Especialistas esperam que energia se firme como complemento limpo à hidráulica, mas cobram do governo política de longo prazo. Mercado estima que sejam contratados nesta segunda (14/12), no 1º pregão específico para eólicas, 2 GW, o que daria para abastecer 8 mi de pessoas
Com o primeiro leilão específico para a compra de energia eólica, que será realizado amanhã, empresários, fabricantes e especialistas esperam que a energia gerada a partir do vento se firme como um complemento limpo à hidráulica, principal fonte energética do país. O objetivo do leilão é a compra, pelo governo, de energia extra para o sistema nacional interligado. Mas, para que o setor decole, avaliam ser necessária uma política de longo prazo por parte do governo -ausência que ainda afeta investimentos em parques e fábricas, segundo eles.
O sucesso do leilão, que teve 339 projetos habilitados (10 GW), pode dobrar o faturamento do mercado, ao fazê-lo movimentar mais de R$ 5 bilhões até 2012, diz Lauro Fiúza, presidente da Abeeólica, associação do setor. O mercado prevê contratação de até 2 GW (o que daria para abastecer cidade com 8 milhões de habitantes).
Na semana passada, a menos de sete dias do leilão e já no início da conferência do clima de Copenhague, o governo isentou os aerogeradores, permanentemente, do pagamento de IPI -o que atingirá apenas duas fabricantes, as únicas no país. "É uma sinalização excelente para o setor, pois demonstra preocupação do governo. Mas o ideal é que a desoneração seja em nível de cadeia", diz Tadeu Matheus, da Wobben.
A capacidade de produção da empresa de aerogeradores é de 500 MW por ano. "Mas poderá ser ampliada, caso haja sinalização de políticas de Estado visando fornecimento constante e regular. Produzimos muito menos que a capacidade instalada." Avaliação semelhante faz a Abeeólica.
Só neste ano, foram inauguradas 15 usinas, aumentando a capacidade eólica instalada para 602 MW -número aquém da meta inicial do Proinfa, programa de fontes alternativas do governo que, ao comprar 1.423 MW em 2004, deu o primeiro empurrão para o setor.
O atraso do programa, cuja meta inicial era 2006, ocorreu porque foi preciso criar estrutura legal e confiança do investidor, diz Hamilton Moss, do MME (Ministério de Minas e Energia). As principais travas foram a exigência de índice de nacionalização dos projetos (quando havia poucas fábricas), atrasos em financiamentos e comercializações de licenças.
Vento complementa água
Mauricio Tolmasquim, presidente da EPE (Empresa de Pesquisa Energética), e Luiz Pinguelli Rosa, diretor da Coppe/UFRJ e ex-presidente da Eletrobrás, afinam o discurso a favor da energia eólica como bom complemento às hidrelétricas. É que os ventos são mais intensos justamente no período em que chuvas escasseiam.
"Suponha que esteja ventando muito à noite, num horário em que não se precisa de muita energia. Você pode desligar algumas turbinas e deixar encher os reservatórios, usando, no lugar, a eólica", diz Pinguelli.
Enquanto a maioria dos países precisa investir pesadamente em energia renovável para cumprir suas metas de redução de emissões de carbono, o Brasil, não. É que só 3% das emissões brasileiras vêm da geração elétrica. E quase 87% da matriz elétrica do país é renovável (a média mundial é 18%).
O problema é que essa matriz limpa pode se "sujar", caso aumente a participação de combustíveis fósseis: no Plano Decenal de Expansão de Energia 2008-2017 da EPE, prevê-se que as térmicas a óleo combustível passarão de 1,49% para 5,7%. Além de emitir CO2, são caras, quando acionadas. Em 2007, o acionamento de 12 meses gerou gasto de R$ 2 bilhões.
Planejamento
Uma expectativa oficial em longo prazo para o setor está no Plano Nacional de Energia, o PNE 2030, de 2005: estimava-se que, até lá, atingiria-se 4,6 GW. Hoje, o governo já espera que essa meta seja atingida ao menos dez anos antes.
Desde 2003, tramita na Câmara o projeto de lei 630, marco legal das fontes eólica e solar, que estabelece metas, desonerações, apoio ao desenvolvimento tecnológico, incentivo à pequena geração. Mês passado, foi aprovado em comissão especial e seguiu para o plenário.
Para "bombar" o setor, a Abeeólica defende o planejamento de leilões anuais; a certeza da continuidade atrairia investidores. "Tem de fazer leilão anual, mas forçar o preço para baixo. Não é porque a eólica é boa que temos de pagar fortunas", diz Pinguelli. O preço máximo hoje é de R$ 278 (contratos do Proinfa). No leilão, será de R$ 189. Na hidrelétrica, varia de R$ 70 a R$ 100.
Tolmasquim, da EPE, diz que "não há decisão formal", mas há "tendência" de que haja outros leilões. Moss, do MME, pondera que a fixação de leilão anual melhoraria para o investidor, mas engessaria as possibilidades de reduzir custos.
(Por Natália Paiva, Folha de S. Paulo, 13/12/2009)