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terras quilombolas direitos quilombolas
2009-12-04

Depois de quase 15 anos de luta, a comunidade quilombola de Retiro, em Santa Leopoldina, região serrana do Espírito Santo, finalmente vai receber oficialmente o decreto presidencial que reconhece o território como pertencente aos descendentes de escravos capixabas. A solenidade será realizada nesta sexta-feira (04/12), às 16h, no Centro Comunitário da Comunidade, com a presença de lideranças quilombolas e autoridades. Entre as 75 famílias que residem na área, o clima é de comemoração.

No território, de pouco mais de 519 hectares, vivem 75 famílias, cerca de 250 negros. Segundo o presidente da Associação Quilombola dos Herdeiros do Benvindo Pereira dos Anjos, a comunidade está preparando uma confraternização com características tradicionais do povo quilombola, para festejar a conquista. “É um momento de muita alegria, a recuperação do território que pertenceu aos nossos antepassados”, enfatizou.

A regularização do território foi anunciada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro último. No Espírito Santo, somente Retiro foi contemplado, mas no restante do País outras 30 comunidades foram beneficiadas.

De acordo com o governo federal, estes são os primeiros decretos de áreas quilombolas que envolvem desapropriações (áreas que não estão em terras públicas) no País. A partir daí é possível dar inicio aos processos de avaliação dos imóveis que, após a indenização aos proprietários, permitirão que as famílias tenham acesso a todo o território e, posteriormente, tenham o título de domínio definitivo de suas terras, que é coletivo e inalienável.

O reconhecimento possibilita acesso a políticas públicas básicas, como, por exemplo, o Bolsa Família, Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).

O levantamento das primeiras informações etnográficas de Retiro foi feito por Osvaldo Martins de Oliveira, na época, aluno de mestrado em antropologia da Universidade Federal Fluminense. E, em seguida, enviadas à Fundação Cultural Palmares (FCP) e à Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq). O território foi então indicado para ser incluído pela Fundação em seu projeto de mapeamento e sistematização de 50 áreas de comunidades remanescentes de quilombos.

Em 1998, os herdeiros de Benvindo enviaram um ofício à Fundação Palmares solicitando o reconhecimento e titulação. Dois anos depois, um "Diagnóstico Jurídico das Terras da Comunidade Remanescente de Quilombo de Retiro", da Fundação Palmares, recomendou que a área fosse titulada, mas o reconhecimento não foi publicado no Diário Oficial da União.

No início do governo Lula, em janeiro de 2003, a Associação dos Herdeiros encaminhou um novo ofício solicitando informações e providências a respeito do processo, sem sucesso. A partir da assinatura do Decreto 4887/2003, passando a competência da titulação das terras das comunidades dos quilombos ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), as lideranças de Retiro passaram a fazer contatos e visitas à sede da Superintendência Estadual do Incra/ES, reivindicando o reconhecimento e a titulação de sua área.

Desde então, um longo caminho foi percorrido, até que a titulação se concretizasse. Atualmente, outros sete processos de regulamentação estão em andamento no Estado. Recentemente, as comunidades de Serraria e São Cristóvão, localizadas no município de São Mateus, norte do Estado, também foram tituladas.

Os negros têm direito a 50 mil hectares no Espírito Santo, a maior parte ocupada e explorada pela Aracruz Celulose (atual Fibria). Os territórios são ainda ocupados por empresas que produzem álcool e açúcar e por fazendeiros.

Pesquisas realizadas pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) por solicitação do Incra apontam que os negros foram forçados a abandonar suas terras: em Sapê do Norte, existiam centenas de comunidades na década de 70, e hoje restam 37. Ainda na década de 70, pelo menos 12 mil famílias de quilombolas habitavam o norte do Estado: atualmente resistem entre os eucaliptais, canaviais e pastos, cerca de 1,2 mil famílias. Em todo o Espírito Santo existem cerca de 100 comunidades quilombolas.

O projeto Territórios Quilombolas no Espírito Santo também pesquisou e confirmou serem territórios quilombolas 500 hectares de São Pedro, em Ibiraçu, onde vivem 24 famílias. E 1,5 mil hectares em Monte Alegre, Cachoeiro de Itapemirim (sul do Estado), onde vivem 102 famílias negras. Nestes dois municípios há grandes fazendeiros ocupando as áreas dos negros.

O direito à propriedade da terra é determinado no artigo 68 da Constituição Federal. E o direito à autoidentificação das comunidades quilombolas, pelo Decreto 4.887/03, assim como pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais (PNPCT), e Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).

(Por Manaira Medeiros, Século Diário, 03/12/2009)


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