Pela primeira vez em Mato Grosso do Sul, Justiça Federal aplica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e decide que o marco temporal de 5 de outubro de 1988 não vale para áreas de onde índios tenham sido expulsos
A Justiça Federal de Mato Grosso do Sul decidiu que parte da fazenda Santa Bárbara, em Aquidauana, oeste do estado, é terra tradicionalmente ocupada por indígenas da etnia terena. O antigo proprietário havia pedido à Justiça que declarasse a área como terra não indígena, mas o juiz decidiu o contrário, seguindo a argumentação do Ministério Público Federal (MPF).
A decisão baseou-se em um processo administrativo demarcatório, perícia judicial antropológica e inspeção judicial. A área deve ser reocupada pelos indígenas e anexada à Terra Indígena Limão Verde, que já foi delimitada, declarada, demarcada e homologada oficialmente. A terra indígena vai passar a ter 5,4 mil hectares.
É a primeira vez em Mato Grosso do Sul que a Justiça decide o mérito de uma disputa, envolvendo fazendeiros e índios, de acordo com a jurisprudência estabelecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol (RR), este ano. O precedente pode estabelecer um novo padrão no julgamento dos litígios indígenas no estado.
Em sua decisão, o STF deixou claro que o marco temporal de 5 de outubro de 1988 (promulgação da Constituição Federal) só vale para determinar se uma área é de ocupação tradicional indígena se a desocupação da área, pelos indígenas, tiver sido espontânea. Se os índios tiverem sido expulsos pela ação dos brancos, aquele marco deixa de existir.
Terra Indígena Limão Verde
Os elementos colhidos permitiram ao juiz decidir pela improcedência da ação, acatando a argumentação do Ministério Público Federal de que “se a desocupação indígena der-se por qualquer outra forma que não a espontânea não se descaracterizará a posse indígena sobre a área, devendo ser demarcada como tal”.
Desta maneira, a Justiça reafirma ser legítima a demarcação da Terra Indígena Limão Verde, visto que a desocupação, pelos indígenas, de suas terras tradicionais, ocorreu em razão da Guerra do Paraguai e pelas frentes expansionistas pós-guerra promovidas pelo estado, no processo de colonização da região.
Referência processual na Justiça Federal de Campo Grande: 2003.60.00.011984-2
(Ascom MPF/MS / Procuradoria Geral da República, 02/12/2009)