"É claro que um encontro como esse, depois do fato consumado, a gente pergunta qual será ainda a utilidade pública". Assim o bispo da Prelazia do Xingu, Dom Erwin Kräutler, definiu a conversa que teve com o presidente do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), no último dia 03, sobre o licenciamento da usina hidrelétrica de Belo Monte.
Ao falar de um "fato consumado", Dom Erwin se refere à concessão da Licença Prévia (LP) para o empreendimento dois dias antes do encontro entre o presidente do instituto, Roberto Messias Franco, e o bispo. "Para minha maior surpresa, dia 1° saiu a licença prévia, e até cogitei não ir de início, porque nem valeria a pena ir lá [ao encontro com Messias], mas resolvi aceitar porque não quero ser considerado uma pessoa que se nega ao diálogo", conta.
No site do Ibama, foi dada a informação de que a reunião só "não ocorreu antes da concessão da LP para Belo Monte por problemas de agenda de Dom Erwin". O bispo diz, no entanto, que o presidente do instituto já havia tomado a iniciativa de marcar a reunião dez dias antes da concessão da licença prévia, e a data do dia 03 para o encontro foi definida em comum acordo.
"Eu fui lá, mas eu também, em nenhum ponto, alterei minha posição. Coloquei, reclamei mais uma vez que as audiências públicas [para discussão do projeto de Belo Monte] eram insuficientes e o povo não teve condição de falar e se expressar", diz sobre o conteúdo da conversa.
Questionado com relação ao resultado do encontro, o bispo se mostrou desapontado. "Eles sempre falam em diálogo, mas diálogo na medida em que você aceita tudo. Para mim, esse é o problema".
De acordo com o integrante da Prelazia do Xingu, as 40 condicionantes para liberação da LP a Belo Monte, que foram apresentadas por Messias na reunião, "pecam pela raiz", e a licença é falha.
"Estou convicto de que essa hidrelétrica como foi planejada não será um bem para a própria nação. Eu não sou contra por ser contra, mas nós temos todos os estudos, nós temos o pessoal de universidade que advertiu", afirmou.
Erwin também anunciou que o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), órgão presidido por ele, e outras entidades vão propor uma ação judicial contra a licença prévia dada à usina logo depois do carnaval. "Nós usamos todos os caminhos legais, que a Constituição Federal nos outorga". Ele, no entanto, admite que, muitas vezes as decisões judiciais também favorecem as empresas com interesse em obras como a de Belo Monte.
"Essa é a tática do fato consumado e do rolo compressor. Numa democracia, não deveria estar acontecendo isso. Tem muito autoritarismo por trás disso. Nós temos argumentos e esses são desconsiderados, e o rolo compressor passa por cima", afirma o bispo.
(Por Fabíola Munhoz, Amazonia.org.br, 10/02/2010)