O Palácio do Planalto já começou a montar a operação financeira e societária para a criação da "superelétrica" a ser comandada pela empreiteira Camargo Corrêa. O governo quer que os fundos de pensão das estatais e o BNDES injetem recursos na nova empresa.
Pelo formato avalizado pelo Planalto, a CPFL (controlada pela empreiteira) será a cabeça da companhia. Num primeiro momento, incorporaria a Neoenergia, na qual a Previ (fundo dos funcionários do Banco do Brasil) e o próprio BB têm a maior parte do capital votante. Depois, já capitalizada, a elétrica compraria a Brasiliana (holding controladora de Eletropaulo, AES Sul e AES Tietê).
Assim, conforme a Folha antecipou no mês passado, seria criada uma gigante no setor, com mais de um terço da distribuição de energia no país. Cálculos preliminares apontam a necessidade de R$ 15 bilhões a R$ 17 bilhões para a aquisição da participação majoritária nas duas empresas.
Analistas de mercado avaliam que a operação faz todo o sentido para a Previ. Ela também é sócia da CPFL, o que gera conflito de interesses devido à sua participação na Neoenergia. Com a fusão das duas, a Previ integraria o bloco de controle da nova companhia a partir da CPFL, que continuaria sob o comando da Camargo.
Fonte ligada às transações diz que a Previ faria um movimento parecido com o que a Andrade Gutierrez fez na Light, vendendo sua fatia na concessionária mas se posicionando na controladora, a Cemig, que hoje é a dona da Light.
Um dos mecanismos estudados pelo governo para viabilizar as transações é a criação de um Fundo de Investimento em Participações (FIP), cujos cotistas seriam principalmente os fundos de pensão -Previ, Petros (Petrobras) e Funcef (Caixa Econômica Federal)- e a BNDESPar, braço de participações do BNDES. O FIP faria parceria com a CPFL na compra das outras duas elétricas.
A estratégia faz parte da decisão do governo Lula de fomentar a formação de grandes grupos nacionais. A ministra Dilma Rousseff já disse publicamente que apoia o negócio e que a concentração no setor é uma tendência global.
Na Brasiliana, o maior obstáculo é societário. A americana AES, sócia do BNDES na holding, não mostra disposição de vender sua parte. O BNDES tem 53,85% do capital total, mas a operação é da AES, que tem maioria do capital votante.
Pelas regras atuais, tanto BNDES como AES não podem negociar diretamente com ninguém. A oferta das ações tem de ser por leilão. O governo já havia tentado colocar a fatia do BNDES à venda, mas como a AES tem direito de preferência, acabou desistindo.
No último mês, a AES alardeou que está capitalizada, pois recebeu injeção de US$ 2 bilhões do fundo soberano chinês, e que estaria disposta a ficar no Brasil e até elevar a sua presença. Fontes próximas à ministra disseram que ela considerou a atitude dos americanos "uma afronta pessoal".
A ordem foi partir para uma pressão direta para que a AES deixe o país. A Folha apurou que o BNDES já negocia a saída dos americanos da sociedade e que a discussão agora é só o preço. Executivo familiarizado com o negócio disse que a CPFL provavelmente terá de pagar caro pela Brasiliana, mas, diante de boa oferta, a AES não teria motivo para não vender.
Outra dúvida é a possibilidade de o leilão atrair rivais interessados na Eletropaulo. Para executivo do setor, dificilmente um grupo teria musculatura financeira para bater a Camargo, turbinada pelos fundos e o BNDES. Segundo ele, as grandes múltis de energia estão fragilizadas pela crise global.
(Por Leila Coimbra e Leonardo Souza, Folha de S. Paulo, 01/03/2010)