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tratado de itaipu hidrelétrica de itaipu
2009-12-01

A briga foi numa partida de futebol, no estádio do Maracanã, distante quase 2 mil quilômetros da fronteira entre Ciudad del Este e Foz do Iguaçu, um dia antes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter enviado ao Congresso brasileiro a proposta de alteração do tratado entre Brasil e Paraguai em torno da usina hidrelétrica de Itaipu. Os eventos não estão ligados entre si, até porque uma semana antes a pancadaria já havia marcado o primeiro jogo do Cerro Porteño e Fluminense pela Copa Sul-americana, no estádio La Olla, em Assunção. Mas a tensão envolvendo jogadores paraguaios e brasileiros chamou a atenção de quem vive o dia a dia da constante negociação entre os dois países que administram a usina.

"Isso dá uma mostra do clima que vivemos desde que o Paraguai começou a querer rediscutir o tratado de Itaipu", diz um funcionário brasileiro da usina. O acordo para alterar o tratado entre Brasil e Paraguai foi assinado em julho deste ano. Mas foi somente no dia 19 de novembro, dia da primeira reunião da diretoria da binacional pós-apagão, que o presidente Lula enviou a primeira parte do acordo ao Congresso.

Os paraguaios continuam fazendo pressão para que os outros pontos do acordo não sejam deixados de lado e também ainda insistem na ideia de vender sua energia no mercado livre a partir de 2011. Esse ponto não fez parte do documento assinado entre os governos e será rediscutido esta semana por representantes de Itaipu, da estatal Ande, Eletrobrás e Ministério de Minas e Energia.

Depois de ceder à pressão paraguaia, aceitando triplicar o valor pago pela cessão da energia e doar uma linha de transmissão de US$ 450 milhões, o governo brasileiro não tem se mostrado muito receptivo a liberar o mercado livre para a venda da energia de Itaipu. Pelo menos não no curto prazo. E inclusive fez contas para mostrar aos paraguaios que não há vantagens para eles, pois teriam que bancar o custo da energia de US$ 50 o megawatt hora, correr o risco de contratos e ainda apresentar lastro financeiro. Sem contar que as chuvas abundantes baratearam a energia no país e o Paraguai poderia perder parte dos dólares pagos a título de cessão, proporcionalmente aos MW que venderem no mercado livre, argumentam estes interlocutores .

O diretor-geral de Itaipu do lado paraguaio, Carlos Mateo Balmelli, se mostra muito otimista com o andamento do acordo. Amanhã estará em São Paulo para discutir a venda da energia com algumas empresas e também com comercializadoras brasileiras. Ele diz que a ideia era de ter 300 MW liberados para serem vendidos a partir de 2011. "Não queremos causar impacto no mercado brasileiro, queremos começar aos poucos", afirma.

Para o Paraguai é importante ganhar musculatura e aprender a lidar com o mercado brasileiro, porque no início de 2023, quando a dívida de Itaipu de US$ 18 bilhões estiver quitada, a Eletrobrás não terá mais a obrigação de comprar a energia do lado paraguaio. O Brasil ainda dependerá da energia de Itaipu, mas é importante para o Paraguai ter "expertise" para poder negociar melhor os mais de 5 mil MW que terá para vender ao Brasil e não ficar assim à mercê do que a Eletrobrás ofereça.

Naquele dia, pós-pancadaria no Maracanã no jogo pela Sul-americana, a negociação prévia à reunião de diretoria de Itaipu foi tranquila, mas muito intensa e cheia de argumentos. Com a primeira parte do acordo indo ao Congresso brasileiro - que prevê que o pagamento pela cessão da energia ao Brasil vá de US$ 120 milhões para US$ 360 milhões - os paraguaios queriam discutir os outros pontos, principalmente a ampliação da subestação do lado paraguaio, que será bancada por Itaipu sem necessidade de alteração do tratado e vai custar cerca de US$ 30 milhões.

A construção da linha de transmissão, que vai ligar Ciudad del Este a Assunção e será doada pelo governo brasileiro, também é ponto fundamental. Ironicamente, o Paraguai, apesar de ter um dos maiores potenciais de geração hidráulica por renda per capita do mundo, vive hoje constantes apagões por ter uma rede de transmissão precária. Com a nova linha, o país pretende atrair a indústria brasileira para o país

O projeto básico da linha já está sendo construído, uma empresa brasileira de engenharia está prestes a ser contratada e Balmelli espera que, em 2012, já esteja funcionando. A linha custará US$ 450 milhões aos cofres públicos brasileiros e o financiamento da obra e a forma como a conta vai ser absorvida pelo Brasil também precisa ser aprovada pelo Congresso, segundo o diretor-geral do lado brasileiro, Jorge Samek.

Apesar de o governo brasileiro defender o acordo e dizer que é importante que os vizinhos cresçam junto com a economia do Brasil, o grande problema é que, assim como os parlamentares brasileiros podem votar o assunto antes do recesso do fim de ano, eles também podem levar anos para discutir a questão. Nesse ponto, Samek, acredita que o apagão do início do mês possa dar uma nova dimensão aos congressistas da importância histórica do acordo com o Paraguai.

A renegociação do tratado começou no governo Lugo, mas há anos o Paraguai vem perdendo receita de royalties e da própria cessão de energia em função de os pagamento serem efetuados em dólar. A cessão rende atualmente ao país US$ 120 milhões, e em royalties o Ministério da Fazenda paraguaio já recebeu US$ 3,3 bilhões. Enquanto para o Brasil a importância de Itaipu está na energia que ela produz, para o Paraguai ela é importante pela receita que dá ao país - é uma das principais contribuições do orçamento paraguaio. Mas assim como o real, a moeda paraguaia, o guarani, também se valorizou em relação ao dólar ao longo dos últimos anos. Isso significa que os valores recebidos em guaranis diminuíram.

Como a usina é binacional, o tratado estabeleceu o dólar como moeda oficial da usina, então todas as receitas, e também as despesas, estão lastreadas em dólar. Ou seja, a oscilação da moeda americana não afeta financeiramente a usina. Por ano, Itaipu tem receita de cerca de US$ 3,3 bilhões, sendo que cerca de US$ 2,2 bilhões são encaminhados para o pagamento da dívida feita para a construção da usina.

(Por Josette Goulart, Valor Econômico / IHunisinos, 30/11/2009)


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