O presidente Barack Obama chegará aqui na manhã de sexta-feira, disposto a aplicar uma combinação de pressão e charme pessoal para assegurar que seja fechado um acordo sobre a mudança climática envolvendo cerca de 200 países.
Ele está ingressando em uma negociação multilateral que está sendo bem mais caótica e contenciosa do que o previsto -congelada pelas velhas divisões entre países ricos e pobres e um legado de desconfiança nos Estados Unidos, que há muito se recusam a aceitar quaisquer limites vinculantes às suas emissões de gases do efeito estufa.
O mundo está olhando para ver se Obama conseguirá extrair algum sucesso crível deste processo. E na quinta-feira, com quase 120 chefes de Estado presentes, havia alguns sinais de que um acordo político significativo poderia ocorrer, incluindo uma ligeira mudança na posição da China e uma promessa dos Estados Unidos de ajuda aos países mais pobres, para lidarem financeiramente com o aquecimento global.
Mas altos negociadores disseram aqui que as negociações podem se transformar em um fracasso humilhante, porque a China e o Estados Unidos, os dois maiores emissores do mundo, permanecem profundamente divididos em torno de vários problemas difíceis.
Obama está colocando parte do seu prestígio e o do seu país em jogo ao entrar no debate com tanto ainda não resolvido. Há apenas 11 semanas, ele deixou esta mesma cidade de mãos vazias, após defender a candidatura de Chicago a sede dos Jogos Olímpicos de 2016.
Mas as manobras e atitudes temerárias que caracterizaram a semana final de negociações também são um sinal de sua seriedade -nunca antes os líderes globais chegaram tão perto de um acordo significativo para redução dos gases do efeito estufa, associados ao aquecimento do planeta.
O governo americano forneceu um empurrão palpável às negociações na quinta-feira, quando a secretária de Estado, Hillary Rodham Clinton, declarou que os Estados Unidos contribuiriam com sua parcela dos US$ 100 bilhões por ano para financiamento a longo prazo para ajudar os países pobres a se adaptarem à mudança climática.
O governo permaneceu em silêncio por meses enquanto outras grandes potências econômicas apresentavam propostas financeiras semelhantes ou ainda mais generosas.
Um alto funcionário do governo Obama disse que o anúncio foi cuidadosamente planejado para ressuscitar as negociações antes da chegada de Obama. "É uma negociação", ele explicou.
Mas a oferta de Clinton veio acompanhada de duas condições significativas. Primeiro, os 192 países envolvidos nas negociações aqui devem chegar a um acordo político abrangente que entre em vigor imediatamente. Segundo, e mais importante, todos os países devem concordar em alguma forma de verificação -ela usou repetidamente o termo "transparência"- para assegurar que estejam cumprindo suas promessas ambientais.
A China, a maior produtora do mundo de gases do efeito estufa, levou as negociações a um virtual impasse ao longo da semana devido a este assunto, que seus líderes consideram uma afronta à soberania nacional.
Mas a teimosia chinesa em torno da questão é igualada em grande parte pelas próprias restrições de Obama. O Senado americano ainda não votou um projeto de lei sobre o clima, que o presidente necessita para cumprir suas promessas de redução de emissões e o apoio financeiro que agora prometeu ao restante do mundo.
"O presidente e sua equipe estão fazendo todo o possível para criar um acordo que seja justo para os Estados Unidos e que facilite um acordo internacional", disse Paul Bledsoe, da Comissão Nacional para Políticas de Energia, um grupo consultivo bipartidário. "Mas se os chineses não aceitarem o monitoramento das emissões, então não vale a pena fechar o acordo."
Os chineses pareceram dar uma pequena abertura na quinta-feira para um sistema de informe das emissões e das ações para reduzi-las. He Yafei, o vice-ministro das Relações Exteriores, repetiu a oposição da China a qualquer regime intrusivo de monitoramento internacional, em uma coletiva de imprensa na quinta-feira. Mas ele disse que seu país consideraria "trocas internacionais" voluntárias de informações sobre seus programas sobre o clima.
Os funcionários do governo americano presentes aqui não estavam prontos para declarar qualquer avanço em suas negociações com a China e outros países a respeito das medidas de verificação.
"Nós estamos fazendo progresso em todas as questões pendentes com os chineses", disse um alto funcionário do governo, em uma teleconferência com os repórteres. "Mas ainda é uma tarefa muito difícil. É impossível prever onde isto vai terminar."
