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direitos indígenas política indigenista
2010-01-18 | Tatianaf

“Nunca fomos pobres, os colonizadores nos levaram a esta situação”, afirmou o líder indígena Marcos Terena no dia 14 deste mês, no Rio de Janeiro, por ocasião de uma das apresentações do informe da Organização das Nações Unidas sobre o estado da população indígena mundial. Apesar de somarem 370 milhões de pessoas, apenas 5% da população mundial, os aborígines constituem cerca de um terço dos 900 milhões de indigentes que habitam as zonas rurais.

No Brasil, o censo de 2000 indica que 38% dos indígenas viviam na extrema pobreza, mais que o dobro do índice geral, que era de 15,5%, disse Giancarlo Summa, diretor do Centro de Informação das Nações Unidas (Unic) no Rio de Janeiro. “Nada indica melhorias significativas na década”, acrescentou. Sobrevivem no país 230 “sociedades indígenas”, que falam 180 línguas e ocupam 14% do território nacional, cumprindo o papel de conservar a natureza, mas com fortes limitações políticas, disse Terena, diretor do Memorial dos Povos Indígenas de Brasília.

“Não participamos das decisões sobre as Terras Indígenas”, que são identificadas e demarcadas pelo governo, com estudos de antropólogos. A autonomia é um sonho ainda distante, disse. Em outros países a luta pela autodeterminação avançou mais, acrescentou. “Não conseguimos que um indígena seja presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), ao contrário dos negros que presidem as instituições que tratam de sua promoção”, acrescentou.

Terena, piloto de avião da própria Funai, tem como sobrenome o nome de sua etnia, distribuída por várias aldeias no centro-oeste do país. Destaca-se desde a década de 70, como um líder da União das Nações Indígenas e depois de outras entidades e fóruns de luta pelos direitos dos povos originários. Por essa notável trajetória de ativista social em favor de seu povo, foi convidado a apresentar na sede do Unic no Rio de Janeiro, junto com Summa, o estudo “A situação dos povos indígenas do mundo”, elaborado a pedido das Nações Unidas.

No Brasil, os indígenas somavam 734.127 em 2000, segundo o censo oficial. Mas Terena estima que hoje existam cerca de um milhão que se autodefinem como aborígines, o que representa 5% da população nacional. É uma minoria em rápido crescimento desde os anos 80, quando teve início um movimento de afirmação étnica e muitos, inclusive nas cidades, passaram a assumir sua condição de indígena.

Entre os censos de 1991 e 2000, o total dos que se declararam indígenas duplicou, indicando aumento anual de 10,8%, certamente somando natalidade e pessoas que assumiram sua condição étnica antes negada. A maioria dessa população vive na Amazônia, cuja natureza inexpugnável salvou seus indígenas do genocídio que sofreram os povos do litoral do sudeste brasileiro e de outros países, como os Estados Unidos. Ainda há tribos amazônicas isoladas, sem nenhum contato com a civilização branca.

Um quadro semelhante ao mundial e de vários outros países vivem os índios brasileiros, nas áreas de saúde, educação e direitos humanos, além da marginalização econômica e social. A situação mais grave ocorre no Mato Grosso do Sul, que tem fronteiras com Bolívia e Paraguai, onde especialmente o povo guarani kaiwoá enfrenta um permanente conflito com fazendeiros pela posse da terra, sofre assassinatos de seus líderes e jovens, numerosos suicídios de seus adolescentes, alcoolismo e fome.

Espremidos em terras insuficientes para seu modo de vida, ao lado de cidades prósperas devido à monocultura da soja e da cana-de-açúcar, os índios reclamam a demarcação ou ampliação de seus territórios, diante do aumento de suas populações. As perspectivas não são promissoras. Existe forte resistência dos grandes latifundiários protegidos por títulos de propriedade legais, e algumas terras indígenas já demarcadas e homologadas pelo governo nacional tiveram seu processo de suspensão de entrega por decisão judicial. Os militares são contrários às reservas indígenas nas fronteiras, alegando ameaça à soberania nacional.

Nos últimos anos, a saúde se tornou uma questão dramática, com epidemias de hepatite, malária e outras doenças em algumas regiões. Vários organismos governamentais se sucederam na prestação de ajuda médica aos índios, sem superar a precariedade. O Brasil tem uma boa legislação sobre direitos indígenas, mas mostra problemas para aplicá-la, lamentou Terena. Políticas “paternalistas”, que não reconhecem a autodeterminação indígena, também travam soluções, acrescentou.

Enquanto organismos multilaterais, como o Banco Mundial, condicionam financiamentos ao respeito dos direitos dos índios, “com departamentos que nos ouvem”, no Brasil os índios continuam sem ter influência nas políticas que os afetam diretamente. Não contam com um único representante na Câmara Federal nem no Senado.

(Por Mario Osava *, da IPS, Envolverde, 18/1/2010)


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