Talvez, antes de qualquer discussão em Copenhague, as lideranças mundiais deveriam conhecer lugares como o Rincão Gaia. O local, situado no município de Pantano Grande (e rodeado por fazendas produtoras de soja), é um exemplo radical de recuperação de uma área degradada e de utilização equilibrada da natureza. Um projeto ousado concebido pelo ecologista José Lutzenberger – morto em 2002. Ele conheceu o lugar no início dos anos 80. Na época, encontrou uma "paisagem lunar", quase sem vegetação e com duas enormes crateras. A área, pertencente ao DNER (atual Dnit), era uma antiga pedreira, que foi utilizada, entre outras coisas, para suprir obras como a construção da BR-290. Sem mais utilidade, seria transformada em depósito de lixo.
Em 1984, Lutzenberger conseguiu assumir a área para dar-lhe um destino diferente. Foi assim que, ao longo dos anos, um espaço condenado aos poucos transformou-se em uma experiência prática e bem-sucedida de ecologia. O técnico agrícola e monitor do Rincão, Alexandre de Freitas, explica que o primeiro passo foi a recomposição paisagística. Numa segunda etapa começaram as experiências com agricultura ecológica, gado leiteiro e pomar de cítricos, entre outras medidas. O Rincão Gaia hoje é um dos legados mais importantes de Lutzenberger. Não é por acaso que o ecologista decidiu
ser sepultado por lá.
A paisagem lunar deu lugar a um rico ecossistema, com mamíferos, diferentes aves silvestres e enorme variedade de plantas. As duas crateras agora são lagos. Um deles é o Lago das Capivaras, com 8 metros de profundidade. Quase totalmente coberto por aguapés, o reservatório é frequentado por capivaras e, ocasionalmente, por outros animais. O outro, com até 17 metros de profundidade e uma extensão de dois hectares,é o belo Lago das Estrelas, que levoumais de quatro anos para ficar cheio e agora fornece água potável para o Rincão.
O local já foi visitado por personalidades como o escritor Fritjof Capra e está aberto a estudantes, pesquisadores, professores e todos os demais interessados. Trata-se de um passeio didático e lúdico. "A ideia é sensibilizar as pessoas para a causa ecológica com a beleza do lugar", acrescenta Alexandre. Tudo o que é produzido é servido mais tarde aos visitantes: carne, leite, ovos e outros alimentos, sempre obedecendo aos princípios de uma produção orgânica e saudável. Nada é jogado fora, tudo é reaproveitado e compensado, como no dinâmico mecanismo da natureza. E é justamente este conceito de troca e integração com o meio ambiente o recado mais precioso aos líderes que estão em Copenhague.
(Por Eduardo Andrejew, Jornal VS, 07/12/2009)