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indígenas latino-americanos política ambiental nicarágua direitos indígenas
2009-12-28

Miskitos, que vivem de pesca de lagosta na região mais pobre e isolada do país centro-americano, querem ter próprio país. Maior motivação na luta pela autonomia é a crença de que recursos vão todos para Manágua, enquanto a região vive na miséria

O gabinete presidencial está numa rua sem pavimento, tem apenas uma mesa, duas cadeiras e pequenas toalhas penduradas sobre o orifício da parede para tapar o sol. É dali que despacha Hector Williams, 57, nomeado em 19 de abril o líder da Comunidade Nação da Miskitia, país imaginário criado naquele dia na região mais pobre e isolada da Nicarágua. "Bem-vindo à nossa nação", diz Williams, o wihta tara, (grande juiz, em miskito), ao receber a reportagem na porta.

Está de bermuda, sandália e camisa aberta até o peito. Traje adequado para esta tórrida cidade de 60 mil habitantes do Caribe, cujo nome já expõe a divisão: enquanto a maioria miskito a chama Bilwi, para os "espanhóis" ou "gente do Pacífico", os nicaraguenses de fora da região, é Puerto Cabezas.

O movimento independentista tem profundas raízes históricas. A anexação à Nicarágua ocorreu apenas em 1894, por meio de uma campanha militar. Antes, durante boa parte dos séculos 18 e 19, os miskitos escolhiam seus reis e viviam sob uma espécie protetorado inglês, ligação evidenciada pelos sobrenomes e pelas várias palavras da língua de Shakespeare adaptadas ao idioma local -o espanhol continua sendo a segunda língua, ensinada nas escolas.

Houve poucos avanços nesses 115 anos. Apesar de ter ganhado um regime autônomo em 1987, passando a escolher seus próprios governadores, a Miskitia tem os piores índices socioeconômicos da Nicarágua -que por sua vez é o país mais pobre da América Central. Só o desemprego ronda entre os 80% e 90%, segundo números oficiais.

Além da barreira cultural, a Miskitia, coberta principalmente por pântanos e florestas, vive fisicamente isolada do resto do país: sem nenhuma estrada pavimentada, a viagem de Bilwi a Manágua leva em média 30 horas em ônibus, apesar da distância de apenas 550 km.

Pelo ar, são apenas três voos diários de 1h30, em avionetas com 12 lugares. Bilwi impressiona pela pobreza: quase todas as casas são de madeira, construídas sobre palafitas para separá-las da água imunda que acumula no chão. A maioria das ruas é de terra, e a praia está coberta de lixo e imensas poças de água parada de esgoto.

Lagosta

Ao histórico isolamento se somou a decadência da principal atividade da região, a pesca de lagosta. Num caso raro de rompimento da lei da oferta e da demanda, o preço do crustáceo nos EUA, principal comprador, despencou no momento em que o crustáceo se aproxima da extinção. No centro do discurso independentista está a percepção de que a maior parte do dinheiro ganho com a exploração dos cada vez mais escassos recursos naturais, principalmente a lagosta e a madeira, acaba na mão de empresários de fora e do governo central.

"Todos os impostos que saem daqui vão para a Nicarágua, para o Pacífico. A grande pergunta é: quanto fica aqui? Muito pouco, apenas o suficiente para pagar os funcionários que ficam aqui na região", acusa Williams.

O movimento independentista é tão pobre quanto a região. Em cima da mesa de Williams, um pastor evangélico que já trabalhou de operário em Miami, o "aparelho estatal" se resume a um cofrinho de plástico para receber doações, onde se lê "um córdoba (R$ 0,08) pela independência" e papéis timbrados com o escudo do país virtual.

Williams, escolhido por um Conselho de Anciãos que representa cerca de 300 comunidades de miskitos, diz que o orçamento vem de doações individuais. Os gastos mensais são de cerca de R$ 1.700 e incluem o pagamento de dois programas diários de rádio em favor da independência.

"Há pouco apoio real ao movimento, mas muita simpatia", afirma o pesquisador independente miskito Juan Carlos Ocampo, 26, que tem escrito sobre o movimento. Segundo ele, o principal problema é a falta de dinheiro. "Eles não têm recursos para visitar as comunidades, para organizar as suas bases."

Até agora, a ação mais de maior impacto do movimento foi uma tentativa de tomar o Palácio de Governo regional, em 19 de outubro. Liderado por Williams, o grupo de cerca de 3.000 pessoas foi detido por dezenas de policiais antimotim enviados pelo presidente esquerdista Daniel Ortega. No confronto, um idoso morreu após inalar gás lacrimogêneo.

No dia seguinte, Ortega acusou o movimento de ter financiamento estrangeiro. "Os oligarcas e os vendedores da pátria, com o acompanhamento de funcionários de algumas embaixadas e ONGs, vão para o Caribe tentar semear a discórdia", disse o presidente. "Deixem de alimentar essa violência, porque o país está cansado de guerras, e lá tem corrido muito sangue", disse Ortega, em alusão aos anos 1980, quando centenas de miskitos, financiados e armados pelos EUA, aderiram ao movimento dos Contras na luta contra o seu primeiro governo (1985-1990).

(Por Fabiano Maisonnave*, Folha de S. Paulo, 27/12/2009)

*Colaborou AMALIA MORALES


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