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fórum social mundial
2010-01-27 | Tatianaf

A concentração para a marcha de abertura do Fórum Social Mundial (FSM) 2010 - Grande Porto Alegre, segunda-feira, no Centro da Capital gaúcha, foi uma mostra do espaço que as centrais sindicais estão ocupando nesta edição.

Com representação numerosa e exibição ostensiva de faixas, cartazes, camisetas e bonés, são o movimento de maior visibilidade do FSM. Na passeata inaugural, por exemplo, levaram carros de som e, com centenas de sindicalistas, tomaram o Largo Glênio Peres, gritando palavras de ordem.

O grupo quer levar a discussão de causas dos trabalhadores para a construção de uma nova agenda estratégica para o mundo. "O movimento sindical é fundamental para a construção dessa agenda mundial", avalia o organizador do FSM e presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no Rio Grande do Sul, Celso Woyciechowski. A CUT estima ter mais de 500 participantes de diferentes regiões do País no Fórum.

De acordo com Woyciechowski, o movimento sindical tem o papel de fiscalizar as empresas e cobrar atitudes mais justas para a sociedade. Ele destaca, ainda, a questão ambiental como um tema que ganhará espaço nos debates. "O trabalho e a produção têm que estar inseridos nessa negociação", aponta.

O presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) no Rio Grande do Sul, Guiomar Vidor, calcula que mais de mil pessoas ligadas à entidade estejam participando desta edição do FSM.

Ele acredita que a importância do evento está em concentrar diferentes posições. "O FSM tem se posicionado como agregador de forças. Ele capta todo o tipo de luta global, principalmente a trabalhista."

O presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT) no Estado, Paulo Barck, espera que mais de 100 dirigentes sindicais e associações comunitárias da organização se envolvam com as atividades do FSM. "Eles tentarão chegar às propostas que podem fazer o mundo melhor", analisa. Ele relata que a entidade mobilizou cerca de mil pessoas, ligadas direta e indiretamente ao movimento, para o FSM.

"No FSM juntamos forças para ver as coisas acontecerem", reflete. Barck acredita que, passados dez anos após a primeira edição, o inimigo dos trabalhadores continua sendo o neoliberalismo. "Vamos abordar a crise econômica para gerar alternativas e propostas concretas ao capitalismo e ao neoliberalismo", projeta.

Nesse sentido, o presidente da Força Sindical no Estado, Cláudio Janta, acrescenta que o FSM é o palco ideal para a discussão das políticas trabalhistas. Conforme Janta, além do número expressivo de brasileiros, mais de 30 dirigentes sindicais de outras nações prestigiam o encontro.

A organização não confirmou os dados informados pelas centrais porque ainda não finalizou o credenciamento de participantes.

Intelectuais apontam fadiga no crescimento
O modelo de crescimento que pavimentou a economia do século 21 está dando sinais de fadiga. Para o geógrafo David Harvey, professor da Universidade da Cidade de Nova Iorque, os investimentos para gerar expansão média de 3% ao ano de produtos e serviços da economia são insuficientes. Para Harvey e demais especialistas que analisaram a conjuntura econômica ontem, dentro do 10º Fórum Social Mundial (FSM), um dos problemas está no direcionamento de grande volume de recursos para o sistema financeiro, em detrimento da aplicação na economia real.

A francesa Susan George, que integra a Associação pela Taxação das Transações Financeiras em Apoio aos Cidadãos (Attac), e o economista Paul Singer, secretário de economia solidária do Ministério do Trabalho e Emprego, defenderam que os bancos devem ser públicos ou comunitários. A solução asseguraria o direcionamento de recursos e investimentos para atender às demandas reais. "Se a meta é crescer 3%, considerando que a média desde 1750 foi de 2,5%, é preciso gerar o mesmo grau de oportunidade de investimentos", condicionou o geógrafo. Ele alertou para a nova bolha prestes a estourar na economia, desta vez, na China, que estaria vivendo espiral de valorização de ativos.

