O diretor da organização iraniana de energia atômica, Ali Akbar Salehi, revelou nesta quarta-feira que negocia com o Brasil e a França uma parceria para que realizem o processo de enriquecimento do urânio iraniano --na linha do acordo assinado no ano passado com as potências e a ONU (Organização das Nações Unidas) para o enriquecimento de seu combustível nuclear em solo exterior.
Salehi explicou que o acordo ainda não foi fechado e as negociações com Paris e Brasília continuam. Caso aceitem a proposta, Brasil e França receberiam o urânio iraniano enriquecido a 3,5% e entregariam combustível enriquecido a 20% --suficiente para geração de energia e inviável para a produção de armas.
Citado pela agência de notícias Ilna, Salehi disse ainda que o processo de enriquecimento pode ser feito em um país do leste da Ásia. Ele não quis confirmar aos jornalistas os rumores de que o Japão está sendo estudado como opção por Teerã. "Há conversas com uma série de países da Ásia", se limitou a responder.
O chanceler iraniano, Manouchehr Mottaki, também disse que o urânio iraniano poderia ser trocado na Turquia, no Brasil ou no Japão, caso um acordo seja alcançado.
Há alguns meses, houve a especulação de que o enriquecimento do urânio iraniano seria feito na vizinha Turquia. Porém, o nome do Japão ganhou força nas últimas semanas devido às boas relações de Tóquio tanto com Teerã, como com Washington e o resto da comunidade internacional.
Especialistas também lembram o fato de o atual diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Yukiya Amano, ser japonês, o que aumentaria as chances do Japão contribuir com o Irã.
Em sua primeira declaração oficial sobre o assunto, Amano afirmou na semana passada que o acordo de enriquecimento "ainda está sobre a mesa".
Mudança
As declarações de Salehi seguem anúncio do presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, de que o país está disposto a enviar seu urânio enriquecido para o exterior em troca de combustível nuclear para fins científicos.
Ahmadinejad pareceu abrir mão pela primeira vez das condições de envio parcial que Teerã havia imposto para aceitar a troca proposta pela ONU --o que atenuaria as preocupações ocidentais de que o Irã acumule material radiativo adequado para o uso em armas nucleares.
O Irã, que nega a intenção de desenvolver armas atômicas, enviaria urânio baixamente enriquecido para ser reprocessado no exterior, e em troca receberia combustível mais enriquecido para um reator de pesquisas médicas.
Pela proposta em discussão, o Irã embarcaria 70% do seu estoque de urânio baixamente enriquecido, que seria convertido no exterior em cápsulas de combustível compatíveis para o uso no reator médico, mas inviável para o desenvolvimento de armas nucleares.
"O Irã tem a tecnologia necessária para enriquecer urânio a 20% sozinho, mas a República Islâmica não vê obstáculo algum para cooperar com os países nucleares", explicou Ahmadinejad. "No Irã, alguns dizem que se o mandarmos para fora [combustível], não nos devolverão, mas se fizerem isso, demonstrarão que não são países confiáveis", acrescentou.
"Pode levar quatro a cinco meses até recebermos o combustível. Se mandarmos nosso urânio enriquecido para o exterior e eles não nos derem o combustível enriquecido a 20% para o nosso reator, somos capazes de produzi-lo dentro do Irã", reiterou.
Planos
A proposta de intercâmbio de urânio havia sido feita no ano passado pela AIEA.
O Irã havia ignorado o prazo dado para uma resposta, até 23 de outubro. Pouco depois, enviou uma contraproposta impondo o envio em etapas de urânio, para que não corresse o risco de ficar sem nenhum estoque.
Em seguida, os líderes iranianos passaram semanas fazendo duras declarações sobre a soberania do programa nuclear iraniano e negando qualquer acordo. Agora, no entanto, o governo parece empenhado em evitar uma quarta rodada de sanções da ONU ao seu programa nuclear, como desejam os EUA e seus aliados.
Os EUA ameaçaram impor novas sanções contra o Irã, em particular às empresas que vendam gasolina, algo que conta com o apoio de países como Reino Unido, França e Alemanha.
No entanto, nações como a China consideram que o diálogo com Teerã deve continuar, tendo como objetivo conseguir uma solução global.
A declaração de Ahmadinejad é aparentemente algo inédito, mas a palavra final sobre a questão nuclear cabe ao líder supremo do regime islâmico, o aiatolá Ali Khamenei.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/mundo/ult94u688760.shtml
(EFE / Folha Online, 03/02/2010)