O Atlas de Pressões e Ameaças às Terras Indígenas na Amazônia Brasileira, um amplo e detalhado estudo elaborado pela organização não governamental Instituto Sociambiental (ISA) durante quatro meses de levantamento, revela um conflituoso cenário entre o desenvolvimentismo do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC) do governo federal e os interesses das comunidades indígenas afetados pelas obras de hidrelétricas construídas, em construção ou projetadas para a região. Pelos dados da entidade, cerca de 44% dos 300 mil nativos que vivem na Amazônia, distribuídos em 173 povos estabelecidos em 405 áreas, serão afetados pelas hidrelétricas.
O levantamento do ISA demonstra que entre usinas de grande e pequeno porte, 83 hidrelétricas estão em operação atualmente na região, 26 estão em fase de construção e outras 184 já estão planejadas, com obras projetadas para entrar em execução nos próximos anos. Destas, 198 são as chamadas Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHS) e 12 são grandes usinas, a exemplo da Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará. Segundo a projeção da entidade, até 2030, o número de novas usinas chegaria a 247.
– A maior parte das obras do PAC interceptam ou impactam diretamente territórios indígenas – diz o geógrafo Wagner Tramm, da Funai, um dos críticos da falta de responsabilidade socioambiental na concessão de licenças para as obras.
Tramm é responsável pelo Programa de Compensação Ambiental Xerente (Procambix), desenvolvido para aliviar os efeitos da Hidrelétrica Luiz Eduardo Magalhães, em Lajeado (TO). Resultado de parceria público-privada (PPP) e administrado por um conselho que, antes da emissão do parecer favorável à licença ao empreendimento, garantiu o respeito socioambiental, o programa poderia ser utilizado para mitigar os efeitos das demais obras do PAC.
– Mas o programa foi abandonado – lamenta Tramm.
As usinas vão produzir impacto nas bacias dos rios Xingu, Madeira, Tapajós e Caciporé. O ISA estima que em apenas 27 projetos estudados por seus consultores, o impacto das obras incidirá diretamente sobre uma população de 44 mil índios, cuja sobrevivência depende basicamente da pesca, navegação e, em especial, da qualidade das águas afetadas pelas turbinas de megausinas como as de Belo Monte e do Rio Madeira. Para aliviar o impacto, o governo optou pelo PCHS, mas em algumas regiões as usinas acabaram se proliferando além do que o programa dá conta. No Rio Juruena, no Mato Grosso, por exemplo, estão projetadas oito usinas para um único curso d”água.
Segundo estudos da entidade, os principais rios e afluentes das bacias amazônicas também serão afetados pela mineração e o desmatamento. O estudo aponta que existem atualmente mais de 5 mil processos minerários (alvarás e licenças de exploração, áreas em disponibilidade e requerimento de lavra garimpeira e pesquisa) que incidem sobre 125 áreas na Amazônia, onde vivem aproximadamente 140 mil índios. Já a fronteira agrícola deverá criar ramificações em direção às áreas mais isoladas.
(Portal do Meio Ambiente, OngCea, 11/02/2010)