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plano climático emissões de gases-estufa
2010-02-01 | Tatianaf

O tema é penoso, pode até parecer irritante ao eventual leitor – pela insistência -, mas não há como fugir dele. Porque na semana em que se encerra o prazo para os países registrarem voluntariamente se estão de acordo com o texto final apresentado na reunião da Convenção do Clima em Copenhague e quais são seus objetivos para reduzir emissões, na verdade, nada se avançou – embora se tenha discutido naquele encontro que é preciso fazer todos os esforços para que a temperatura da Terra não suba mais que l,5 grau até 2050 (esteve 0,56 grau acima da média em 2009; todos os anos da década estiveram entre os mais quentes).

Também se discutiu ali que será preciso que os países industrializados contribuam com US$ 10 bilhões anuais até 2012 para ajudar os países mais pobres a enfrentar mudanças climáticas (“chegando a US$ 195 bilhões anuais em 2020″), mas até aqui nada aconteceu. Os países industrializados continuam mergulhados apenas nas discussões sobre sua crise econômica e de mais não querem saber. Não espanta, assim, que o secretário-geral da convenção, Yvo de Boer, tenha dito (Estado, 21/1) que não garante que se consiga chegar este ano a um acordo satisfatório, embora já haja mais uma reunião da convenção marcada para Cancún, no fim do ano.

E tudo isso acontece no momento em que Sul e Sudeste brasileiros estão mergulhados em tragédias decorrentes de mudanças do clima e da nossa incapacidade de lidar com elas. Barragens rompem-se ou transbordam, centenas de milhares de pessoas estão sob ameaças graves em dezenas de cidades, onde as chuvas atingem volumes inéditos. Segundo a Agência Nacional de Águas (Estado, 12/1), mais da metade dos reservatórios de abastecimento no País está com as comportas abertas, capacidade de retenção esgotada.

Mas embora a acentuação de “eventos extremos” como as chuvas volumosas tenha sido evidente – com 525 municípios em estado de emergência em 2007, mais de 800 em 2008 e 841 até setembro de 2009 -, lembrou este jornal em editorial (6/1, A3) que foi gasto de 10 a 15 vezes mais em reparos após as catástrofes do que em medidas de prevenção. E, muito grave, nenhum centavo foi aplicado na implantação do Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos ou no projeto de coordenação do Sistema Nacional de Defesa Civil. Caracteriza-se, assim, ao longo de muitos anos, um continuado descaso ante a possibilidade prevista de tragédias.

Felizmente, algumas iniciativas importantes começam a ocorrer. Como a do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais de lançar um sistema de avisos meteorológico sobre eventos “severos” (chuvas e ventos intensos, principalmente), que poderá ajudar os municípios a se prepararem a tempo. Ou, no mesmo instituto, um sistema que cruza no mapa dados sobre chuvas e a estrutura geológica da área (coluna de Sonia Racy, 27/1).

“Estamos nos expulsando do planeta”, diz o renomado consultor econômico Jeffrey Sachs (texto de 27/1). “Esta é a última oportunidade que os seres humanos terão para rever radicalmente os rumos da nossa vida sobre a Terra.” E nos remete de volta a 1992, quando foi aprovada no Rio de Janeiro a Convenção do Clima, com as advertências de seu então secretário-geral, Maurice Strong: “Esta é a última oportunidade que o ser humano terá para rever radicalmente os rumos da nossa vida sobre a Terra.” Passados 18 anos, o Brasil prepara-se para sediar em 2012 a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que (Agência Brasil, 3/1) terá entre seus temas a procura de uma “estrutura de governança internacional para a área do desenvolvimento sustentável”, diante do malogro, evidenciado mais uma vez em Copenhague, do sistema de decisões das convenções da ONU, que exige consenso (inalcançável, dada a divergência de interesses entre países industrializados e os demais) para qualquer acordo.

Revendo os textos que escreveu em 1992 para o Jornal do Brasil e a Revista Imprensa (A Terra pede água, edição 54), o autor destas linhas não pode deixar de ser assaltado por certa melancolia. Todas as avassaladoras questões com que nos defrontamos hoje estavam presentes naquelas discussões – a “crise da água”, a desertificação planetária, mudanças climáticas, camada de ozônio, poluição do ar pelas emissões de veículos e industriais, a perda de florestas tropicais, os oceanos tomados pelo lixo, os rios paulistas (Tietê, Piracicaba, Paraíba do Sul, Sorocaba) em situação dramática. E a população crescente no mundo exigindo a “mudança de padrões civilizatórios”, já que os países industrializados, com menos de 20% da população mundial, consumiam mais de 80% dos recursos totais; se renda média dos demais países se igualasse à deles (multiplicando por seis), a catástrofe seria rápida e brutal. Tudo levava às perguntas do falecido psicanalista Hélio Pellegrino: “Para que serve a espécie humana? Será ela uma gafe da natureza?”. Hélio pensava que a natureza nos fez para poder se enxergar.

Talvez seja possível acrescentar que, entretanto, parece não nos haver dado a capacidade de enxergar todas as consequências das nossas ações. Uma evidência disso está em que na Agenda 21, aprovada em 1992, já se pedia que a contribuição dos países industrializados aos demais, para enfrentar todos os dramas mencionados, passasse de 0,36% de seu produto bruto para 0,70%. Com isso seria possível ter (com os valores da época) US$ 120 bilhões por ano, aos quais os países beneficiados deveriam acrescentar US$ 480 bilhões anuais. Em Copenhague discutiu-se a concessão de US$ 10 bilhões anuais pelos países industrializados…

Mas – escreveu também em 1992 o autor destas linhas – “cidadãos conscientes e participantes não se limitam à postura infantil de chorar e reclamar, esperando passivamente que alguém resolva. Cidadãos conscientes discutem, formulam soluções, exigem que sejam implantadas. E pagam com satisfação por elas. (…) O Estado somos nós, a falência é nossa.”

(Por Washington Novaes, O Estado de S.Paulo, EcoDebate, 01/02/2010)


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