Caracteres árabes têm aparecido nas TVs dos EUA, com T. Boone Pickens, empresário do ramo petrolífero, providencialmente lendo uma tradução para o inglês: "Volte a dormir, América; a crise do petróleo acabou", entoa ele, impassível, no novo vídeo, ao som de uma sedutora música do Oriente Médio.
Mas, de repente, a imagem mostra tropas americanas no deserto e chamas se erguendo, e Pickens declara: "Eu acho que não!". Qual é a dele?
O bilionário texano gastou grande parte dos últimos dois anos e US$ 62 milhões numa campanha na qual propunha o uso da energia eólica para substituir o gás natural, liberando assim o gás para o uso em veículos, o que por sua vez substituiria o petróleo estrangeiro.
Nenhum americano que tenha uma TV pôde escapar ao argumento de Pickens no ano passado. Mas, por algum motivo, a conversão em massa para os carros a gás não aconteceu.
Pickens, 81, então, está agora subindo o tom e abrindo a carteira para gastar mais alguns milhões em uma nova campanha, que entrou no ar em meados de janeiro.
Seus assessores esperam que a mensagem mais incisiva, focada na segurança nacional, seja eficaz após o frustrado atentado aéreo do dia de Natal e de outras ações terroristas. "Somos infiéis para a maioria dessas pessoas, e elas de nada nos servem", disse o empresário. "Estamos ficando cada vez mais dependentes das pessoas erradas."
O homem que fez grande parte da sua fortuna com o petróleo e que nos últimos anos se voltara para a energia eólica agora minimiza o vento como uma possível solução, mas continua promovendo o gás natural. Algumas das suas ações empresariais se valorizariam se o consumo de gás natural aumentasse.
O gás natural é o mais limpo dos combustíveis fósseis, emitindo menos gases-estufa do que o carvão ou o petróleo. Muitos especialistas o consideram subutilizado como combustível para energia e transporte, especialmente depois que recentes tecnologias liberaram enormes reservas de campos gasíferos xistosos nos EUA.
Mas os partidários do gás natural ficaram em segundo plano quando a Câmara dos EUA aprovou uma lei climática no ano passado, já que parlamentares de Estados carboníferos se empenharam em manter o carvão como o principal combustível do país para a geração elétrica. O gás natural pode até receber mais atenção no Senado, mas suas perspectivas lá também são duvidosas.
Céticos dizem que instalar a infraestrutura para veículos a gás natural seria caro demais e que carros elétricos movidos a bateria ou híbridos são uma alternativa melhor.
"É dificílimo mover montanhas na política energética, e Pickens ainda não moveu nem um morro", disse Amy Myers Jaffe, especialista em energia da Universidade Rice, em Houston. "O problemas que Pickens enfrenta é que, nos EUA, se você é do setor petrolífero, as pessoas naturalmente suspeitam do que você diz a respeito da política energética."
Na versão antiga do seu plano, Pickens defendia que os EUA construíssem milhares de turbinas eólicas e instalassem linhas de transmissão para distribuir a nova energia a cidades de todo o país.
Agora, ele afirma que o financiamento para esse tipo de projeto se tornou quase impossível, em grande parte porque o gás barato deixou a energia eólica menos competitiva. Seu foco atual é quase todo no gás.
Ele deseja que o governo converta toda a frota federal de automóveis para o gás natural, que o Congresso dê grandes créditos fiscais para empresas que usem veículos a gás e que os postos de combustível instalem os equipamentos necessários.
Pelo cálculo de Pickens, abastecer com gás um pequeno percentual dos caminhões e ônibus do país já substituiria até 8% das importações de petróleo até 2017. "Tudo o que você precisa é colocar o remo na água", afirmou. "Aí você está no caminho para desembarcar do petróleo da Opep."
(Por Clifford Krauss, Folha de S. Paulo, 01/02/2010)