O bispo do Xingu e presidente do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Dom Erwin Kräutler rebate, em carta, crítica do Ibama à nota da CNBB contra a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. A carta foi publicada pelo sítio do Cimi, 26-02-2010.
Eis a carta.
É direito do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) reagir à nota da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) em que a entidade se posiciona contra o projeto Belo Monte. Projeto que, oficialmente, até o momento, só foi apresentado de modo unilateral, como se apenas vantagens trouxesse.
No entanto, eu esperava que o Ibama reagisse com mais sinceridade e serenidade. Apelar para as quatro audiências e afirmar em alto e bom som que com isso cumpriu os parâmetros legais é querer tapar o sol com a peneira e defender o indefensável. As quatro audiências não passaram de encenações mal feitas. O argumento de que oito mil pessoas participaram não se sustenta, nem sequer acrescentando aos presentes nos diversos locais o exagerado número de policiais militares que foram acionados para "manter a ordem", quando na realidade estavam lá para intimidar os que se opõem ao Belo Monte.
Os que rejeitam Belo Monte jamais optaram pela violência. As ameaças sempre partiram dos defensores do projeto, os membros do consórcio Belo Monte, que, já em junho de 2006, gritaram da altura de seus palanques em bom e alto som: "É guerra" e "Temos que baixar o cacete!". Sem falar ainda da prepotência e arrogância tão ostensivamente manifestadas contra os que não rezam por sua cartilha.
Nós havíamos exigido e continuamos a exigir que os povos indígenas e ribeirinhos e a comunidade das cidades de Altamira, Vitória do Xingu, Senador José Porfírio, Anapu e Porto de Moz sejam ouvidos sem constrangimentos e cerceamento de sua liberdade através de um policiamento ostensivo. Que sejam ouvidos nos lugares onde realmente vivem e residem, nas suas aldeias, na Volta Grande do Xingu, nas cidades, nos bairros de Altamira que serão atingidos pela inundação e nas regiões de programada e irreversível deterioração do solo.
Propusemos 27 audiências. Foram feitas apenas quatro para cumprir um ritual preestabelecido. O povo, que será gravemente impactado, não foi ouvido como mereceria, nem teve acesso às audiências por causa das distâncias que deveria vencer para chegar aos lugares determinados pelo Ibama, ou simplesmente não teve condições de se expressar.
(Por Erwin Kräutler, Cimi, Amazonia.org.br, 27/02/2010)