O lema do Fórum Social Mundial passa pela mudança no atual modelo de produção global. "Um outro mundo possível" não será realidade sem que se altere o sistema econômico que impera na sociedade, pelo menos, desde o século XVIII.
Esta foi a tônica do evento A Conjuntura Ambiental Hoje, realizado ontem, na Usina do Gasômetro, na Capital. Com o objetivo de discutir a crise ambiental que assola o planeta, os debatedores voltaram suas críticas contra o capitalismo predatório, no qual só há espaço para o lucro e a competitividade - deixando de lado qualquer consciência com questões que envolvam o meio ambiente.
Para Gilmar Mauro, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), os fatores ambientais estão intimamente ligados à economia e à política. "Não é possível não associar uma coisa às outras. A lógica da lucratividade não é sustentável", explica.
A liderança do MST diz que esta ótica está tomando conta também da produção agrícola. "Vivemos uma era de agricultura mercantil, com o avanço das monoculturas produzidas à base de agroquímicos que contaminam o meio ambiente e, por consequência, a humanidade." Desta forma, "o caminho é mudar o foco da produção dentro de um debate que envolva toda a sociedade".
Mas Mauro não quer ficar apenas na discussão. "Não podemos permanecer parados e, por isso, é preciso que se promovam algumas iniciativas neste sentido", sugere.
A produção orgânica ou agroecológica é uma dessas alternativas. "O MST já conta com cursos de extensão rural em formação técnica, pois o atual modelo de ensino agrícola é voltado sempre para o uso de químicos. Além disso, os governos devem estimular e subsidiar essas iniciativas para que os produtos orgânicos tenham preços acessíveis à maioria da população", acrescenta.
Ainda na relação do cultivo de alimentos e o meio ambiente, o Movimento das Mulheres Camponesas (MMC) reclama da concentração dos meios de produção. "Nas mãos de poucos, isso acaba gerando a expulsão dos pequenos agricultores do campo", analisa a dirigente nacional Adriana Mezadri.
Segundo ela, só o fortalecimento da agricultura familiar pode garantir a sustentabilidade ambiental tão necessária. "Precisamos de mais apoio, pois somos nós que construímos uma produção agrícola em sintonia com o meio ambiente."
Garantia de direitos aos menos favorecidos também foi o ponto-chave da manifestação de Roberto Espinoza, da Coordenação Andina de Organizações Indígenas. O peruano atacou o sistema capitalista, que "não traz alternativa para superarmos a crise ambiental". Propôs a mudança do padrão energético, baseado no petróleo, por módulos de energia limpa e renovável.
Espinoza salienta que a conjunção de crises por que passa a humanidade (financeira, ambiental etc.) é resultado do modelo de civilização. Ele avalia que a formação dos Estados-nações, separados por fronteiras territoriais, contribui para a falta de mobilização social de maneira mais ampla.
Por causa disso, conclamou os povos latino-americanos a resistir "aos desmandos" das empresas transnacionais e pressionar os governos por medidas efetivas. "Não é mera coincidência que a maior biodiversidade do planeta esteja localizada aqui, associada à maior diversidade cultural. Os responsáveis pela defesa do meio ambiente somos nós mesmos", ressalta o líder indígena.
A falta de esperança nas ações governamentais demonstrada pelos participantes do debate pode ser resumida pelas dúvidas levantadas pelo colombiano Hildebrando Vélez Galeano. O dirigente da organização Amigos de la Tierra lembrou que há dez anos, na primeira edição do fórum, "a América Latina ainda não era governada por lideranças progressistas como é hoje". "O próprio presidente Lula, quando esteve aqui, há sete anos, prometeu não abandonar o caminho do socialismo. Nesse tempo todo, o que temos de avanços? Será que os governos têm as condições necessárias para mudar este ritmo de desenvolvimento que degrada o meio ambiente?", questionou.
(Por Maurício Macedo, JC-RS, 27/01/2010)