A Jurong entregou o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima) ao Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema). Segundo o relatório, que está disponível no site do órgão, o empreendimento causará alterações no lençol freático, na qualidade das águas superficiais, nas características físicas e químicas do solo e ainda aumentará a pressão sobre a fauna e a flora locais.
O empreendimento foi apontado por entidades ambientais envolvidas com o acompanhamento Eia do empreendimento como sem validade alguma para a região. Ao todo, 18 entidades assinaram o documento, que foi entregue ao Iema, ao Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) e à CTA Serviços em Meio Ambiente e Engenharia, responsável pelo EIA do projeto.
O estudo da CTA sobre o estaleiro aponta impactos como alterações na corrente marítima, pressão sobre a biota, atropelamento e aprisionamento de fauna, desencadeamento de processos erosivos e interferência nas atividades pesqueiras da região, entre outros. Entretanto, os impactos são apresentados de forma superficial, com ênfase apenas nas ações “mitigatórias”. As comunidades já se disseram cansadas dos programas propostos pelos empreendimentos. Denunciam que muitos não saem do papel e, quando saem, não são capazes de superar o impacto que geraram.
Entre as propostas para mitigar o impacto sobre a comunidade pesqueira, por exemplo, foi proposto um programa de comunicação social e de compensação aos trabalhadores da atividade, mas sem explicar como isso será compensado.
Como se vê, o estaleiro está repetindo os passos dos grandes empreendimentos instalados no Estado e, assim como a Portocel, responsável por degradar a região e prejudicar os pescadores, irá se instalar na região mesmo com a rejeição das entidades ambientalistas do Estado e da comunidade local.
O documento encaminhado ao Iema por entidades ambientais afirma que haverá impactos irreversíveis sobre a pesca, o turismo e as comunidades da orla. Alertam para a sensibilidade ambiental da região costeira, considerando sua biodiversidade, endemismo de espécies e características físicas raras, que constituem um ecossistema especial, conforme já constatado por pesquisadores. O próprio estudo da CTA confirma as previsões ao afirmar, por exemplo, que haverá risco de aprisionamento, atropelamento e pressão sobre a fauna e a flora da região.
O estaleiro da Jurong irá ocasionar também o início de processo de erosão dos manguezais da região, praias e restingas; irá fragilizar a estrutura de fixação da vegetação de mangue; comprometer as condições de alimentação, abrigo e crescimento de espécies marinhas - muitas delas de grande importância para as atividades pesqueiras, e reduzir o aporte de alimentos na área de alimentação de tartarugas marinhas.
Da mesma maneira, as entidades prevêem alteração no local de trabalho e sobrevivência das populações tradicionais, inviabilizando a maior parte da atividade pesqueira artesanal e de pequena escala praticada pelas comunidades locais, com sérios impactos sociais.
Tudo isso, alerta o documento , representa um grave risco à sobrevivência das comunidades que vivem na área de influência do empreendimento. Afinal, o empreendimento será implantado em litoral rochoso constituído por concreções limoníticas (formações de arenitos), manguezais marítimos (manguinhos) e estuários com grandes extensões de manguezais preservados. É ainda local de reprodução de espécies raras e endêmicas, área de distribuição e reprodução de espécies ameaçadas (cetáceos e quelônios) e situs geográfico de transição zoológica, botânica e geográfica de tropical para subtropical.
Na região é registrada a ocorrência de correntes ciclônica de ressurgência, que, associada à elevada biomassa de organismos plantônicos, cria condições especiais para reprodução da fauna, o que recebe o nome de Giro de Vitória. Além disso, a área abriga bancos de algas calcárias e laminaria especiais, com flora considerada um ponto de alta diversidade, quando comparada com outros locais do litoral brasileiro, como Abrolhos.
As entidades destacam que, de todos estes situs no País, o mais importante é o do Espírito Santo, localizado na ampla região de Guarapari até São Mateus, sendo o de Aracruz o mais representativo. E apontam: “Esses são os organismos que mais concentram o carbonato calcário em seu corpo dentre todos do planeta, formando verdadeiros arrecifes naturais, tendo, como principal função, a fixação do CO2”.
Para os ambientalistas, o que se vê na região é “um andar apressado contra tudo que se vem discutindo no planeta e mais uma iniciativa ignorante do governo do Estado em detrimento da importância ambiental da região não só para o Estado, mas para todo o planeta”.
Tamanha relevância ambiental da região fez, inclusive, com que se iniciasse um debate sobre a necessidade de ser criada na região uma Área de Proteção Ambiental (APA) das Algas e o Refúgio de Vida Silvestre (Rebio) de Santa Cruz. Elaborados pelo Ibama, os projetos foram criados a partir da solicitação de dezenas de entidades capixabas preocupadas com a conservação da área. Mas os processos estão parados em Brasília, devido a pressões políticas e empresariais.
Assinam o documento a Associação das Empresa de Turismo de Aracruz (Aeta), Associação Capixaba de Proteção ao Meio Ambiente (Acapema), Associação dos Moradores da Praia dos Padres (AMPP), Associação dos Moradores do Bairro Andorinhas - Mar Azul, Associação de Moradores de Itaparica, Colônia de Pesca Z-7, Centro Comunitário de Barra do Sahy, Associação dos Amigos do Rio Piraqueaçu (Amip) e Associação de Pescadores de Barra do Riacho.
E ainda: Associação Indígena Tupi- Guarani (AITG), Organização Consciência Ambiental (Orca), Fórum das ONGs Ambientalistas do Espírito Santo (Asambiental), Círculo dos Amigos de Santa Cruz (Ciclasc), Grupo de Apoio ao Meio Ambiente (Gama), Fórum de Entidades Civis Organizadas do Litoral Sul do ES, Programa de Apoio e Interação Ambiental (Prograia), Associação de Moradores do Bairro Padre Bauer e Associação de Moradores da Balsa.
Licença Prévia
A Jurong do Brasil requereu ao Iema a Licença Prévia para montagem, reparação e manutenção de embarcações e estrutura flutuantes em Barra do Sahy, em Aracruz.
O empreendimento está previsto para ser implantado em uma área de aproximadamente 852.000 m², pertencente, anteriormente, à Aracruz (atual Fibria), 1,1 Km ao sul do porto abrigado de Barra do Riacho, no município de Aracruz, no estado do Espírito Santo. A área é limitada a leste pelo Oceano Atlântico e, a oeste, pela rodovia ES-010. O empreendimento será construído nas proximidades de Barra do Sahy.
Segundo o empreendimento, a escolha do local foi feita pela ausência da população, baixo nível de uso da praia, região de águas calmas, baixa velocidade da corrente (os mesmos atributos que caracterizam a região como uma área turística), mas, no caso da Jurong, com o apoio das autoridades municipais para a instalação do estaleiro, conforme descrito no Rima.
Na região, já funcionam o Portocel e a Fibria, e um porto da Petrobras vem sendo construído. Já a Jurong voltará seu empreendimento ao reparo naval, mais especificamente de sondas de perfuração e navios plataforma (FPSO).
(Por Flavia Bernardes, Século Diário, 08/01/2010)