Ao estender prazo para recompor áreas desmatadas ilegalmente, Ministério Público Federal do Pará entende que governo enviou sinal de que punição pode nunca virar realidade
O Ministério Público Federal no Pará entende que o governo federal errou ao estender o prazo para que propriedades desmatadas além dos limites legais tenham suas áreas recompostas. Acréscimos feitos ao Código Florestal brasileiro previam que, a partir deste mês, os produtores que tivessem desrespeitado a lei estariam sujeitos a pesadas multas.
Pela medida publicada nesta sexta-feira (11/12) no Diário Oficial da União, o Programa Federal de Apoio à Regularização Ambiental de Imóveis Rurais entra em vigor em junho de 2011, com mais um facilitador: os proprietários flagrados na ilegalidade ganham seis meses para regularizar a situação.
O procurador Ubiratan Cazetta manifesta, à Rede Brasil Atual, que a decisão transmite a ideia de que o cumprimento da lei nunca será cobrado. "Não vem acompanhado de nenhuma política efetiva que justifique a mudança do prazo. E o pior é que vem dentro de um contexto que o torna contraditório. Ao mesmo tempo em que você anuncia uma meta de redução de desmatamento, estabelece parâmetros em que flexibiliza a situação sem um motivo justo, leva ao descrédito da necessidade de iniciar, o quanto antes, a recuperação das áreas degradadas", afirma.
Cazetta refere-se à meta apresentada pelo governo de reduzir as emissões de gases que provocam o efeito estufa em até 39% até 2020. Para cumprir a promessa, a principal aposta é reduzir o desmatamento em até 90% no período. Neste semestre, além disso, foi anunciado o menor nível de derrubara e queimada na Amazônia nas duas décadas em que é feita a medição dos níveis.
Ao longo do ano, o Ministério Público Federal assinou compromissos setoriais de que não haveria produção em áreas degradadas. Produtores e compradores, em especial os supermercados, aceitaram assinar termos em que se comprometiam a fazer esse rastreamento. No estado do Pará, iniciou-se a emissão de guias eletrônicas animais, um mecanismo para facilitar o controle do gado e dificultar a presença de bovinos em áreas desmatadas.
É diante desse conjunto de esforços realizados ao longo de 2009 que Ubiratan Cazetta entende que a medida do governo é um sinal contraditório, já que, quando se trata de preservação, não é possível promover ações reticentes. O procurador aponta que, por trás da decisão, há a intenção de não desagradar a alguns setores produtivos em véspera de ano eleitoral.
Ao longo dos últimos meses a bancada que representa os grandes proprietários de terras no Congresso teve movimentação intensa. Alguns parlamentares não esconderam que a entrada em vigor da punição a partir de dezembro era o principal motivo para tal articulação, uma forma de pressionar o governo a adiar a execução das novas medidas.
Dentro dessa ofensiva, entraram a tentativa de rever e até mesmo anular a validade do Código Florestal e o projeto que dá anistia a todos os que tivessem desmatado até 2006 – nas projeções do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), a medida daria perdão ao desmate de uma área equivalente a nove vezes o estado do Rio de Janeiro.
Pelo lado do governo, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, pronunciou-se nesta sexta-feira a respeito do adiamento, afirmando que o decreto não favorece ruralistas, mas viabiliza a efetiva regularização dos agricultores que ainda não atendem às exigências do Código Florestal. "O decreto cria o programa 'Mais Ambiente', que pela primeira vez vai dar recursos, crédito e educação ambiental para as pessoas se legalizarem. Desde que o Código Florestal foi criado, há 44 anos, 90% dos agricultores estão na ilegalidade”, afirma.
O procurador Ubiratan Cazetta, no entanto, vê uma crescente frente de ação dos ruralistas e entende que há forças econômicas que buscam retrocessos na legislação ambiental. “Faz parte do jogo político haver pressões. Mas é preciso saber se vamos resistir às pressões e se não prevalecerá a questão puramente econômica sobre algo muito mais importante, que é a preservação ambiental”, ressalta.
(Por João Peres, Rede Brasil Atual, com informações da Agência Brasil, 11/12/2009)