade de diminuir as desigualdades sociais entre as regiões.
Entretanto, nem tudo são flores
A pesquisadora Verena Blass, apontou o outro lado da produção dos agrocombustíveis. A soja é a principal base para a produção de biodiesel no Brasil, e na lista dos 20 maiores desmatadores do Cerrado, aparecem 15 usinas produtoras deste combustível. Outro ponto crítico ressaltado por Verena é a mão de obra escrava e infantil. Entre os anos de 2004 e 2009, foram registrados 41 casos de trabalho escravo nas unidades produtoras de soja.
Os demais óleos vegetais utilizados na produção do combustível como dendê, mamona e girassol são nobres, tendo alto preço. O dendê, apesar de ter a maior produtividade, consume muita água e demanda muito adubo químico, além de ser uma espécie exótica cultivada como monocultura na Amazônia, o bioma mais sensível do Brasil.
A pesquisadora falou também sobre o sebo bovino, a segunda matéria-prima mais utilizada na produção de biodiesel no país. A pecuária foi a responsável por 69% do desmatamento da Amazônia entre os anos de 1997 e 2006, além de ser a produção em que acontece a maior concentração de trabalho escravo no país.
Em relação à cana de açúcar, Verena Blass, apontou que, só no ano de 2008, para a plantação de cana-de-açúcar no Mato Grosso foram derrubados 2.385 hectares de vegetação nativa. No mesmo ano, 24 usinas de Pernambuco foram multadas pelo Ibama por crimes ambientais. Entre 2004 e 2008, o consumo de agrotóxicos na produção do álcool saltou de 29 mil para 50 mil toneladas. Outro grave problema lembrado pela pesquisadora é a localização de usinas nas áreas delimitadas pela Funai e o aumento do número de ataques sofridos pelos indígenas nestas regiões.
Verena também ressaltou questões relativas à contaminação de cursos d’àgua, solo e ar e o desrespeito às normas referentes a Áreas de Preservação Permanente (APP) e Reservas Legais, questionando a sustentabilidade deste tipo de produção energética.
A pesquisadora finalizou sua apresentação falando sobre o Zoneamento Agro-ecológico da cana (ZAE), lançado em 2009 como um marco técnico. O zoneamento definiu Pantanal, Bacia do Alto Uruguai, Amazônia e terras indígenas como áreas de exclusão de cana, impedidas de receber financiamentos públicos para a produção. A Bancada Ruralista no Congresso já afirmou que irá contra este zoneamento.
(Por Danielle Sibonis, EcoAgência, 19/03/2010)