Para Harvey, os sucessivos superávits das economias foram deslocados, nas últimas décadas, a ativos, mercado imobiliário e commodities. "Tivemos 30 anos sucessivos de crises no sistema financeiro. Hoje a oferta de moeda está dissociada da construção da vida real", confrontou, para indicar ainda que as experiências comunistas e socialistas também não conseguiram dar respostas às necessidades de crescimento. O palestrante citou ainda que o sistema capitalista está na sua fase de destruição, sugerindo esgotamento de reformas.

Singer apontou que a busca de mudanças e de um "outro mundo possível", parafraseando o lema do FSM, deve conjugar múltiplas mudanças, que atingiriam o sistema de produção, a tecnologia, as relações sociais e a estrutura de classes, o sistema político-institucional, o uso de recursos ambientais e vida cotidiana. Susan George situou a forma de exploração da natureza, com recentes dados sobre aquecimento global e dificuldades de acordo para frear emissão de poluentes, como foco de novas crises.

"A vida no planeta ficará quase impossível", advertiu a dirigente da Attac. "A solução é inverter a ordem de prioridade, colocando o ambiente em posição mais relevante que a economia e a sociedade", sugeriu Susan, que criticou o deslocamento de terras para cultivos dedicados à produção de biocombustível.

A dirigente da entidade defendeu que a chamada crise ecológica se sobrepõe à econômica. "Podemos fazer transição para um novo sistema econômico, mas na área ambiental, depois de certo ponto, não se pode mais voltar atrás." Susan propôs que os bancos, que tiveram forte aporte de recursos públicos nos Estados Unidos e Reino Unido, devem direcionar crédito para projetos ecológicos e que foquem pesquisas de uso sustentável da natureza. "Temos de fazer um acordo verde, não sobre custos, mas para direcionar investimentos à expansão de fontes gratuitas de energia e produção de agricultura sustentável", ilustrou.

Paul Singer chegou a criticar a tese de que o crescimento agrava a degradação ambiental. Para Singer, a recuperação do ambiente faz parte das expansões e precisam ser buscadas. O economista citou a China, que cresce a taxas de mais de 8% ao ano, que enfrenta problemas com recursos naturais, mas começa a buscar saídas. Ele também lembrou que as atividades que mais crescem estão ligadas a áreas de serviços, que não geram impacto ambiental.

Empresas poderão pagar 5% de participação nos lucros
Como forma de compensar a dedicação do trabalhador, uma comissão formada pelo governo federal, juristas e organismos da sociedade civil discute um projeto de lei que pode determinar às empresas repartir 5% do lucro líquido com os funcionários, a chamada Participação dos Trabalhadores nos Lucros e Resultados da Empresa (PLR), prevista na Constituição.

De acordo com a proposta apresentada ontem, no Fórum Social Mundial, a PLR passaria a ser obrigatória e as companhias que não cumprissem a norma seriam penalizadas com aumento no Imposto da Renda. A ideia inicial é fazer com que as companhias repassem 2% do lucro de forma igualitária aos empregados e os 3% restantes com base em critérios próprios. A proposta integra um texto com outras sugestões para regulamentar o mercado de trabalho, como a regulamentação da atividade terceirizada, proteção das práticas sindicais, autorização para o pagamento e débitos trabalhistas com correção monetária e normas para o trabalho em casa. A comissão que debate o projeto de lei pretende fechar a proposta ainda neste semestre e encaminhá-la para a Casa Civil.

Perda de espaço dos EUA marcou a década
Há dez anos, quando foi realizado pela primeira vez o Fórum Social Mundial (FSM), a conjuntura política era outra. O mundo ainda não havia presenciado o 11 de Setembro ou a crise financeira mundial, que ainda assola os Estados Unidos.

Aos convidados que participaram da mesa de discussões sobre o tema, ontem no Cais do Porto - no segundo dia de debates do seminário Dez Anos Depois: Desafios e Propostas para Outro Mundo Possível para refletir sobre os rumos do FSM - coube fazer essa análise e projetar perspectivas para o futuro.

