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escassez de água política ambiental da colômbia cobrança pelo uso da água
2010-01-22 | Julianaf

As altas temperaturas, provocadas na Colômbia pelo fenômeno El Nino, geraram drásticas redução no nível de rios e represas, e as previsões indicam que as chuvas chegarão somente em setembro, enquanto autoridades e ambientalistas discordam sobre como enfrentar a crise. A seca, antecipada desde meados de 2009, levou a Comissão de Regulação de Água Potável e Saneamento Básico (CRA) a anunciar, na última semana de dezembro, aumento na tarifa dos usuários que superarem novos limites de consumo, segundo a classe socioeconômica e a temperatura média de povoados e cidades.

Trata-se de um aumento adicional ao aprovado a cada novo ano, com base no Índice de Preços ao Consumidor, que para 2010 foi estabelecido em 2%. “Em Bogotá será cobrado 1,6% a mais, pela entrada em serviço da unidade de El Salitre”, confirmou à IPS Humberto Polo, sindicalista do setor e membro do comitê do Referendo pela Água, Direito Humano Fundamental. Isso supõe que o ajuste do serviço na capital será de 3,6%, a ser aplicado de acordo com o regime tarifário atual, que classifica o consumo em três categorias: básico, até 20 metros cúbicos, complementar, até 20 m³, e luxuoso, de 41 m³ em diante.

Além disso, há diferença de custo segundo os seis estratos socioeconômicos utilizados na Colômbia, que situa os mais pobres no um e os mais ricos no seis, e onde os índices de população se situam nos mais baixos. Em Bogotá, 73% da população está nos três primeiros estratos, segundo o Banco Mundial. Esta classificação incide, por exemplo, na quantia a pagar em impostos, serviços públicos domiciliares, acesso à saúde e matrículas em universidades públicas.

Porém, “a proposta elimina o regime complementar e reduz o teto para atingir o consumo luxuoso”, disse à IPS Rafael Colmenares, da não governamental Corporação Ecofondo, que reúne 119 grupos ambientalistas do país. “O consumo luxuoso começaria a ser pago a partir dos 28 m³ em terra fria, 34 m³ em terra temperada e 35 m³ em terra quente”, acrescentou Colmenares.

A medida foi anunciada como temporária pela CRA, vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, Habitação e Desenvolvimento Territorial, e seguida, no dia 4 deste mês, por uma resolução que deu lugar à figura legal da Audiência Pública, na qual, por dez dias úteis, os cidadãos e as organizações podem apresentar suas observações. “No dia 15, contavam-se cerca de 300 manifestações, tanto de cidadãos comuns quanto de especialistas no assunto”, disse à IPS o porta-voz da CRA, Boris del Campo.

“Os especialistas analisarão as propostas apresentadas antes de tomar decisões definitivas”, acrescentou Del Campo, enfatizando a condição temporária que teria a medida até a próxima época de chuvas, que devolveria a rios e represas seus níveis normais. Del Campo não disse quando terminará o processo de consultas e entrará em vigor a medida de maneira definitiva. Mas destacou que o anúncio das novas tarifas já teve como impacto a queda no consumo.

As organizações ambientalistas aplaudem a redução no consumo por ser importante preservar a água, mas, essa mesma razão as leva a qualificar o anúncio de “precipitado”. Trata-se de “uma medida mercantilista que beneficiará empresários e terceirizados que operam e administram a maioria das empresas de água e esgoto do país”, assegurou Colmenares. “Das companhias com mais de 2.500 clientes, 12% estão privatizadas”, complementou Polo. Das 349 empresas do setor que funcionam na Colômbia, 141 são privadas e 24 de economia mista.

Neste país vivem 42 milhões de pessoas, das quais cerca de 12 milhões não contam com água potável e quatro milhões têm dificuldades para obtê-la em boas condições. Assim, “a medida do CRA favorece os setores agroindustriais, que são os maiores consumidores de água doce, em porcentagens próximas de 60%, além de serem responsáveis pela contaminação da água e destruição de importantes ecossistemas, pelo corte de árvores e secagem de pântanos”, acrescentou Colmenares. “Não está estabelecido o destino do dinheiro, e são punidos os usuários mais pobres, que vivem em casas subdivididas em pequenos espaços alugados de famílias, e as famílias com mais de quatro membros”, prosseguiu.

Segundo Del Campo, todas as observações serão analisadas. Entre elas estaria a situação gerada pelas empresas de floricultura, que proliferam em municípios vizinhos de Bogotá, com cultivos que exigem exagerada quantidade de água, incluída a extração subterrânea, para depois acabar contaminada pelo uso de fungicidas. Del Campo também detalhou que, entre as propostas, também há dúvidas de pessoas comuns, que perguntam, por exemplo, como será cobrado o serviço de um prédio de quatro andares e com um único registro. “Nesses casos será preciso solicitar uma micromedição e a instalação de novos registros”, acrescentou, admitindo que é um processo demorado.

O Comitê Nacional de Defesa da Água e da Vida “promove o uso racional da água, e uma verdadeira política ambiental para a recuperação, manutenção e proteção dos ecossistemas essenciais ao ciclo da água”, segundo comunicado da organização ambientalista, onde destaca a oposição a uma medida que chama de “oportunista”. Os ecologistas lembram, ainda, que está em curso um referendo pela água, promovido por mais de dois milhões de colombianos, como direito humano fundamental e bem público.

A consulta pretende “garantir o acesso à água de todos os seres vivos, evitando a aplicação de medidas que atentem contra o bem-estar dos mais pobres e desviem a atenção da necessidade de medidas urgentes para proteger os ecossistemas essenciais ao ciclo hidrológico”, segundo a Corporação Ecofondo. A Colômbia é o segundo país da América Latina com maior disponibilidade de água, atrás do Brasil e à frente do Peru, em uma região que tem 40% desses recursos, com 10% da população mundial, segundo a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO).

O texto de convocação do referendo sobre a água chegou ao Congresso em 2009, e a primeira comissão da Câmara de Representantes que o discutiu aprovou a iniciativa com mudanças fundamentais em seu texto original. A mobilização de camponeses, indígenas e dos habitantes que sofrem falta de água forçou a comissão legislativa seguinte que abordou o tema a retomar o texto original, com modificação de dois pontos.

“Trata-se do que fala em evitar a privatização do manejo da água, “o mais difícil de o governo aceitar”, e o que estabelece que a água é “condição humana fundamental”, em lugar de “direito humano fundamental”, contou Colmenares. “Nosso argumento é que a Constituição não fala em condições, mas em direitos”, para promover a manutenção da água como direito, acrescentou o ativista. O Congresso retomará em março a discussão da proposta, com três novos debates.

Colmenares acredita que as organizações ambientalistas conseguirão, com argumentos, números e perseverança, que o texto original seja aprovado. Também espera que a CRA desista da medida de promover o controle por meio de uma sobretaxa no preço do serviço.

(Por Helda Martinez, IPS / Envolverde, 22/01/2010)


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