Para produzir consenso entre 192 países com interesses diferentes, o mais forte candidato a texto-base do acordo de Copenhague dilui o próprio objetivo: combater a mudança climática perigosa. A proposta, apresentada pelo maltês Michael Zammit Cutajar e pelo brasileiro Luiz Alberto Figueiredo Machado, alivia para os países em desenvolvimento, ao deixar para o futuro o pico de emissões globais, e para os países ricos, ao ser vaga sobre financiamento.
O pico de emissões é um pomo da discórdia entre ricos e pobres no tópico da mitigação (redução de emissões). Cientistas afirmam que, se a humanidade quiser manter as concentrações de gás carbônico em 450 partes por milhão (evitando um aquecimento global de mais de 2°C), é preciso que as emissões atinjam um pico em 2020 e comecem a declinar.
No entanto, países em franca expansão de sua infraestrutura, como China e Índia, recusam-se a fixar um pico de emissões. O texto proposto por Cutajar e Figueiredo, chefe e vice-chefe do grupo que negocia o futuro regime de proteção ao clima, acata isso. "As partes devem cooperar para obter o pico de emissões nacionais o quanto antes, reconhecendo que o prazo para o pico será mais longo para os países em desenvolvimento", diz a proposta.
Por outro lado, o texto mantém a decisão de envolver países em desenvolvimento em "desvios substanciais", da ordem de 15% a 30%, em suas trajetórias de emissão até 2020. Para os países ricos, fica a meta de 25% a 40% de corte no mesmo período em relação a 1990.
"É um texto tendencioso, mas, como base de negociação, ele é muito melhor que o texto proposto pela Dinamarca", avalia Marcelo Furtado, do Greenpeace. Uma proposta de acordo dos dinamarqueses ia na direção oposta -fazendo concessões aos EUA. Outro ponto a favor da nova proposta é que ela não exclui a possibilidade de acordo com força de lei, como desejam os europeus. A proposta do premiê da Dinamarca, Lars Rasmussen, é que o acordo de Copenhague deveria ser apenas político -ou seja, que nenhum país fosse obrigado a cumpri-lo.
Antonio Hill, da ONG Oxfam, porém, critica justamente o fato de o texto não se posicionar a esse respeito. "Eles dizem que o texto não tem a intenção de prejulgar os resultados das negociações, ou seja, ele tanto pode ser quanto pode não ser um novo protocolo. É uma pergunta à qual precisam responder, porque é uma pergunta política, não de negociação."
(Por Luciana Coelho e Claudio Angelo, Folha de S. Paulo, 12/12/2009)