E-mail que condena a imunização contra a gripe A é desmentido por autoridades e especialistas
Uma mensagem anônima circulando na internet desde a semana passada está sendo desmentida por médicos e criticada pela Secretaria Estadual da Saúde por confundir a população. Em tom alarmista, o e-mail chama a vacina contra o vírus da gripe A de assassina e orienta as pessoas a não se imunizarem, colocando em dúvida a qualidade das doses e das campanhas desenvolvidas pelo governo.
O autor do texto afirma que o produto contém substâncias capazes de provocar um “genocídio”. Entre erros de pontuação e frases sem sentido, sugere haver uma “tramoia” entre a Organização das Nações Unidas (ONU) e fabricantes para garantir lucros com a venda da vacina.
Cansada de mensagens do tipo, a vice-presidente nacional da Sociedade Brasileira de Imunizações (Sbim), Isabella Ballalai, classificou o alerta como irresponsável. A especialista disse que as vacinas já foram usadas nos Estados Unidos e na Europa com êxito. Segundo ela, não houve registro de mortes nem de efeitos colaterais graves.
O chefe do serviço de Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Luciano Goldani, diz ter sido um dos primeiros a se vacinar por aqui. Como o colega André Luiz Machado da Silva, infectologista da Vigilância Epidemiológica da Capital, ele teme que os gaúchos deixem de se proteger.
– Fiz a vacina e o máximo que senti foi o braço dolorido – disse Goldani
O secretário estadual da Saúde, Osmar Terra, também rechaçou o e-mail, definido como “sórdido” e “covarde”. Ele fez um apelo ao gaúchos:
– Não deixem de se vacinar. Risco correrá quem acreditar nesses boatos.
Respostas e desmentidos
Como autoridades e especialistas avaliam as oito razões apontadas para que as pessoas evitem a vacina*:
“A vacina contra o H1N1 contém mercúrio (...) O Mercúrio em outras vacinas está ligado à epidemia de autismo entre crianças”
O que dizem os especialistas
- O mercúrio é usado em praticamente todas as vacinas para evitar a contaminação por bactérias, mas em doses muito pequenas, que não causa malefícios. Pesquisas científicas recentes revelaram que a associação entre a substância e o autismo não se confirma.
“Ela (a vacina) contém esqualeno, uma substância que, quando injetada no corpo, pode fazer o sistema imunológico humano voltar-se contra si mesmo”
O que dizem os especialistas
- A vacina contra a gripe A não contém essa substância na fórmula.
“Ela (a vacina) contém células de câncer de animal que podem provocar câncer nas pessoas”
O que dizem os especialistas
- Não há esse tipo de célula na fórmula da vacina contra a gripe A, portanto o risco não existe. Além disso, células tumorais não são transmissíveis.
“O governo federal não está confiante quanto à segurança da vacina, por isso que foi dada às indústrias farmacêuticas imunidade contra ações judiciais”
O que diz o Ministério da Saúde
- O Ministério da Saúde não assinou nenhum termo de imunidade judicial com nenhuma indústria ou empresa. As empresas são responsáveis pelos seus produtos.
“A entrada no mercado da vacina foi acelerada, o que significa que todos os efeitos colaterais a médio e longo prazo não são conhecidos”
O que dizem os especialistas
- A tecnologia usada no desenvolvimento da vacina é a mesma utilizada na fabricação das doses contra a gripe sazonal. A principal diferença é que a nova vacina inclui uma cepa diferente do vírus. Trata-se de vírus inativado (morto), o que aumenta o grau de segurança da vacina.
“Em 1976, instituto médico afirmou que havia uma situação crítica relativa à gripe suína (...) As pessoas começaram a morrer ou a ficar inválidas após tomarem a vacina”
O que dizem os especialistas
- Naquela época, houve casos localizados de gripe A entre recrutas de Fort Dix, nos EUA, e foram aplicadas doses de uma vacina elaborada de um modo diferente da que existe hoje. Em alguns casos, houve complicações e decidiu-se interromper a campanha. Mas a vacina atual é completamente diferente e não tem demonstrado o aparecimento de tais complicações.
“Estatísticas e fatos estão sendo manipulados para provocar pânico”
O que dizem os especialistas
- Os dados não foram manipulados, pois foram controlados e compartilhados de perto por diferentes entidades e instituições, o que foi evidente principalmente no Rio Grande do Sul.
“De acordo com declarações dos centros de controle de doenças, agência de drogas e alimentos e da Organização Mundial da Saúde, o H1N1 é uma doença moderada, da qual muitas pessoas se recuperam em uma semana sem medicação.”
O que dizem os especialistas
- Embora a maioria das pessoas tenha se recuperado bem da doença, pela magnitude da pandemia houve um número significativo de mortes e complicações no mundo inteiro. Em função disso, torna-se fundamental a campanha de vacinação contra a doença.
A etapa da campanha de vacinação segue voltada aos profissionais de saúde até sexta-feira. Confira a lista de quem deve se vacinar nessa fase:
- Médicos e outros profissionais que trabalham em ambulatórios de clínica médica, pediatria, obstetrícia, pneumologia e leitos de UTI de hospitais de emergência e hospitais de referência para a gripe A
- Médicos e outros profissionais de consultórios públicos e privados que tratam a gripe
- Trabalhadores que atuam na atenção básica ou nos programas da Saúde da Família em atividades de vigilância ou manejo clínico de casos de gripe
- Equipes de laboratório responsáveis pelo diagnóstico da doença
- Profissionais que atuam na vigilância epidemiológica dos casos suspeitos
- Profissionais que atuam no controle sanitário de viajantes nos portos, aeroportos e fronteiras
*Fontes: Luciano Goldani, professor de Infectologia da UFRGS, Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações e o infectologista André Luiz Machado da Silva
(Zero Hora, 17/03/2010)