Todos os palestrantes concordaram pelo menos em um ponto: a hegemonia política, econômica e militar dos Estados Unidos foi alterada nos últimos dez anos, mudando o tabuleiro do poder no mundo.

Se as décadas de 1970, 1980 e 1990 foram marcadas pela definição clara de uma contraposição entre hemisférios Norte e Sul, hoje a história é outra, afirma o diretor do jornal Le Monde Diplomatique Bernard Cassen. "Os Estados Unidos perderam parte de sua hegemonia política, militar e econômica. Política, porque fracassaram na criação de mercados comuns na Amércia Latina - como a Alca (Área de Livre Comércio das Américas).

Econômica porque foram fortemente afetados pela crise no setor imobiliário. E militar, afinal não se consegue mais vencer as guerras que travaram, seja aquela no Afeganistão ou no Iraque", avalia Cassen.

Ocorreu nos últimos dez anos o que ele chamou de redistribuição do poder. "Basta ver que as atenções do mundo não estão mais voltadas para as reuniões do G-4 (grupo que reúne as quatro maiores economias do mundo), mas sim do G-20", ressalta.

Quando se pergunta o que contribuiu para essa derrocada da hegemonia norte-americana sobre o mundo, o coordenador do Fórum Social nos Estados Unidos, Michael Leon Guerrero, explica: "Uma série de fatores. As guerras, as lutas internas como o direito dos imigrantes e outras minorias, o 11 de Setembro, a eleição de Barack Obama".

Segundo ele, os Estados Unidos passam por profundas crises que devem se agravar nos próximos anos. "A grande expectativa com a eleição de Obama era de que as reformas sociais ocorreriam, mas nada disso parece estar em marcha", avalia Guerrero.

A maior economia do mundo é abalada por problemas comuns aos latino-americanos como altas taxas de desemprego - cerca de 10% -, dificuldades nos orçamentos estaduais, e desarticulação dos movimentos sociais que perderam força.

Contudo, o maior desafio que os Estados Unidos terão pela frente é a discussão dos direitos dos imigrantes. "Obama deveria assumir uma atitude mais ofensiva e garantir as mudanças necessárias, mas infelizmente os bancos são quem faz o lobby nos Estados Unidos hoje", relata Guerrero.

Preso, ativista palestino enviou vídeo em defesa de sua causa
Um dos convidados para o painel Conjuntura Política do seminário Dez Anos Depois: Desafios e Propostas para Outro Mundo Possível não compareceu por ter sido preso em dezembro para ser interrogado pelo Exército israelense.

Libertado no final de semana, o palestino Jamal Juma não veio ao Fórum Social Mundial (FSM) em Porto Alegre, mas levantou a pauta para a comunidade internacional através de um vídeo, exibido ontem no Cais do Porto. Juma conclamou todos a lutar pelos direitos dos palestinos em Israel. Ele lidera a principal resistência à construção do muro da Cisjordânia - Stop the Wall Campaign.

Boliviano critica investimentos externos do Brasil
O coordenador do Centro de Estudios Aplicados a los Derechos Econômicos, Sociales y Culturales da Bolívia, Gustavo Soto Santiesteban, chamou a atenção do público do painel sobre Conjuntura Econômica no seminário de avaliação dos dez anos do Fórum Social Mundial para o "perverso" projeto do Brasil de investimentos no setor de energia e telefonia em seu país.

"Com o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), projetos de investimento nestes setores estão a serviço do mercado emergente, contra os interesses do povo boliviano." Ele criticou nominalmente a Petrobras; sinal de que, apesar de a estatal brasileira ter cedido na disputa com a Bolívia - que com uma política de nacionalização após a primeira vitória de Evo Morales exigiu maior retorno sobre a exploração de hidrocarbonetos - as restrições ao Brasil ainda não foram superadas.

(Por Fernanda Bastos, JC-RS, 27/01/2010)


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