Novas revelações estão desacreditando dois documentos que vazaram para o jornal The Times, de Londres, para tentar demonstrar que o Irã avança em seu programa de desenvolvimento nuclear. Um colunista do jornal reconheceu que o primeiro documento publicado no mês passado, de duas paginas e em persa, não era uma fotocópia do original, mas uma versão manipulada. Por outro lado, a tradução de um segundo documento em persa também publicado pelo The Times contradiz a afirmação do jornal de que o primeiro foi redigido por uma organização dirigida por um cientista militar iraniano.
Philip Giraldi, ex-funcionário da Agência Central de Inteligência (CIA) dos Estados Unidos, disse a juizes de inteligência que o primeiro documento era uma falsificação – como a IPS informou na semana passada. A notícia da IPS também dizia que o texto carecia das correspondentes marcas de segurança e das identificações da organização que o emitiu e da que o recebeu. As novas revelações levam analistas de inteligência a se mostrarem cada vez mais receosos quanto ao documento.
No dia 14 de dezembro, The Times publicou o que explicitamente era apresentado como a fotocópia de um completo documento em persa, supostamente demonstrando os planos iranianos de testar um iniciador de nêutrons, uma espécie de gatilho para uma arma nuclear. Isto estava acompanhado de sua tradução para o inglês. Mas, em resposta a um leitor que notou a ausência de informação-chave do documento, incluindo as marcas de segurança, Oliver Kamm, um colunista do jornal, admitiu no último dia 3 que o documento publicado era “uma versão reescrita de partes relevantes do original”.
Kamm escreveu que o documento original “continha muita informação classificada” e não foi publicado “devido ao perigo de que poderia alertar as autoridades iranianas sobre a fonte do vazamento”. Ao dar esta explicação, Kamm prejudicou a credibilidade do documento. The Times havia dito em um artigo em separado que o documento sobre o “gatilho nuclear” foi escrito dentro de uma organização militar para o desenvolvimento de tecnologia dirigida pelo cientista iraniano, Mohsen Fakhrizadeh.
O segundo documento, também publicado em persa pelo The Times, mostra a assinatura de Fakhrizadeh sob o título “Chefe, Departamento de Desenvolvimento de Tecnologia Avançada”, e inclui uma lista de 12 “destinatários” dentro dessa organização. O texto está datado pelo dia do calendário persa equivalente a 29 de dezembro de 2005 do calendário ocidental, segundo uma tradução para o inglês obtida pela IPS.
Catherine Philp, jornalista do The Times, escreveu que o primeiro documento foi “elaborado dentro do Centro para a Preparação no Instituto de Física Aplicada”, que ela identificou como “um dos 12 departamentos da organização”. Mas a referência ao “Centro para a Preparação no Instituto de Física Aplicada” é um obvio erro de leitura de um gráfico que vazou para o The Times, mas que o jornal não publicou. O gráfico, que pode ser encontrado no site do Instituto para a Ciência e a Segurança Internacionais, mostra claramente que se trata de duas organizações separadas relacionadas: um “Centro para a Preparação” e um “Centro de Física Aplicada”.
Oeri Geirge Maschke, especialista em persa e ex-funcionário de inteligência militar norte-americano, forneceu à IPS uma tradução da lista de 12 destinatários na primeira pagina do documento mostrando que inclui um “Centro para a Preparação e Nova Tecnologia de Defesa”, mas não um “Instituto de Física aplicada”. Os informes da Agência Internacional de Energia Atômica se referem ao Instituto de Física Aplicada como uma única instituição, e não como parte da organização de Fakhrizadeh.
A tradução para o inglês do documento mostra que nenhum dos outros cinco centros e grupos na lista de destinatários é um plausível candidato para dirigir um experimento de nêutrons. Entre os destinatários estão os diretores do Centro para Explosivos e Tecnologia de Impacto, o Centro para a Manufatura e a Pesquisa Industrial, os Grupos Químicos e Metalúrgicos do Centro para a Tecnologia e a Pesquisa de Materiais Avançados, e o Centro para a Nova Pesquisa e Projeto Aeroespacial. A falta de uma organização com experiência em energia atômica indica que o Departamento de Desenvolvimento de Tecnologia Avançada, de Fakhrizadeh, não faz parte de um programa clandestino de armas nucleares.
(Por Gareth Porter*, IPS, Envolverde, 07/01/2010)
*Gareth Porter é historiador e jornalista especializado em política de segurança nacional norte-americana.