Fragmentos cerâmicos e gravuras rupestres foram achados em canteiro de obras em PE
Trabalho de terraplenagem teve de ser paralisado para que arqueólogos possam catalogar, recolher as peças, e analisar seu valor histórico
Um sítio arqueológico com fragmentos cerâmicos e gravuras rupestres foi encontrado em um canteiro de obras da transposição das águas do rio São Francisco, em Custódia (que fica a 350 km de Recife). Os vestígios, que podem ter 9.000 anos, foram achados em uma região de caatinga conhecida por Lage das Onças, no lote 10 da obra, a 40 km da cidade.
A descoberta surpreendeu especialistas também por sua conexão com outra região brasileira, esta na Paraíba, onde há pegadas de dinossauros. A área em Pernambuco abriga ainda ruínas de um engenho e até cartuchos de fuzil que podem ter ligação com o cangaço.
As gravuras, talhadas em pedra, não se assemelham à forma humana ou animal. Segundo os arqueólogos, os desenhos são de "grafismos puros", que nada representam da vida real.
Os fragmentos cerâmicos foram encontrados a aproximadamente cem metros de distância das gravuras, no exato local onde passará o canal do eixo leste da transposição.
A descoberta paralisou os trabalhos de terraplenagem numa área de aproximadamente 20 mil metros quadrados. Os tratores se afastaram e todo o trabalho precisou ser suspenso para que os arqueólogos pudessem resgatar as peças e iniciar o trabalho de avaliação do valor histórico do sítio e dos vestígios encontrados.
Segundo o Ministério da Integração Nacional, após o recolhimento dos fragmentos, a passagem das máquinas pelo local será retomada. Esse trabalho será monitorado pelos pesquisadores, para evitar que eventuais vestígios não recolhidos sejam destruídos -é um trabalho de monitoramento que pode levar vários meses.
O sítio de gravuras rupestres não será afetado pela obra, dizem os arqueólogos. As pedras -algumas com desenhos em forma de pequenos quadrados e com graduações cromáticas- estão localizadas fora do eixo, no curso de um riacho não perene, sobre o paredão de uma pequena queda d'água que se forma em tempos de chuva.
Recomendada no Rima (Relatório de Impacto Ambiental) e patrocinada pelo ministério, a prospecção arqueológica abrange os dois eixos da transposição, os canais leste e norte.
Na primeira fase da pesquisa, que está acontecendo paralelamente à obra, um grupo de arqueólogos ligados à Univasf (Universidade Federal do Vale do São Francisco) já notificou cerca de 80 possíveis achados históricos e pré-históricos.
Além dos fragmentos cerâmicos e das gravuras rupestres, eles encontraram objetos e estruturas que remontariam ao período de atividade dos cangaceiros, como as ruínas de um antigo engenho e cartuchos de fuzil datados de 1912 a 1915. As descobertas foram mapeadas, fotografadas, catalogadas e, quando possível, recolhidas, num processo conhecido como "salvamento".
Em fevereiro, uma nova equipe de especialistas, do Instituto Nacional de Arqueologia, Paleontologia e Ambiente do Semiárido do Nordeste, assumirá o trabalho de prospecção de toda a área do sítio arqueológico. Os vestígios já encontrados serão estudados. "É uma oportunidade única de pesquisarmos a mais importante rota do Brasil em paleontologia", disse a coordenadora do instituto, a arqueóloga francesa Anne-Marie Pessis.
Segundo ela, a região tem conexão -apresenta as mesma condição de clima e solo- com o chamado vale dos dinossauros, localizado em Sousa, município paraibano conhecido por suas inúmeras trilhas de pegadas fossilizadas de animais pré-históricos. O Ministério da Integração Nacional afirma que os sítios serão preservados.
(Por Fábio Guibu, Folha de S. Paulo, 24/01/2010)