País não analisa adequadamente nível do mar, ondas e faixa de areia no litoral
O Brasil ainda engatinha na criação de uma base de dados que permita antecipar os efeitos do clima no litoral, o que se tornará mais crítico se confirmado o aumento do nível do mar em razão do efeito estufa.
"Há carência generalizada de parâmetros ambientais", diz Roberto Teixeira da Luz, da Coordenação de Geodésia do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) e que gerencia a rede maregráfica do instituto, necessária para medir as altitudes em relação ao nível do mar.
Segundo o engenheiro Paulo Rosman, da Coppe-UFRJ, o monitoramento de longo prazo da costa exigiria a coleta sistemática de pelo menos três dados: nível relativo do mar (em relação às oscilações do terreno) nas principais cidades litorâneas, clima de ondas (altura, período e direção) e perfil de praia (alterações cíclicas da faixa de areia por ação das ondas).
Hoje, o país tem uma rede de só oito marégrafos -um a cada mais de mil quilômetros- com os requisitos necessários para detectar tendências longas. Gerenciada por Rosuíta Helena Roso, da Diretoria de Hidrografia e Navegação da Marinha, a rede foi criada após a adesão, nos anos 90, ao projeto internacional Gloss (Sistema de Observação Global do Nível do Mar).
Estão integrados ao projeto cinco marégrafos do IBGE, dois da Vale, um da USP e um da Marinha. Os dois últimos, em Cananeia (SP) e na Ilha Fiscal (RJ), são os únicos com série maior que 40 anos -são necessários 20 anos para determinar o ciclo natural das marés e 50 para tendências de longo prazo.
No clima de ondas, há medições da Marinha e da Petrobras, mas sem sistematização ou abrangência nacional. Prefeituras fizeram perfis de praia, mas de forma esporádica. Luz, do IBGE, lembra que há uma falha na cartografia nacional, já que os mapas náuticos são feitos pela Marinha a partir do nível mínimo do mar, e os do continente, a partir do nível médio. "As cartas não batem."
"Não faltam pesquisadores nem tecnologia. Falta um maestro que organize essas variáveis", afirma Rosman. Ele e o geógrafo Dieter Muehe avaliam que os municípios, em especial os menores, são o elo fraco no planejamento costeiro, por carência técnica e maior suscetibilidade a endossar ou relevar ações irregulares.
O Ministério do Meio Ambiente, que criou o Projeto Orla para subsidiar a gestão da costa, ressalta que as cidades dependem dos Estados, aos quais cabe o zoneamento ecológico e econômico dessa região. (CA)
(Folha de S. Paulo, 10/01/2010)