Ao final do ano em que viveu uma de suas maiores alegrias – a escolha da cidade do Rio como sede olímpica –, o Estado do Rio enfrenta uma das maiores tragédias recentes. Três dias de chuva transformaram a região paradisíaca de Angra dos Reis em um cenário barrento de mortes e destruição.
A alegria pela chegada de 2010 foi varrida logo depois do Réveillon por ondas de barro, pedras e árvores que despencaram de morros do Rio de Janeiro e de outros estados do Sudeste devido à chuva.
Em Angra dos Reis, paraíso natural transformado em epicentro da tragédia, um único deslizamento soterrou casas e uma pousada de onde haviam sido retirados 19 corpos até a noite de ontem. Em todo o território fluminense, três dias de mau tempo deixaram pelo menos 48 mortos.
Na região de Angra, a chuva começou por volta das 15h de quarta-feira e cessou apenas às 7h de ontem – somando 40 horas de aguaceiro ininterrupto. O pior período da chuvarada ocorreu durante a madrugada do Ano-Novo. A água se infiltrou lentamente no solo argiloso de uma encosta localizada na Praia do Bananal, em Ilha Grande, até desestabilizar o terreno nas primeiras horas de 2010.
Às 3h30min, toneladas de terra começaram a escorregar do alto do morro e vieram abaixo empurrando árvores e pedras. Na base da encosta, junto ao mar, se localiza uma pousada. Com acesso exclusivo por barco e diárias de R$ 160 a R$ 450, estima-se que a Sankay abrigava mais de 40 hóspedes no momento do acidente. A maior parte dos visitantes dormia.
Entre eles, se encontrava a filha do casal de proprietários, Geraldo Faraci e Sonia Imanishi. Criada na ilha, Yumi, 18 anos, havia deixado a casa da família e se mudado no ano passado para Belo Horizonte a fim de estudar arquitetura. Voltou à pousada para as festas de fim de ano. Apaixonada pela natureza, fã de música que costumava postar vídeos no YouTube intrepretando sucessos de cantoras como Alanis Morrisette, Yumi morreu soterrada.
– Os pais dela ficaram desesperados na hora do deslizamento, porque a menina foi logo dada como desaparecida. Não é para menos, era muito simpática, amorosa – contou, à Agência Estado, um barqueiro que costumava atender os hóspedes no local.
Entre as vítimas que até ontem não haviam sido identificadas havia ainda uma criança de quatro anos e uma adolescente de 13. Embora um número incerto de hóspedes tenha sido socorrido com vida, não se descartava que novos corpos viessem a ser desenterrados. Mais de 80 bombeiros e 20 policiais usavam pás e picaretas para escavar a terra e tentar localizar novas vítimas ou sobreviventes.
Diante da Sankay (que significa entre a montanha e o mar, em japonês) e de suas 12 suítes em estilo rústico transformadas em ruínas, o mar tipicamente cristalino de Angra apresentava uma cor barrenta tristemente destoante do ar paradisíaco da região. Além dos mortos localizados junto à pousada, outras 10 pessoas morreram em um deslizamento ocorrido no Morro da Carioca, na região central de Angra – elevando o número de mortos na cidade para 30. E encerrando com tom de tragédia um ano em que o Rio brilhou ao ser escolhida como sede das olimpíadas de 2016.
(Zero Hora, 02/01/2010)