As negociações ainda prosseguiam na tarde de quinta-feira entre pelo menos 16 subgrupos diferentes em torno de uma série de questões, incluindo financiamento para os países em desenvolvimento e mecanismos para preservar as florestas -ou mesmo a respeito da manutenção do Protocolo de Kyoto ou seu descarte por um novo acordo. Conferência do Clima COP15
Um contingente de líderes democratas no Congresso voaram para Copenhague na quinta-feira, para acentuar seu apoio à posição do governo no encontro de cúpula. A presidente da Câmara, Nancy Pelosi, e vários presidentes de comitês da Câmara declararam que o projeto de lei sobre mudança climática que aprovaram em junho forneceria grande parte do dinheiro necessário para cumprimento das promessas do governo. Eles se encontraram de modo privado com várias delegações para pedir que encorajem a China e vários outros países do chamado Grupo dos 77 países em desenvolvimento para que abandonem suas objeções ao acordo proposto.
"Eu acredito que os líderes compreendem a magnitude do desafio que estão enfrentando e chegarão a um acordo até o final da semana", disse o deputado Edward Markey, democrata de Massachusetts. "E os US$ 100 bilhões realmente ajudam a tratar das preocupações do G-77. E agora resta a China."
Os republicanos montaram uma contraofensiva. O senador James Inhofe, republicano de Oklahoma e o um dos maiores céticos a respeito da mudança climática no Congresso, compareceu à área de imprensa do Bella Center, na manhã de quinta-feira, para expor o que chamou de realidade aos procedimentos aqui.
"Não haverá comércio de emissões nem legislação vinculante nos Estados Unidos", ele disse. "Está morto. Não vai acontecer."
Mais significativo, um grupo de republicanos da Câmara disse em Washington que planeja apresentar uma resolução desaprovando formalmente o posição da Agência de Proteção Ambiental, de que os gases do efeito estufa colocam em risco a segurança e a saúde pública, uma decisão que poderia levar a uma ampla regulamentação dessas emissões.
Os republicanos dizem que a posição da agência pode levar a perda de empregos e retirada de dinheiro dos bolsos dos consumidores "para que ambientalistas radicais possam travar uma guerra contra a natureza". A resolução, se aprovada, não teria a força de lei.
Os US$ 100 bilhões propostos por Clinton são semelhantes às estimativas da União Europeia de contribuições necessárias, apesar do valor estar abaixo dos cerca de US$ 150 bilhões que os especialistas da União Europeia defendem.
Clinton disse que o dinheiro seria uma mistura de fundos públicos e privados, incluindo "fontes alternativas de financiamento", mas ela se recusou a explicar o que isso significava. Ela também não disse qual seria a parcela americana desse fundo, apesar de que nesses esforços de financiamento multilaterais, os Estados Unidos costumam contribuir com cerca de 20%. Ela disse que o dinheiro deve conter bilhões de dólares para conter o desmatamento, que contribui para as concentrações de dióxido de carbono na atmosfera.
Alguns representantes e observadores disseram que o anúncio de Clinton poderia enfraquecer a solidariedade dos países em desenvolvimento do G-77 com a China.
Tentando aparentemente explorar essas divisões, a delegação do Congresso americano se reuniu com as autoridades indianas, se concentrando nos programas de verificação das reduções de emissões, disse Pelosi.
Enquanto isso, o primeiro-ministro Wen Jiabao parecia concentrado em consolidar os laços da China com o G-77, se reunindo com os representantes do Brasil, Bangladesh, Trinidad, Etiópia e Sudão desde sua chegada na noite de quarta-feira.
A chefe da delegação brasileira, Dilma Rousseff, disse que seu país também é contrário à "verificação intrusiva" e sente fortemente que o Protocolo de Kyoto deve ser mantido, ao menos por ora.
"Ninguém vai desistir do pássaro na mão por algo que ainda não nos foi apresentado", ela disse.
Fander Falconí, o ministro das Relações Exteriores do Equador, se mostrou cético diante da oferta financeira americana. "O que nós realmente precisamos é de mecanismos firmes para redução das emissões dos países industrializados", ele disse. "Mecanismos financeiros são úteis, mas não centrais para uma solução."
(Por John M. Broder e Elisabeth Rosenthal*, The New York Times / Último Segundo, 18/12/2009)
*Tradução: George El Khouri Andolfato