Já muito se disse sobre a imensa tragédia humanitária que se abateu sobre o já frágil e debilitado Haiti, lamentavelmente o país mais pobre das Américas, mas, ainda assim, há muito que aprender com o desastre em si mesmo e com todos os problemas, erros e falhas no processo de reação ao terremoto.
Antes de entrar no assunto, propriamente dito, é necessário destacar, com toda a justiça e respeito, o sacrifício da própria vida de muitos que lá estavam em missão de paz. É o caso da Dra. Zilda Arns e de 15 militares brasileiros participantes da Missão das Nações Unidas para Estabilização do Haiti (Minustah). Além deles, também perderam a vida 300 funcionários da ONU, incluindo o tunisiano Hédi Annabi e o brasileiro Luiz Carlos da Costa , respectivamente o n° 1 e o n° 2 da missão da ONU, além de outros 19 militares das forças internacionais participantes da Minustah.
Lá estavam em missão de paz e é isto que deve, antes de tudo, ser destacado e valorizado. Doaram suas vidas na tentativa de ajudar, de apoiar e resgatar a dignidade e a qualidade de vida do povo mais sofrido das Américas. São verdadeiros heróis, no seu melhor e mais humano sentido.
A eles o nosso respeito e reconhecimento.
Voltando ao que pretendemos discutir, o caos causado pelo terremoto pode e deve ser compreendido e estudado como parâmetro do que pode e, certamente, ainda acontecerá ao longo deste século em outros países pobres e igualmente expostos a severos desastres nacionais.
O problema inicial surgiu com a equipe técnica da ONU sendo dizimada e o mesmo acontecendo com boa parte do já frágil governo do Haiti. Sem liderança e capacidade de organização, os sobreviventes passaram as primeiras 48 horas sem qualquer perspectiva de ajuda.
A Minustah foi menos atingida e reagiu na medida de suas possibilidades, principalmente no resgate das vítimas, soterradas aos milhares.
Três dias após o terremoto a ajuda humanitária era incipiente e desorganizada, com os sobreviventes ainda sem água e comida. Imaginem o que isto significa em uma cidade com 70% de suas construções literalmente demolidas, com 40 ou 50 mil mortos (possivelmente mais), mais de 250 mil feridos e, pelo menos, 1,5 milhão de desabrigados.
O absoluto colapso da já debilitada infraestrutura do Haiti colaborou para o caos e dificultou a resposta humanitária e este é um fator a ser considerado em outros desastres naturais que, no futuro, atingirão outros países pobres.
O tsunami, no oceano índico em 2004, também gerou caos e foi uma outra tragédia humanitária, com mais de 200 mil mortos, 120 mil feridos e 1,5 milhão de desabrigados. Lá também estavam presentes a destruição da infraestrura, a fragilidade das construções e a paralisia governamental nos primeiros e mais difíceis momentos após o desastre.
Em 2008, a China foi atingida pelo ‘terremoto de Sichuan’, um violento sismo que abalou a zona de Wenchuan, na província de Sichuan, às 14:28:04, hora local, (06:28:04 GMT) em 12 de Maio de 2008. De magnitude 8,0 na Escala de Richter, de acordo com o Centro de Pesquisas Sismológicas da China e o United States Geological Survey, o terremoto foi sentido em localidades tão longínquas quanto Beijing e Xangai (onde edifícios de escritórios balançaram com o impacto), Paquistão, Tailândia e na capital do Vietnã, Hanói. A maior cidade próxima ao epicentro do terremoto foi Chengdu, capital da província de Sichuan.
Estima-se o número de mortos em mais de 85 mil pessoas, com 358 mil feridos. Na área de Mianzhu, perto do epicentro do sismo, e da cidade de Mianyang, houve um grande número de vítimas, assim como perto do condado de Beichuan Qiang, onde 80% das construções foram destruídas. [fonte Wikipedia]
No entanto, apesar da gravidade do sismo, a capacidade de reação do governo chinês não foi afetada e milhares de militares foram deslocados para a área, com toda a logística e ajuda necessária já nas primeiras horas após o terremoto. O terremoto foi um grande desastre, mas a tragédia humanitária foi evitada.
De algum modo, precisamos desenvolver uma capacidade global de reação, suficientemente capaz de superar as dificuldades da destruição da infraestrutura e até mesmo a fragilidade ou incapacidade temporária de governos nacionais.
Terremotos, tsunamis, vulcões não são causados pela ação humana, mas furacões, tornados, ciclones e inundações são, reconhecidamente, agravados pelo aquecimento global, este sim com significativa influência antropogênica.
Segundo a ONU, em 2008, aumentaram os desastres naturais relacionados às mudanças climáticas, e isto deve crescer ao longo do século, na exata medida em que se agravarem os efeitos das mudanças climáticas.
A ONU já havia relatado que os países em desenvolvimento são as principais vítimas dos desastres naturais decorrentes do aquecimento climático. Entre 1975 e 2008, ela listou 8.866 desastres que mataram 2.284.000 pessoas. A respeito das inundações, o risco de morte aumentou 13% entre 1990 e 2007.
Agora é hora de agir, de fazer o melhor para oferecer à sofrida população do Haiti a ajuda humanitária necessária e depois ajudar no que for possível pela reconstrução do país. Mas também precisamos aprender e nos preparar para outros desastres que se seguirão ao longo deste ameaçador século XXI.
(Por Henrique Cortez, EcoDebate, 18/01/2010)