As condições de vida e os direitos dos povos indígenas Guarani do Mato Grosso do Sul, no Centro-Oeste brasileiro, estão sendo extremamente violados e ameaçados. Se comparados com outras etnias das Américas, os indígenas estão entre os que vivem em piores condições. Foram estas as constatações do relatório produzido pela Survival International para o Comitê para Eliminação da Discriminação Racial da Organização das Nações Unidas (Cerd ONU).
O relatório, que será divulgado em 21 de março, Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, revela que problemas como assassinatos, suicídios, desnutrição, alcoolismo e deslocamentos forçados estão no topo das situações extremas enfrentadas pelos Guarani. O fator predominante para o desencadeamento das problemáticas é o não reconhecimento do direito a terra.
Após visita ao Brasil, em novembro de 2009, a comissária para Direitos Humanos da ONU, Navi Pillay, constatou que a situação de descaso com os indígenas Guarani se contrapõe totalmente ao progresso econômico do país.
Em outubro do mesmo ano, a ex-ministra do Meio Ambiente, Senadora Marina Silva, também esteve no Mato grosso do Sul e declarou que "os problemas enfrentados pela população indígena ‘são de natureza muito grave’ e que os 45 mil índios do Estado enfrentam um verdadeiro ‘apartheid social’, devido à falta de garantias para que possam exercer seus direitos".
Após assistirem de mãos atadas ao roubo de suas terras e constatarem as recusas do governo brasileiro e do Estado do Mato Grosso do Sul em reconhecerem seus direitos a terra, o povo Guarani está sendo obrigado a "se envolver em trabalhos forçados" ou oferecer sua mão de obra por uma remuneração miserável para sobreviver.
Uma das principais causas da tomada de territórios Guarani é o crescente interesse nas terras para a produção de cana-de-açúcar, matéria-prima do etanol, e para a plantação de soja e chá, além da criação de gado e para programas de assentamento do governo. Por estes motivos, grandes comunidades indígenas têm como última opção montar acampamentos na beira de rodovias, onde são alvos fáceis de atropelamentos e da ação de pistoleiros contratados por fazendeiros.
O saqueio das terras também acarreta a existência de "aldeias superlotadas", onde a população depende de ajuda do governo para sobreviver e passa por problemas de deterioração da saúde e desnutrição. A prova, é que os Guarani do Brasil tem expectativa de vida mais de 20 anos abaixo da média nacional.
Esta soma de fatores é também o principal motivo desencadeador de suicídios. De acordo com o relatório da Survival que será encaminhado para a ONU, o índice de suicídio entre os Guarani é um dos mais altos no mundo. Mais de 625 indígenas tiraram a vida desde 1991, entre eles, crianças de apenas nove anos. Em 2005, o índice de suicídio entre os Guarani foi 19 vezes mais alto do que o índice nacional.
Com o inevitável deslocamento para outros territórios, ocorre uma desestruturação da sociedade Guarani. Os homens vão em busca de trabalhos temporários em fazendas e refinarias saindo do convívio de suas famílias e abandonando seus modos de organização social. A não aceitação dos despejos forçados ocasiona detenções injustas, destruição de casas e comunidades e assassinatos.
Em suas conclusões, a Survival International apela ao Cerd a fim de que o governo brasileiro tome uma série de medidas que visem garantir os direitos e o respeito ao modo de vida dos Guarani. No topo das reivindicações está a finalização, em caráter de urgência, do programa de demarcação das terras. Também é pedido que seja respeitada a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial e a Convenção 169 da OIT sobre os direitos de povos indígenas. Outras reivindicações estão relacionadas à agilização dos casos de disputa de terras, fim da impunidade dos crimes cometidos contra os Guarani e medidas para que os indígenas não sejam ilegalmente detidos.
Para ler o relatório na íntegra, acesse aqui.
(Por Natasha Pitts, Adital, 18/03/2010)